"It’s the parrot; he says to remember his seed."
quinta-feira, julho 31, 2003
A PROPÓSITO DO ‘TRATADO DOS TELEMÓVEIS’, in Abrupto
"It’s the parrot; he says to remember his seed."
"It’s the parrot; he says to remember his seed."
O ACONTECE ACABOU. SO WHAT, PARTE 2
Anda meio mundo de cabeça perdida com o fim do Acontece. Os indignados do costume manifestam-se, pedindo a cabeça do ministro. Meu Deus: o Acontece acabou!
Palavra de honra: nunca percebi o que tinha de especial o Acontece ao ponto de suscitar tantas declarações de amor. Assim como achava ridículo o bestial facto, que tanta gente aludia, de ser considerado “o único magazine televisivo cultural europeu transmitido numa base diária”.
Entendamo-nos. A mediocridade e o provincianismo escorriam à vista desarmada no cenário meio-piroso daquele estúdio, onde um apresentador cabotino ensaiava, regularmente, umas conversas com uns amigalhaços ou destacava, de forma paternal, certas obras que, em condições normais, não mereceriam o mais leve comentário. O nível de compadrio roçava a obscenidade. Alturas houve em que o programa chegava a ser penoso, tal era o grau de declarada intimidade e de vassalagem para com certas capelinhas e figuras do milieu cultural – português e não só. Lembro-me de uma entrevista perfeitamente hilariante ao cretino do Depardieu, onde se falou de tudo menos de cinema ou dramaturgia – como se Depardieu fosse uma sumidade em matéria de discurso político.
O Acontece foi sempre um programa fraco. Fraquíssimo. No campo da divulgação literária, bastava compará-lo com o programa do Francisco José Viegas para perceber o abismo. O Acontece foi um programa sem rasgos de génio, amorfo, irritantemente amador e previsível. Um programa que servia os amigos e conhecidos e esquecia os outros. Ou seja, um programa em que o critério de divulgação e de informação nunca foi claro e transparente. Um programa sempre disposto a anuir perante as demonstrações de corporativismo de certas instituições ou grupos. Sim, houve momentos interessantes, alturas em que o programa foi mágico, consequência directa da qualidade dos convidados. Mas quantas vezes isso aconteceu?
Dir-me-ão: era o único programa de divulgação cultural. Eis o paradigma da nossa endémica mediocridade: "é jeitoso, deixá-lo estar"; "podia ser melhor, mas cumpre a função"; "é bonzinho, há que mantê-lo"; "deixa estar, podia ser pior".
O Acontece acabou? So what? Que venha o próximo. E que seja bem melhor. Não será, certamente, difícil.
PS: a ser verdade, a única coisa a lamentar será a forma pouco cordial, abrupta e fria como os responsáveis do programa e o seu apresentador tomaram conhecimento da notícia da sua extinção. Mas até aí importava conhecer a versão dos factos pela direcção de programas da RTP.
Anda meio mundo de cabeça perdida com o fim do Acontece. Os indignados do costume manifestam-se, pedindo a cabeça do ministro. Meu Deus: o Acontece acabou!
Palavra de honra: nunca percebi o que tinha de especial o Acontece ao ponto de suscitar tantas declarações de amor. Assim como achava ridículo o bestial facto, que tanta gente aludia, de ser considerado “o único magazine televisivo cultural europeu transmitido numa base diária”.
Entendamo-nos. A mediocridade e o provincianismo escorriam à vista desarmada no cenário meio-piroso daquele estúdio, onde um apresentador cabotino ensaiava, regularmente, umas conversas com uns amigalhaços ou destacava, de forma paternal, certas obras que, em condições normais, não mereceriam o mais leve comentário. O nível de compadrio roçava a obscenidade. Alturas houve em que o programa chegava a ser penoso, tal era o grau de declarada intimidade e de vassalagem para com certas capelinhas e figuras do milieu cultural – português e não só. Lembro-me de uma entrevista perfeitamente hilariante ao cretino do Depardieu, onde se falou de tudo menos de cinema ou dramaturgia – como se Depardieu fosse uma sumidade em matéria de discurso político.
O Acontece foi sempre um programa fraco. Fraquíssimo. No campo da divulgação literária, bastava compará-lo com o programa do Francisco José Viegas para perceber o abismo. O Acontece foi um programa sem rasgos de génio, amorfo, irritantemente amador e previsível. Um programa que servia os amigos e conhecidos e esquecia os outros. Ou seja, um programa em que o critério de divulgação e de informação nunca foi claro e transparente. Um programa sempre disposto a anuir perante as demonstrações de corporativismo de certas instituições ou grupos. Sim, houve momentos interessantes, alturas em que o programa foi mágico, consequência directa da qualidade dos convidados. Mas quantas vezes isso aconteceu?
Dir-me-ão: era o único programa de divulgação cultural. Eis o paradigma da nossa endémica mediocridade: "é jeitoso, deixá-lo estar"; "podia ser melhor, mas cumpre a função"; "é bonzinho, há que mantê-lo"; "deixa estar, podia ser pior".
O Acontece acabou? So what? Que venha o próximo. E que seja bem melhor. Não será, certamente, difícil.
PS: a ser verdade, a única coisa a lamentar será a forma pouco cordial, abrupta e fria como os responsáveis do programa e o seu apresentador tomaram conhecimento da notícia da sua extinção. Mas até aí importava conhecer a versão dos factos pela direcção de programas da RTP.
ESQUERDA, DIREITA. SO WHAT?
O Pedro Mexia cometeu o atrevimento de afirmar o óbvio ululante: que a TSF, não sendo formal, militante ou assumidamente de esquerda, é marcada por um informal, intermitente e, provavelmente, não deliberado pendor esquerdista. Até o Winnie The Pooh percebe o que Pedro Mexia quis dizer. Não quis, obviamente, criticar essa postura ou esse descomprometido alinhamento – o qual, é bom que se diga, apesar de notório, não envergonha ninguém.
A questão suscitada por Pedro Mexia, e a forma como Carlos Vaz Marques respondeu, acorda um velho dilema: deverão os jornais, revistas ou rádios assumir, descomplexadamente, o seu posicionamento ideológico, como, aliás, é prática na generalidade dos países ocidentais onde a tradição democrática e a postura crítica e pró-activa da denominada sociedade civil, fazem a diferença (pela positiva)?
Da mesma forma que aceito que me digam que existem medias não facilmente catalogáveis - por regra tendencialmente neutros, porque mais pluralistas nos editorais e no leque de «opinion makers» (o jornal Público, no meu entender, é um desses casos) -, não vislumbro qualquer tipo de problema em se assumir o que, em bom rigor, salta à vista. Considero, até, essa assunção como positiva e reveladora de honestidade. É preferível saber ao que vamos. É mais «perigosa» a existência de uma «paz podre» e de uma tentativa de fazer vender um ideal de neutralidade que, na realidade, não existe. Prefiro um jornal que se assuma do que outro que, sob a capa de uma pretensa neutralidade, vá ensaiando exercícios encapotados de um «jornalismo de causas».
Finalmente, considero um pouco patética a forma como, em Portugal, de tempos a tempos, certos responsáveis vêm negar ingenuamente o que toda a gente sabe. Por exemplo, tentar vender a ideia de que o jornalista José Goulão é um espectador imparcial do conflito israelo-palestinano, que o António José Teixeira não é simpatizante do PS ou que o Luis Delgado não é pró-americano, é um pouco como vender gato por lebre. As coisas são o que são. Sejamos, por isso, honestos. Até porque, parafraseando Iago em Otelo, “But men are men, the best sometimes forget”.
PS: É verdade: a TSF é a minha estação de rádio favorita.
O Pedro Mexia cometeu o atrevimento de afirmar o óbvio ululante: que a TSF, não sendo formal, militante ou assumidamente de esquerda, é marcada por um informal, intermitente e, provavelmente, não deliberado pendor esquerdista. Até o Winnie The Pooh percebe o que Pedro Mexia quis dizer. Não quis, obviamente, criticar essa postura ou esse descomprometido alinhamento – o qual, é bom que se diga, apesar de notório, não envergonha ninguém.
A questão suscitada por Pedro Mexia, e a forma como Carlos Vaz Marques respondeu, acorda um velho dilema: deverão os jornais, revistas ou rádios assumir, descomplexadamente, o seu posicionamento ideológico, como, aliás, é prática na generalidade dos países ocidentais onde a tradição democrática e a postura crítica e pró-activa da denominada sociedade civil, fazem a diferença (pela positiva)?
Da mesma forma que aceito que me digam que existem medias não facilmente catalogáveis - por regra tendencialmente neutros, porque mais pluralistas nos editorais e no leque de «opinion makers» (o jornal Público, no meu entender, é um desses casos) -, não vislumbro qualquer tipo de problema em se assumir o que, em bom rigor, salta à vista. Considero, até, essa assunção como positiva e reveladora de honestidade. É preferível saber ao que vamos. É mais «perigosa» a existência de uma «paz podre» e de uma tentativa de fazer vender um ideal de neutralidade que, na realidade, não existe. Prefiro um jornal que se assuma do que outro que, sob a capa de uma pretensa neutralidade, vá ensaiando exercícios encapotados de um «jornalismo de causas».
Finalmente, considero um pouco patética a forma como, em Portugal, de tempos a tempos, certos responsáveis vêm negar ingenuamente o que toda a gente sabe. Por exemplo, tentar vender a ideia de que o jornalista José Goulão é um espectador imparcial do conflito israelo-palestinano, que o António José Teixeira não é simpatizante do PS ou que o Luis Delgado não é pró-americano, é um pouco como vender gato por lebre. As coisas são o que são. Sejamos, por isso, honestos. Até porque, parafraseando Iago em Otelo, “But men are men, the best sometimes forget”.
PS: É verdade: a TSF é a minha estação de rádio favorita.
WITTGENSTEIN VS. POPPER
Volto a “Wittgenstein’s Poker”. Naquele que foi o seu primeiro livro, David Edmonds e John Eidinow conseguiram fazer uma coisa dificílima, que requer sensibilidade, tacto, conhecimento e humildade: escrever um livro minimamente acessível a leigos e diletantes, mas de uma minúcia e de um rigor histórico-filosóficos intocáveis. E foi escrito com base na tradição hitchcockiana de utilizar um facto pseudo-relevante para, de seguida, contar uma história bem mais vasta e complexa. O ‘MacGuffin’ neste pequeno livro é, precisamente, a história do já mítico incidente com um atiçador acenado, num frente a frente entre dois dos maiores filósofos do Sec. XX, na também famosa sala H3 do edifício Gibbs, no King’s College (a que acolhia regularmente as reuniões do Clube de Ciência Moral de Cambridge). “Wittgenstein’s Poker” é um pequeno-grande épico, que abre portas e janelas a cada parágrafo.
Ao longo de 250 páginas, Edmonds e Eidinow conduzem-nos numa visita absolutamente fascinante pelo espírito de uma época já desaparecida. De uma época onde a paixão das ideias era vital, livre do relativismo ou da incerteza pós-modernista.
Apesar das notórias diferenças de ‘background’ e da latente rivalidade entre ambos, Wittgenstein e Popper pertenciam à grande comunidade judaica da Europa Central. Karl e Ludwig nasceram na Áustria, tendo crescido na que parecia ser uma das mais cosmopolitas cidades europeias: Viena. Contudo, a comunidade judaica austríaca, incluindo os membros perfeitamente assimilados, produto ou não da miscigenação cultural ou sanguínea, nunca deixou de sentir, omnipresente, a incómoda sensação de iminente discriminação, ainda que mais ou menos ténue. Os judeus de Viena dividiam-se em dois grandes grupos: os que se tinham retirado para uma espécie de ‘inner citadel’ cultural e espacial, e os que renunciavam às suas origens, tentando, a todo o custo, a assimilação e aceitação incondicional. Em que campos se situavam Popper e Wittgenstein? Que diferenças separavam estes homens? O que conduziu à sua rivalidade e ao quase confronto físico, numa pequena sala de Cambridge?
Wittgenstein e Popper haviam já sido baptizados (lembram-se da ideia incial de Herzl em baptizar todos os judeus?), embora, no caso dos Popper, essa mudança tivesse acontecido bem mais tarde (pouco tempos antes do seu nascimento). Acresce ainda um facto indelevelmente diferenciador: Ludwig pertencia a uma das mais ricas famílias austríacas (uma família quase aristocráta, mas discreta). Mesmo levando em consideração o facto de Karl Popper ser filho de um respeitável advogado de Viena, as eventuais semelhanças entre estes dois judeus esbarram logo nesse muro intransponível: os Wittgensteins pareciam ser donos de metade de Viena. A sua influencia económica, social e cultural constituía um mundo à parte (Karl, o pai de Ludwig, foi, por exemplo, um mecenas cultural sem paralelo). Estes dois factos – a assimilação mais tardia dos Popper e a diferença de estatuto social – foram preponderantes nos diferentes destinos destes dois grandes homens.
Embora nada fosse certo a partir do momento em que pesada pata de Hitler aterrou em solo austríaco, Wittgenstein e a sua família, através de subterfúgios, influências (os Wittgensteins eram senhores de uma fortuna de valor incalculável, bem ao jeito das ambições do aparelho nazi) e alguma dose de sorte, puderam lutar por um estatuto favorável, à luz da cartilha nazi. Ludwig e os seus irmãos fizeram tudo o que estava ao seu alcance (podiam-no fazer) para fugir à classificação de Mischlinge de primeiro grau – a mais perigosa das classificações para quem não era judeu pur sang. Quem tivesse três avós de origem judia pura, seria considerado judeu; com dois avós, seria ainda rotulado de judeu se o fosse religiosamente ou estivesse casado com judeus puros; havia ainda a categoria de não-arianos – a que suscitaria a já referida classificação (Mischlinge de 1º. grau). Ludwig e os seus irmãos pareciam estar condenados a não deixarem de ser Reichsbürger. Contudo, arranjaram maneira de provar (?) que um dos avós teria sido um bastardo (logo não-puro), almejando o tão desejado, embora ainda incómodo, estatuto de Mischlinge de 2º. Grau. Os Popper não tiveram tal sorte. A maioria teve de recorrer ao exílio forçado (no caso de Karl Popper, um exílio já desejado antes do Anschluss). Em Viena, cerca de dezasseis familiares de Karl acabaram vitimas do holocausto.
De um lado, Karl Popper. Um homem solitário que subira a vida a pulso (a académica e não só). Um homem bom, intelectualmente humilde e honesto. Um filósofo coerente, com um sentido das proporções apurado, empenhado em dar credibilidade à sua disciplina de forma desassombrada. Um homem céptico em relação ao papel da indução, e para quem a ideia da verificação ou da validação de uma qualquer teoria cientifica com um grau positivo de probabilidade seria inexequível. Para Popper, a diferença entre uma ciência e uma não-ciência estava na forma como as teorias (cientificas) permitiam formular previsões testáveis, sendo segura e facilmente abandonáveis caso falhassem nos testes. Popper rejeitou e lutou contra as chamadas pseudo-ciências ou a pseudo-metodologia cientifica que não permitia, por um lado, recusar determinadas teorias empíricas que não tinham sinais de prova observáveis (o caso do Marxismo), ou, por outro, quando uma qualquer teoria cientifica falhava em permitir obter qualquer previsão empírica (o caso, para Popper, da psicanálise). Daí a grande admiração por Einstein e a descrença em Freud. Popper foi, também, um herói na construção de um mundo sujeito ao escrutínio crítico das ideias, contra as pretensões dos planificadores e dos políticos centralistas que achavam possível desenhar uma sociedade de homens a régua e esquadro, com base, por exemplo, num putativo conhecimento mais ou menos cientifico do curso da história.
Do outro lado, Ludwig Wittgenstein. Um génio, em estado puro. Uma figura ‘larger than life’ - carismática e enigmática. Um homem que sugava o espaço à sua volta, onde quer que estivesse. A referência máxima do Circulo de Viena, o ‘clube’ do Positivismo Lógico. O clube que tornara Wittgenstein seu membro honorário e havia recusado a entrada a Popper. O Positivismo Lógico sustentava a aproximação da filosofia à ciência, devendo aquela estar subordinada a esta. Para o Circulo de Viena, e para Wittgenstein, o alvo a abater era o Idealismo alemão, que reservava um papel preponderante à mente e ao espírito, negligenciando a física e a lógica. Para Ludwig e para os seus seguidores, a ética e a metafísica eram lixo. Ludwig Wittgenstein foi um autêntico furacão que marcou, como poucos, a história da filosofia (as áreas da filosofia da linguagem, da lógica e da matemática passaram a ser «dele»). Um filósofo que rejeitava o tradicional, empenhando-se em avançar, desbravar terreno, fugir dos empecilhos idealistas, formalistas, behaviouristas que minavam, segundo ele, a filosofia. Ludwig Wittgenstein foi dono de uma personalidade complexa, aliada a uma mente super dotada (quando Wittgenstein acabou de formular os planos e os desenhos dos radiadores de parede da casa da irmã, não havia nenhum artesão em Viena que conseguisse estar à altura do projecto...). Um homem contraditório quanto ao seu estatuto e ao seu passado. Wittgenstein chegou a escrever verdadeiros manifestos anti-semitas, defendendo a ideia de que o ‘problema judeu’ não exista senão na cabeça dos judeus, sendo apenas fruto da atitude de auto-vitimização e de auto-exclusão, e na incapacidade de conseguirem deixar de se olhar como uma anormalidade. Ao mesmo tempo, confessava a amigos que considerava ser um homem com pensamentos “100 por cento hebraicos”, entre outras declarações contraditórias. (Tanto Wittgenstein como Popper tinham uma ideia nacionalista quanto ao destino da sua Áustria. Uma Áustria unificada, com as diferentes culturas devidamente assimiladas. Mas Wittgenstein foi sempre mais radical do que Popper na castração do sentimento e do ethos judeu.) Um filósofo incoerente mas revelador de uma inteligência que lhe permitiu a adaptação e a mudança (houve um Wittgesntein I do Tratatus e um Wittgenstein II das Philosophical Investigations).
Em confronto na sala H3 estiveram dois homens com pontos de contacto notórios, mas com vidas distintas e com uma ideia do mundo completamente diferente. A magia deste livro está aí: permitir que sejamos, por momentos, espectadores privilegiados do percurso de dois homens, num fascinante palco político, social e filosófico. Numa Europa que fervilhava de drama, emoção e de vida.
Volto a “Wittgenstein’s Poker”. Naquele que foi o seu primeiro livro, David Edmonds e John Eidinow conseguiram fazer uma coisa dificílima, que requer sensibilidade, tacto, conhecimento e humildade: escrever um livro minimamente acessível a leigos e diletantes, mas de uma minúcia e de um rigor histórico-filosóficos intocáveis. E foi escrito com base na tradição hitchcockiana de utilizar um facto pseudo-relevante para, de seguida, contar uma história bem mais vasta e complexa. O ‘MacGuffin’ neste pequeno livro é, precisamente, a história do já mítico incidente com um atiçador acenado, num frente a frente entre dois dos maiores filósofos do Sec. XX, na também famosa sala H3 do edifício Gibbs, no King’s College (a que acolhia regularmente as reuniões do Clube de Ciência Moral de Cambridge). “Wittgenstein’s Poker” é um pequeno-grande épico, que abre portas e janelas a cada parágrafo.
Ao longo de 250 páginas, Edmonds e Eidinow conduzem-nos numa visita absolutamente fascinante pelo espírito de uma época já desaparecida. De uma época onde a paixão das ideias era vital, livre do relativismo ou da incerteza pós-modernista.
Apesar das notórias diferenças de ‘background’ e da latente rivalidade entre ambos, Wittgenstein e Popper pertenciam à grande comunidade judaica da Europa Central. Karl e Ludwig nasceram na Áustria, tendo crescido na que parecia ser uma das mais cosmopolitas cidades europeias: Viena. Contudo, a comunidade judaica austríaca, incluindo os membros perfeitamente assimilados, produto ou não da miscigenação cultural ou sanguínea, nunca deixou de sentir, omnipresente, a incómoda sensação de iminente discriminação, ainda que mais ou menos ténue. Os judeus de Viena dividiam-se em dois grandes grupos: os que se tinham retirado para uma espécie de ‘inner citadel’ cultural e espacial, e os que renunciavam às suas origens, tentando, a todo o custo, a assimilação e aceitação incondicional. Em que campos se situavam Popper e Wittgenstein? Que diferenças separavam estes homens? O que conduziu à sua rivalidade e ao quase confronto físico, numa pequena sala de Cambridge?
Wittgenstein e Popper haviam já sido baptizados (lembram-se da ideia incial de Herzl em baptizar todos os judeus?), embora, no caso dos Popper, essa mudança tivesse acontecido bem mais tarde (pouco tempos antes do seu nascimento). Acresce ainda um facto indelevelmente diferenciador: Ludwig pertencia a uma das mais ricas famílias austríacas (uma família quase aristocráta, mas discreta). Mesmo levando em consideração o facto de Karl Popper ser filho de um respeitável advogado de Viena, as eventuais semelhanças entre estes dois judeus esbarram logo nesse muro intransponível: os Wittgensteins pareciam ser donos de metade de Viena. A sua influencia económica, social e cultural constituía um mundo à parte (Karl, o pai de Ludwig, foi, por exemplo, um mecenas cultural sem paralelo). Estes dois factos – a assimilação mais tardia dos Popper e a diferença de estatuto social – foram preponderantes nos diferentes destinos destes dois grandes homens.
Embora nada fosse certo a partir do momento em que pesada pata de Hitler aterrou em solo austríaco, Wittgenstein e a sua família, através de subterfúgios, influências (os Wittgensteins eram senhores de uma fortuna de valor incalculável, bem ao jeito das ambições do aparelho nazi) e alguma dose de sorte, puderam lutar por um estatuto favorável, à luz da cartilha nazi. Ludwig e os seus irmãos fizeram tudo o que estava ao seu alcance (podiam-no fazer) para fugir à classificação de Mischlinge de primeiro grau – a mais perigosa das classificações para quem não era judeu pur sang. Quem tivesse três avós de origem judia pura, seria considerado judeu; com dois avós, seria ainda rotulado de judeu se o fosse religiosamente ou estivesse casado com judeus puros; havia ainda a categoria de não-arianos – a que suscitaria a já referida classificação (Mischlinge de 1º. grau). Ludwig e os seus irmãos pareciam estar condenados a não deixarem de ser Reichsbürger. Contudo, arranjaram maneira de provar (?) que um dos avós teria sido um bastardo (logo não-puro), almejando o tão desejado, embora ainda incómodo, estatuto de Mischlinge de 2º. Grau. Os Popper não tiveram tal sorte. A maioria teve de recorrer ao exílio forçado (no caso de Karl Popper, um exílio já desejado antes do Anschluss). Em Viena, cerca de dezasseis familiares de Karl acabaram vitimas do holocausto.
De um lado, Karl Popper. Um homem solitário que subira a vida a pulso (a académica e não só). Um homem bom, intelectualmente humilde e honesto. Um filósofo coerente, com um sentido das proporções apurado, empenhado em dar credibilidade à sua disciplina de forma desassombrada. Um homem céptico em relação ao papel da indução, e para quem a ideia da verificação ou da validação de uma qualquer teoria cientifica com um grau positivo de probabilidade seria inexequível. Para Popper, a diferença entre uma ciência e uma não-ciência estava na forma como as teorias (cientificas) permitiam formular previsões testáveis, sendo segura e facilmente abandonáveis caso falhassem nos testes. Popper rejeitou e lutou contra as chamadas pseudo-ciências ou a pseudo-metodologia cientifica que não permitia, por um lado, recusar determinadas teorias empíricas que não tinham sinais de prova observáveis (o caso do Marxismo), ou, por outro, quando uma qualquer teoria cientifica falhava em permitir obter qualquer previsão empírica (o caso, para Popper, da psicanálise). Daí a grande admiração por Einstein e a descrença em Freud. Popper foi, também, um herói na construção de um mundo sujeito ao escrutínio crítico das ideias, contra as pretensões dos planificadores e dos políticos centralistas que achavam possível desenhar uma sociedade de homens a régua e esquadro, com base, por exemplo, num putativo conhecimento mais ou menos cientifico do curso da história.
Do outro lado, Ludwig Wittgenstein. Um génio, em estado puro. Uma figura ‘larger than life’ - carismática e enigmática. Um homem que sugava o espaço à sua volta, onde quer que estivesse. A referência máxima do Circulo de Viena, o ‘clube’ do Positivismo Lógico. O clube que tornara Wittgenstein seu membro honorário e havia recusado a entrada a Popper. O Positivismo Lógico sustentava a aproximação da filosofia à ciência, devendo aquela estar subordinada a esta. Para o Circulo de Viena, e para Wittgenstein, o alvo a abater era o Idealismo alemão, que reservava um papel preponderante à mente e ao espírito, negligenciando a física e a lógica. Para Ludwig e para os seus seguidores, a ética e a metafísica eram lixo. Ludwig Wittgenstein foi um autêntico furacão que marcou, como poucos, a história da filosofia (as áreas da filosofia da linguagem, da lógica e da matemática passaram a ser «dele»). Um filósofo que rejeitava o tradicional, empenhando-se em avançar, desbravar terreno, fugir dos empecilhos idealistas, formalistas, behaviouristas que minavam, segundo ele, a filosofia. Ludwig Wittgenstein foi dono de uma personalidade complexa, aliada a uma mente super dotada (quando Wittgenstein acabou de formular os planos e os desenhos dos radiadores de parede da casa da irmã, não havia nenhum artesão em Viena que conseguisse estar à altura do projecto...). Um homem contraditório quanto ao seu estatuto e ao seu passado. Wittgenstein chegou a escrever verdadeiros manifestos anti-semitas, defendendo a ideia de que o ‘problema judeu’ não exista senão na cabeça dos judeus, sendo apenas fruto da atitude de auto-vitimização e de auto-exclusão, e na incapacidade de conseguirem deixar de se olhar como uma anormalidade. Ao mesmo tempo, confessava a amigos que considerava ser um homem com pensamentos “100 por cento hebraicos”, entre outras declarações contraditórias. (Tanto Wittgenstein como Popper tinham uma ideia nacionalista quanto ao destino da sua Áustria. Uma Áustria unificada, com as diferentes culturas devidamente assimiladas. Mas Wittgenstein foi sempre mais radical do que Popper na castração do sentimento e do ethos judeu.) Um filósofo incoerente mas revelador de uma inteligência que lhe permitiu a adaptação e a mudança (houve um Wittgesntein I do Tratatus e um Wittgenstein II das Philosophical Investigations).
Em confronto na sala H3 estiveram dois homens com pontos de contacto notórios, mas com vidas distintas e com uma ideia do mundo completamente diferente. A magia deste livro está aí: permitir que sejamos, por momentos, espectadores privilegiados do percurso de dois homens, num fascinante palco político, social e filosófico. Numa Europa que fervilhava de drama, emoção e de vida.
terça-feira, julho 29, 2003
AUDEN, WYSTAN HUGH
Lullaby
Lay your sleeping head, my love,
Human on my faithless arm;
Time and fevers burn away
Individual beauty from
Thoughtful children, and the grave
Proves the child ephemeral:
But in my arms till break of day
Let the living creature lie,
Mortal, guilty, but to me
The entirely beautiful.
Lullaby
Lay your sleeping head, my love,
Human on my faithless arm;
Time and fevers burn away
Individual beauty from
Thoughtful children, and the grave
Proves the child ephemeral:
But in my arms till break of day
Let the living creature lie,
Mortal, guilty, but to me
The entirely beautiful.
SON OF A BEACH
Ao contrário do meu caro Woody Allen, gosto de praia. E há um momento mágico: fins-de-tarde.
Ao contrário do meu caro Woody Allen, gosto de praia. E há um momento mágico: fins-de-tarde.
ROOM 15-20
Continuarei a amar este filme. Continuarei a achar o diálogo/monólogo entre Harry Dean Stanton e Nastassja Kinski, no peep-show, um dos mais belos momentos do cinema contemporâneo. Wim Wenders e Sam Shepard produziram um prodígio. Em boa hora a colecção “Y” do Público (agora numa excelente 2ª. Série), distribuiu este grande filme. Obrigado.
Continuarei a amar este filme. Continuarei a achar o diálogo/monólogo entre Harry Dean Stanton e Nastassja Kinski, no peep-show, um dos mais belos momentos do cinema contemporâneo. Wim Wenders e Sam Shepard produziram um prodígio. Em boa hora a colecção “Y” do Público (agora numa excelente 2ª. Série), distribuiu este grande filme. Obrigado.
O ATIÇADOR DE WITTGENSTEIN
Vá, perguntem-me: “qual o livro que mais prazer te deu ler, nos últimos anos?”. E perguntem, ainda: “qual o livro que mais te instigou a ler outros livros, directa ou indirectamente relacionados?”. Perguntas aparentemente difíceis, caso eu não tivesse lido, há uns bons meses atrás, e relido, nas férias, esta portentosa obra.
Vá, perguntem-me: “qual o livro que mais prazer te deu ler, nos últimos anos?”. E perguntem, ainda: “qual o livro que mais te instigou a ler outros livros, directa ou indirectamente relacionados?”. Perguntas aparentemente difíceis, caso eu não tivesse lido, há uns bons meses atrás, e relido, nas férias, esta portentosa obra.
LEVAR MUITO A SÉRIO
Entretanto, o Dr. Ferro Rodrigues voltou à ribalta, com a tese da cabala. Desta vez, falou em “forças não eleitas” que pretendem “decapitar” a direcção do PS. Falou ainda de uma "direita" que o pretende "caluniar". Como no passado, pouco mais adiantou.
Pacheco Pereira defendeu, em artigo de opinião no Público, que as declarações do Dr. Ferro Rodrigues são para levar a sério. Mais: Pacheco Pereira, levando em consideração o insofismável (?) facto de o Dr. Ferro Rodrigues ser um político “sério” e “responsável”, lança o repto exigindo que o mesmo «esclareça» e «aprofunde» as suas declarações.
Já Constança Cunha e Sá, na sua regressada crónica no Indy, afirma que as declarações do Dr. Ferro Rodrigues não são para levar a sério. Que são um role de diatribes inconsequentes, quiçá próprias da ‘estação parvinha’.
Compreendo a Constança. E compreendo o Pacheco Pereira. Mas eu vejo a questão desta forma: as declarações do Dr. Ferro Rodrigues são para levar a sério na exacta medida em que confirmam, à saciedade, a inépcia e falta de estatura política de um homem que, algures no tempo, tentou vender ao país a imagem de homem de estado, sereno, justo e, atenção, “sério”. O problema é simples: o Dr. Ferro Rodrigues resvala com uma facilidade estonteante para os terrenos apertados da demagogia, da arrogância e do desespero teatral. Last time I checked, responsável não é certamente e um homem de estado não bate assim.
O PS e o Dr. Ferro Rodrigues podem tentar vender a imagem que acharem por bem vender, mas uma coisa é claríssima: o comportamento do secretário geral do segundo maior partido português tem sido dramaticamente patético. Já enjoa (ia escrever “enoja”) a forma absolutamente ridícula como a direcção do PS continua entretida a apanhar papéis e a fazer questão de enfiar uma carapuça por si mesma confeccionada. De quando em vez, tentam serenar os ânimos, dando uma de mão de verniz e exibindo um mínimo de brandura, para, logo a seguir, tudo voltar à estaca zero. São como aqueles putos a quem se lhes coloca brilhantina para segurar o arrepio, sabendo-se de antemão que o efeito será provisório. A atitude de contenção forçada do Dr. Ferro Rodrigues tem a mesma credibilidade que os efeitos especiais de um filme do Ed Wood. Daí que se tenha de levar a sério a 'performance' porque ‘aquilo’ é mesmo assim.
Nesta altura do campeonato, as perguntas que importava fazer à direcção do Partido Socialista Português, e ao seu enigmático líder, eram estas: havia necessidade de tanto zunzum, de tanta histeria, de tanta indignação? Por muito que doesse ver um dos seus ‘filhos pródigos’ envolvido num caso de justiça com direito a prisão preventiva, numa questão sórdida e repugnante como é a pedófilia, havia necessidade de achincalhar a Justiça portuguesa, questionar os procedimentos penais que eles próprios ajudaram a criar (como se, só agora, tudo estivesse em causa), acenar com fantasmas de forças obscuras de direita, de cabalas e de inimigos difusos?
Valerá a pena formulá-las? Claro que não. Enquanto o seu líder continuar a espernear intermitentemente com o ar mais lixado do mundo, nada mais será escutado no Largo do Rato.
Diz o Dr. Ferro Rodrigues que “as pessoas não são estúpidas”. Pois não. Aí, estou de acordo com ele.
Entretanto, o Dr. Ferro Rodrigues voltou à ribalta, com a tese da cabala. Desta vez, falou em “forças não eleitas” que pretendem “decapitar” a direcção do PS. Falou ainda de uma "direita" que o pretende "caluniar". Como no passado, pouco mais adiantou.
Pacheco Pereira defendeu, em artigo de opinião no Público, que as declarações do Dr. Ferro Rodrigues são para levar a sério. Mais: Pacheco Pereira, levando em consideração o insofismável (?) facto de o Dr. Ferro Rodrigues ser um político “sério” e “responsável”, lança o repto exigindo que o mesmo «esclareça» e «aprofunde» as suas declarações.
Já Constança Cunha e Sá, na sua regressada crónica no Indy, afirma que as declarações do Dr. Ferro Rodrigues não são para levar a sério. Que são um role de diatribes inconsequentes, quiçá próprias da ‘estação parvinha’.
Compreendo a Constança. E compreendo o Pacheco Pereira. Mas eu vejo a questão desta forma: as declarações do Dr. Ferro Rodrigues são para levar a sério na exacta medida em que confirmam, à saciedade, a inépcia e falta de estatura política de um homem que, algures no tempo, tentou vender ao país a imagem de homem de estado, sereno, justo e, atenção, “sério”. O problema é simples: o Dr. Ferro Rodrigues resvala com uma facilidade estonteante para os terrenos apertados da demagogia, da arrogância e do desespero teatral. Last time I checked, responsável não é certamente e um homem de estado não bate assim.
O PS e o Dr. Ferro Rodrigues podem tentar vender a imagem que acharem por bem vender, mas uma coisa é claríssima: o comportamento do secretário geral do segundo maior partido português tem sido dramaticamente patético. Já enjoa (ia escrever “enoja”) a forma absolutamente ridícula como a direcção do PS continua entretida a apanhar papéis e a fazer questão de enfiar uma carapuça por si mesma confeccionada. De quando em vez, tentam serenar os ânimos, dando uma de mão de verniz e exibindo um mínimo de brandura, para, logo a seguir, tudo voltar à estaca zero. São como aqueles putos a quem se lhes coloca brilhantina para segurar o arrepio, sabendo-se de antemão que o efeito será provisório. A atitude de contenção forçada do Dr. Ferro Rodrigues tem a mesma credibilidade que os efeitos especiais de um filme do Ed Wood. Daí que se tenha de levar a sério a 'performance' porque ‘aquilo’ é mesmo assim.
Nesta altura do campeonato, as perguntas que importava fazer à direcção do Partido Socialista Português, e ao seu enigmático líder, eram estas: havia necessidade de tanto zunzum, de tanta histeria, de tanta indignação? Por muito que doesse ver um dos seus ‘filhos pródigos’ envolvido num caso de justiça com direito a prisão preventiva, numa questão sórdida e repugnante como é a pedófilia, havia necessidade de achincalhar a Justiça portuguesa, questionar os procedimentos penais que eles próprios ajudaram a criar (como se, só agora, tudo estivesse em causa), acenar com fantasmas de forças obscuras de direita, de cabalas e de inimigos difusos?
Valerá a pena formulá-las? Claro que não. Enquanto o seu líder continuar a espernear intermitentemente com o ar mais lixado do mundo, nada mais será escutado no Largo do Rato.
Diz o Dr. Ferro Rodrigues que “as pessoas não são estúpidas”. Pois não. Aí, estou de acordo com ele.
TVI NO SEU MELHOR, II
Telejornal da TVI, 3ª. feira, 22 de Julho: “Jovens permanecem castos até ao casamento. (...). Há cada vez mais jovens que decidem chegar ‘virgens’ à noite de núpcias”(sic).
Telejornal da TVI, 4ª. feira, 23 de Julho: “Saiba como se trocam casais em Portugal, onde vale tudo e depois cada um volta para a sua casinha”(sic).
Conclusão: é o que dá refrear, durante tanto tempo, o chamamento da natureza...
Telejornal da TVI, 3ª. feira, 22 de Julho: “Jovens permanecem castos até ao casamento. (...). Há cada vez mais jovens que decidem chegar ‘virgens’ à noite de núpcias”(sic).
Telejornal da TVI, 4ª. feira, 23 de Julho: “Saiba como se trocam casais em Portugal, onde vale tudo e depois cada um volta para a sua casinha”(sic).
Conclusão: é o que dá refrear, durante tanto tempo, o chamamento da natureza...
TVI NO SEU MELHOR, I
As férias dão para tudo. Inclusivamente, para ter conhecimento da existência de um programa apresentado pelo Sr. Cláudio Ramos, na TVI, subordinado ao tema dos vídeos caseiros. Ao fim de um minuto, descobri tudo: o Sr. Claudio Ramos e Sra. Dª. Teresa Guilherme são uma e a mesma pessoa.
As férias dão para tudo. Inclusivamente, para ter conhecimento da existência de um programa apresentado pelo Sr. Cláudio Ramos, na TVI, subordinado ao tema dos vídeos caseiros. Ao fim de um minuto, descobri tudo: o Sr. Claudio Ramos e Sra. Dª. Teresa Guilherme são uma e a mesma pessoa.
NO TOPO
Tenho vindo a deliciar-me com as intervenções do Dr. Augusto Santos Silva, no jornal Público. Estive tentado a fazer, aqui, umas observações sobre a figura e prosa do ex-ministro, mas, para já, arrisco apenas esta proverbial questão: descontando os casos clínicos (Ruben de Carvalho & Ca. Lda.), no vastíssimo leque (são, realmente, muitos) de «opinion-makers» que botam, actualmente, discurso na imprensa desta nação valente, alguém conseguirá encontrar um articulista mais dogmático, aparelhista, ‘narrow minded’ e maniqueista que o Dr. Santos Silva? Muiiiiiiito difícil.
Tenho vindo a deliciar-me com as intervenções do Dr. Augusto Santos Silva, no jornal Público. Estive tentado a fazer, aqui, umas observações sobre a figura e prosa do ex-ministro, mas, para já, arrisco apenas esta proverbial questão: descontando os casos clínicos (Ruben de Carvalho & Ca. Lda.), no vastíssimo leque (são, realmente, muitos) de «opinion-makers» que botam, actualmente, discurso na imprensa desta nação valente, alguém conseguirá encontrar um articulista mais dogmático, aparelhista, ‘narrow minded’ e maniqueista que o Dr. Santos Silva? Muiiiiiiito difícil.
DE REGRESSO
Após umas merecidas férias na praia, com a família, volto a anunciar, a todo o auditório: presente!
Após umas merecidas férias na praia, com a família, volto a anunciar, a todo o auditório: presente!
sexta-feira, julho 18, 2003
SÓ MAIS UMA COISA
Um recado para o Pedro Mexia: "What Went Wrong" é um excelente livro. O Edward Said é um idiota. Boas leituras, caro Pedro.
Um recado para o Pedro Mexia: "What Went Wrong" é um excelente livro. O Edward Said é um idiota. Boas leituras, caro Pedro.
10.000 HITS. VOU DE FÉRIAS
O ‘site meter’ informa-me, via correio electrónico, que o meu blogue atingiu os 10.000 ‘hits’. Agradeço aos meus estimados leitores e amigos a atenção dispensada. Continuarei a tentar não defraudar as vossas expectativas. Da vossa parte, esperarei sempre um olhar crítico. Ou, em português-pimba, que me vão chegando nas orelhas.
Agora, se me dão licença, vou de férias. Regresso dia 28 de Julho. Vou carregado de livros. Levo também o caderninho e a caneta. Voltarei com as baterias recarregadas e com muita coisa para contar.
Abraços. E boas férias, se for caso disso.
O ‘site meter’ informa-me, via correio electrónico, que o meu blogue atingiu os 10.000 ‘hits’. Agradeço aos meus estimados leitores e amigos a atenção dispensada. Continuarei a tentar não defraudar as vossas expectativas. Da vossa parte, esperarei sempre um olhar crítico. Ou, em português-pimba, que me vão chegando nas orelhas.
Agora, se me dão licença, vou de férias. Regresso dia 28 de Julho. Vou carregado de livros. Levo também o caderninho e a caneta. Voltarei com as baterias recarregadas e com muita coisa para contar.
Abraços. E boas férias, se for caso disso.
O HOMEM QUE TRADUZIU OAKESHOTT
O Pedro Lomba revela-nos que o recém inaugurado Reflexos de Azul Eléctrico pertence a José Bragança de Miranda, o responsável pela única tradução para português de uma obra de Michael Oakeshott (qual?). Para além desse excelentíssimo feito, José Braga de Miranda escreve de forma primorosa.
Abusando da latitude do trato, atrevo-me a perguntar: caro José, onde tens tu andado??? Bem-vindo!
O Pedro Lomba revela-nos que o recém inaugurado Reflexos de Azul Eléctrico pertence a José Bragança de Miranda, o responsável pela única tradução para português de uma obra de Michael Oakeshott (qual?). Para além desse excelentíssimo feito, José Braga de Miranda escreve de forma primorosa.
Abusando da latitude do trato, atrevo-me a perguntar: caro José, onde tens tu andado??? Bem-vindo!
quinta-feira, julho 17, 2003
MEA CULPA
Tal como o Nuno, também eu me tinha esquecido de dar as boas vindas ao A Esquina do Rio. Do Blitz ao Indy, passando pelo Sete, tenho seguido o percurso do Manuel Falcão e, devo dizê-lo, estou regularmente em sintonia com a sua (cosmo)visão do mundo. Por isso, a pastinha dos "Favoritos" voltou a engordar.
Bem-vindo Manel!
Tal como o Nuno, também eu me tinha esquecido de dar as boas vindas ao A Esquina do Rio. Do Blitz ao Indy, passando pelo Sete, tenho seguido o percurso do Manuel Falcão e, devo dizê-lo, estou regularmente em sintonia com a sua (cosmo)visão do mundo. Por isso, a pastinha dos "Favoritos" voltou a engordar.
Bem-vindo Manel!
O FIM
O beetle vai deixar de ser produzido. Isso mesmo foi anunciado na única fábrica da VW que ainda o fabricava, no México. Chega ao fim a produção do mais mítico dos modelos da VW e, seguramente, da história da industria automóvel. Foi num carocha que a minha mãe tirou a carta. Quase sempre a acompanhava, ficando no banco de trás a observar a instrução. Lembro-me dos estofos de napa creme, dos botões patuscos, da parcimónia da instrumentação, da austeridade dos materiais. Em memória do Sr. Porsche, aqui fica o registo. Para a posteridade.
(Já agora, sou da opinião de que a VW fez muito mal em ter lançado uma versão ‘modernaça’ do carocha. Há coisas que não são actualizáveis e modernizáveis. Esta era uma delas.)
O beetle vai deixar de ser produzido. Isso mesmo foi anunciado na única fábrica da VW que ainda o fabricava, no México. Chega ao fim a produção do mais mítico dos modelos da VW e, seguramente, da história da industria automóvel. Foi num carocha que a minha mãe tirou a carta. Quase sempre a acompanhava, ficando no banco de trás a observar a instrução. Lembro-me dos estofos de napa creme, dos botões patuscos, da parcimónia da instrumentação, da austeridade dos materiais. Em memória do Sr. Porsche, aqui fica o registo. Para a posteridade.
(Já agora, sou da opinião de que a VW fez muito mal em ter lançado uma versão ‘modernaça’ do carocha. Há coisas que não são actualizáveis e modernizáveis. Esta era uma delas.)
ANGEL TIGER
Há na voz solene, tocante e experiente de June Tabor uma religiosidade que nos parece sempre convocar para uma viagem pela memória do mundo e das suas gentes. Oiça-se o majestoso Angel Tiger. Todo o ambiente nos remete para o inicio da aventura da vida, repleta de perigos, desespero, dor, saudade, mas também de esperança e conforto. Palavras fortes, imensas que dançam com o piano de Huw Warren, o clarinete de Mark Lockheart, o violoncelo e o acordeão de Mark Emerson. Angel Tiger é, sob qualquer prisma, uma obra-prima absoluta. Um clássico intocável, que perdurará no tempo, para sempre. Nada está deslocado, nada está a mais ou a menos. Sempre que o oiço, fico a pensar na imagem de cinco músicos, uma cantora e um magnifico produtor, afastados uma vida inteira para, um dia, se reunirem e celebrarem a dança dos sentidos como nunca antes o haviam feito. Chegaram, escolheram o que importava escolher - clássicos de Elvis Costello, Richard Thompson, Ronald Jamieson, Eric Taylor e melodias tradicionais – e fizeram o que tinha de ser feito. Bendita, pois, a hora em que isso aconteceu. Bendita a hora em que a magia da música ficou registada. Este é o disco de todos os reencontros com a nossa espiritualidade.
Há na voz solene, tocante e experiente de June Tabor uma religiosidade que nos parece sempre convocar para uma viagem pela memória do mundo e das suas gentes. Oiça-se o majestoso Angel Tiger. Todo o ambiente nos remete para o inicio da aventura da vida, repleta de perigos, desespero, dor, saudade, mas também de esperança e conforto. Palavras fortes, imensas que dançam com o piano de Huw Warren, o clarinete de Mark Lockheart, o violoncelo e o acordeão de Mark Emerson. Angel Tiger é, sob qualquer prisma, uma obra-prima absoluta. Um clássico intocável, que perdurará no tempo, para sempre. Nada está deslocado, nada está a mais ou a menos. Sempre que o oiço, fico a pensar na imagem de cinco músicos, uma cantora e um magnifico produtor, afastados uma vida inteira para, um dia, se reunirem e celebrarem a dança dos sentidos como nunca antes o haviam feito. Chegaram, escolheram o que importava escolher - clássicos de Elvis Costello, Richard Thompson, Ronald Jamieson, Eric Taylor e melodias tradicionais – e fizeram o que tinha de ser feito. Bendita, pois, a hora em que isso aconteceu. Bendita a hora em que a magia da música ficou registada. Este é o disco de todos os reencontros com a nossa espiritualidade.
quarta-feira, julho 16, 2003
BOCEJO
É minha impressão ou o último álbum dos Tosca (o projecto de Richard Dorfmeister e Rupert Huber), "Dehli9", representa um sonoro bocejo? Exagero ou não, "Dehli9" está muitos furos abaixo de "Suzuki" e "Opera". É pena. O Sr. Dorfmeister já nos tinha habituado a outro nível.
É minha impressão ou o último álbum dos Tosca (o projecto de Richard Dorfmeister e Rupert Huber), "Dehli9", representa um sonoro bocejo? Exagero ou não, "Dehli9" está muitos furos abaixo de "Suzuki" e "Opera". É pena. O Sr. Dorfmeister já nos tinha habituado a outro nível.
A FAMÍLIA SOARES
A forma como a Dra. Maria Barroso se refere à “família Soares”, parece conter reminiscências de um certo 'milieu'. Antevejo, daqui a uns tempos: “A famiglia Soares” de Martin Scorcese, brevemente em exibição num cinema perto de si.
A forma como a Dra. Maria Barroso se refere à “família Soares”, parece conter reminiscências de um certo 'milieu'. Antevejo, daqui a uns tempos: “A famiglia Soares” de Martin Scorcese, brevemente em exibição num cinema perto de si.
THE FRENCH CONNECTION
Adivinhem qual foi o país cujos serviços secretos venderam a informação – pelos vistos errada – de que Saddam teria tentado comprar urânio à Nigéria? Leiam tudo aqui.
Adivinhem qual foi o país cujos serviços secretos venderam a informação – pelos vistos errada – de que Saddam teria tentado comprar urânio à Nigéria? Leiam tudo aqui.
ASSIM NÃO, MR. BUSH
Sou insuspeito no que vou dizer. E sou insuspeito porque enfio regularmente a carapuça de pró-americano primário sem problemas de maior.
Não posso deixar de subscrever, na integra, o editorial da The Economist sobre a intenção do governo norte-americano de criar comissões miltares para o julgamento dos suspeitos de práticas terroristas:
”You are taken prisoner in Afghanistan, bound and gagged, flown to the other side of the world and then imprisoned for months in solitary confinement punctuated by interrogations during which you have no legal advice. Finally, you are told what is to be your fate: a trial before a panel of military officers. Your defence lawyer will also be a military officer, and anything you say to him can be recorded. Your trial might be held in secret. You might not be told all the evidence against you. You might be sentenced to death. If you are convicted, you can appeal, but only to yet another panel of military officers. Your ultimate right of appeal is not to a judge but to politicians who have already called everyone in the prison where you are held “killers” and the “worst of the worst”. Even if you are acquitted, or if your appeal against conviction succeeds, you might not go free. Instead you could be returned to your cell and held indefinitely as an “enemy combatant.”
O artigo, sugestivamente intitulado “Unjust, unwise, unAmerican”, termina com um aviso à navegação:
”Mr Bush could have asked Congress to pass new anti-terrorism laws. Instead, he is setting up a shadow court system outside the reach of either Congress or America's judiciary, and answerable only to himself. Such a system is the antithesis of the rule of law which the United States was founded to uphold. In a speech on July 4th, Mr Bush rightly noted that American ideals have been a beacon of hope to others around the world. In compromising those ideals in this matter, Mr Bush is not only dismaying America's friends but also blunting one of America's most powerful weapons against terrorism.”
Sou insuspeito no que vou dizer. E sou insuspeito porque enfio regularmente a carapuça de pró-americano primário sem problemas de maior.
Não posso deixar de subscrever, na integra, o editorial da The Economist sobre a intenção do governo norte-americano de criar comissões miltares para o julgamento dos suspeitos de práticas terroristas:
”You are taken prisoner in Afghanistan, bound and gagged, flown to the other side of the world and then imprisoned for months in solitary confinement punctuated by interrogations during which you have no legal advice. Finally, you are told what is to be your fate: a trial before a panel of military officers. Your defence lawyer will also be a military officer, and anything you say to him can be recorded. Your trial might be held in secret. You might not be told all the evidence against you. You might be sentenced to death. If you are convicted, you can appeal, but only to yet another panel of military officers. Your ultimate right of appeal is not to a judge but to politicians who have already called everyone in the prison where you are held “killers” and the “worst of the worst”. Even if you are acquitted, or if your appeal against conviction succeeds, you might not go free. Instead you could be returned to your cell and held indefinitely as an “enemy combatant.”
O artigo, sugestivamente intitulado “Unjust, unwise, unAmerican”, termina com um aviso à navegação:
”Mr Bush could have asked Congress to pass new anti-terrorism laws. Instead, he is setting up a shadow court system outside the reach of either Congress or America's judiciary, and answerable only to himself. Such a system is the antithesis of the rule of law which the United States was founded to uphold. In a speech on July 4th, Mr Bush rightly noted that American ideals have been a beacon of hope to others around the world. In compromising those ideals in this matter, Mr Bush is not only dismaying America's friends but also blunting one of America's most powerful weapons against terrorism.”
AINDA HOBBES
Bruno Alves, do recém inaugurado Desesperada Esperança, considera acertada a comparação entre a política externa norte-americana e a filosofia política de Hobbes. E são duas as razões: a administração Bush é pessimista em relação à natureza humana; a administração Bush considera o sistema internacional um sistema instável e tendencialmente anárquico (considerá-lo-á Bruno Alves uma aproximação do Hobbesiano «state of nature»?). Daí que tenha optado, depois do 11 de Setembro, por uma política intervencionista - pró-activa e com objectivos preventivos. Para início de discussão, dou de barato que sim. Mas, é bom lembrar, Hobbes não foi o primeiro, e, seguramente, o último filósofo pessimista. Por outro lado, como o próprio Bruno Alves reconhece, os EUA estão simplesmente a defender os seus interesses e a tentar aniquilar os focos de irracionalidade e instabilidade político-religiosos que possam vir a produzir mais anti-corpos contra o way of life ocidental/liberal. Partindo deste pressuposto, parece-me forçada a comparação a Hobbes. Já que estamos em matéria de paralelos, em vez de Hobbes, porque não falar em Carl Schmitt? Foi precisamente Carl Schmitt que em “The Nomos of the Earth” alinhavou uma História de relações internacionais baseada no conflito e na inimizade, como consequência da crescente habilidade do homem para se deslocar e para instituir novos centros de influência e de instabilidade à escala global – uma das principais causas, segundo Schmitt, para a dissolução das soberanias e do sistema tradicional de esferas. O extremar dessas tendências, levaria ao despoletar de guerras, levadas a cabo por determinados países contra inimigos absolutos (difusos ou não). Guerras essas guiadas por princípios morais universais. Em suma, parece-me incorrecta, ou, no mínimo, fraca, a equivalência entre a real politik norte-americana e o universo Hobbesiano. Caso contrário, o velho Hobbes passaria a servir de muleta e justificação a qualquer conflito bélico que ousasse estabelecer uma determinada «ordem». Convenhamos, caro Bruno: as coisas não são assim tão lineares e liquidas. Como diria o José Manuel Fernandes, às vezes é preciso ligar o «complicador» para evitar paralelismos simplistas.
Bruno Alves, do recém inaugurado Desesperada Esperança, considera acertada a comparação entre a política externa norte-americana e a filosofia política de Hobbes. E são duas as razões: a administração Bush é pessimista em relação à natureza humana; a administração Bush considera o sistema internacional um sistema instável e tendencialmente anárquico (considerá-lo-á Bruno Alves uma aproximação do Hobbesiano «state of nature»?). Daí que tenha optado, depois do 11 de Setembro, por uma política intervencionista - pró-activa e com objectivos preventivos. Para início de discussão, dou de barato que sim. Mas, é bom lembrar, Hobbes não foi o primeiro, e, seguramente, o último filósofo pessimista. Por outro lado, como o próprio Bruno Alves reconhece, os EUA estão simplesmente a defender os seus interesses e a tentar aniquilar os focos de irracionalidade e instabilidade político-religiosos que possam vir a produzir mais anti-corpos contra o way of life ocidental/liberal. Partindo deste pressuposto, parece-me forçada a comparação a Hobbes. Já que estamos em matéria de paralelos, em vez de Hobbes, porque não falar em Carl Schmitt? Foi precisamente Carl Schmitt que em “The Nomos of the Earth” alinhavou uma História de relações internacionais baseada no conflito e na inimizade, como consequência da crescente habilidade do homem para se deslocar e para instituir novos centros de influência e de instabilidade à escala global – uma das principais causas, segundo Schmitt, para a dissolução das soberanias e do sistema tradicional de esferas. O extremar dessas tendências, levaria ao despoletar de guerras, levadas a cabo por determinados países contra inimigos absolutos (difusos ou não). Guerras essas guiadas por princípios morais universais. Em suma, parece-me incorrecta, ou, no mínimo, fraca, a equivalência entre a real politik norte-americana e o universo Hobbesiano. Caso contrário, o velho Hobbes passaria a servir de muleta e justificação a qualquer conflito bélico que ousasse estabelecer uma determinada «ordem». Convenhamos, caro Bruno: as coisas não são assim tão lineares e liquidas. Como diria o José Manuel Fernandes, às vezes é preciso ligar o «complicador» para evitar paralelismos simplistas.
terça-feira, julho 15, 2003
VASCO. SEMPRE.
“PORTUGAL NUNCA EXISTIU
Há quem diga que não percebe a estranha distinção entre Estado e sociedade civil, nem entende muito bem o que se pretende designar quando se fala de enfraquecimento da sociedade civil. Mas uma pessoa, que todas as semanas tem de escrever três páginas dactilografadas sobre, ou a propósito, do que se vai passando no País, está constantemente posta perante um sintoma acabrunhador desse misterioso distúrbio.
É que, para o chamados órgãos de comunicação social e, portanto, para a opinião pública, em Portugal, só existe e só sucede política. Os jornais, por exemplo, são de uma leitura deprimente. Absortos no submundo que começa em S. Bento e acaba em Belém, através da rua António Serpa, da rua da Emenda, da rua de Buenos Aires e do largo do Caldas, ignoram com uma militância obstinada e convicta que, cá fora, há gente que continua a viver, a trabalhar, eventualmente a amar, e regularmente a morrer.
Semana após terrível semana, servem-se análises eruditas das voltas e reviravoltas do poder, profecias, informações confidenciais (quase sempre falsas ou erradas) sobre o que se prepara para o dia seguinte, entrevistas com dirigentes partidários ou antipartidários, boatos, calúnias e ameaças. O que surpreende é que apareça ainda quem compre esta sufocante dieta.
Nos últimos tempos, apenas dois casos não propriamente políticos atraíram a atenção nacional: o «escândalo» de «Os Anos do Século» e o «escândalo» de «As horas de Maria». Mesmo esses, contudo, provinham da tentativa de envolver a Igreja Católica na política e não provocaram uma discussão sobre respectivamente a nossa história moderna e o papel da religião, no singular País que hoje desgraçadamente temos, mas (com duas ou três excepções) simples objuratórias acusações e demagogia avulsa.
À medida que aumenta o número de candidatos a governá-la, cada vez se sabe menos sobre a sociedade portuguesa. O que é que efectivamente acontece, depois da tão gloriosa revolução de Abril, nas irreformadas aldeias do Minho e nas reformadas aldeias do Alentejo: mudaram as relações de produção, ruíram as antigas hierarquias sociais? E por que outras hierarquias foram substituídas? E qual é também a situação nas fábricas, grandes e pequenas, prósperas e falidas, geridas pelo patrão ou autogeridas? Estão as nossas escolas a combater a desigualdade ou a promovê-la? O que se passa lá dentro? Que ideias se tentam meter na cabeça das crianças e dos adolescentes e que ideias, na realidade, se metem? Que pensam desta curiosa democracia os jovens adultos (empregados e desempregados), o que querem, para onde vão?
E, além disto, que já é muito, sendo um pequeno resumo, coisas se possível mais básicas. Em que consiste, em concreto, o catolicismo em Portugal: quem assiste à missa, quem se confessa, quem participa na vida institucional da Igreja? E a família? Que a faz e quem a desfaz? Divorciamo-nos mais ou menos? Temos mais ou menos filhos? Por que valores morais nos determinamos em Moura e Penafiel, em Lisboa e em Vilar Formoso, nas classes trabalhadoras e nas «classes médias»? Em suma, quem somos nós, os portugueses, vários, contraditórios, transformáveis e transformado-se? Porque é com certeza óbvio que não somos, esse «povo», essa «nação», o ente etéreo e ambíguo que os tão dedicados políticos da República tão lestamente invocam, para se revestir de uma vaporosa autoridade e prometerem maravilhas, com o doce sossego de quem não precisa de prestar contas.
Pior ainda, Portugal, que não se conhece e ninguém conhece, podia talvez manifestar-se na elevisão, no teatro, no cinema, na poesia, no romance. A televisão, porém, é uma fonte de verborreia inextinguível, que nos exprime tanto como o dicionário Torrinha. O teatro, tirando a Cornucópia (segundo me contam), tornou-se, pelo que tenho visto, numa ressurreição em pobre e pedestre dos anos quarenta, quando Amélia Rey Colaço andava distraída.
A revista optou pelo comício nazi, e o «boulevard» pela inanidade lírica. Quanto ao cinema, discutido, subsidiado, objecto de guerras, arranhões e insultos, encontra-se definitivamente reduzido a um prazer solitário para iniciados, cheio de rabinhos, truques, insinuações e referências cultas, que dura três semanas numa sala pequena e logo se some sem ruído na justa obscuridade donde veio. Há cinema, porque meia dúzia de extravagantes persistem em considerar-se cineastas. A poesia, como sempre, rufa o tambor e tange a harpa, mas enquanto esperamos por outro Sena, ficámos só com os bibelots de vacuidade sonoro dos vates PS e congéneres. E, por fim, a prosa deu-nos um romance palavroso, passadista e pueril, «O que diz Molero», e pouco mais de consequência.
Que escrever, pois, senão de política, o imaginário do imaginário? Se se levanta outro espelho sobre o país civil, as ciências sociais, a arte, a filosofia, nada se reflecte ou reflectem-se sombras turvas e incompreensíveis. Os espelhos não prestam ou é Portugal, que apesar de alguma velha evidência em contrário, nunca existiu? Há mesmo um país, ou estamos todos a ser colectivamente sonhados pelo general Eanes, o dr. Soares, o dr. Sá Carneiro e o eng. Amaro da Costa?”
Vasco Pulido Valente
in Expresso, 5-5-1979
O artigo foi retirado da colectânea de crónicas e artigos de Vasco Pulido Valente “O Pais das Maravilhas” (edição Intervenção, 1979). É, sem dúvida, um texto datado. Mas, como é habitual no Vasco Pulido Valente, põe-nos a pensar. Graças a ele, ando há dias entretido com esta inquietante pergunta: Portugal (já) existe?
“PORTUGAL NUNCA EXISTIU
Há quem diga que não percebe a estranha distinção entre Estado e sociedade civil, nem entende muito bem o que se pretende designar quando se fala de enfraquecimento da sociedade civil. Mas uma pessoa, que todas as semanas tem de escrever três páginas dactilografadas sobre, ou a propósito, do que se vai passando no País, está constantemente posta perante um sintoma acabrunhador desse misterioso distúrbio.
É que, para o chamados órgãos de comunicação social e, portanto, para a opinião pública, em Portugal, só existe e só sucede política. Os jornais, por exemplo, são de uma leitura deprimente. Absortos no submundo que começa em S. Bento e acaba em Belém, através da rua António Serpa, da rua da Emenda, da rua de Buenos Aires e do largo do Caldas, ignoram com uma militância obstinada e convicta que, cá fora, há gente que continua a viver, a trabalhar, eventualmente a amar, e regularmente a morrer.
Semana após terrível semana, servem-se análises eruditas das voltas e reviravoltas do poder, profecias, informações confidenciais (quase sempre falsas ou erradas) sobre o que se prepara para o dia seguinte, entrevistas com dirigentes partidários ou antipartidários, boatos, calúnias e ameaças. O que surpreende é que apareça ainda quem compre esta sufocante dieta.
Nos últimos tempos, apenas dois casos não propriamente políticos atraíram a atenção nacional: o «escândalo» de «Os Anos do Século» e o «escândalo» de «As horas de Maria». Mesmo esses, contudo, provinham da tentativa de envolver a Igreja Católica na política e não provocaram uma discussão sobre respectivamente a nossa história moderna e o papel da religião, no singular País que hoje desgraçadamente temos, mas (com duas ou três excepções) simples objuratórias acusações e demagogia avulsa.
À medida que aumenta o número de candidatos a governá-la, cada vez se sabe menos sobre a sociedade portuguesa. O que é que efectivamente acontece, depois da tão gloriosa revolução de Abril, nas irreformadas aldeias do Minho e nas reformadas aldeias do Alentejo: mudaram as relações de produção, ruíram as antigas hierarquias sociais? E por que outras hierarquias foram substituídas? E qual é também a situação nas fábricas, grandes e pequenas, prósperas e falidas, geridas pelo patrão ou autogeridas? Estão as nossas escolas a combater a desigualdade ou a promovê-la? O que se passa lá dentro? Que ideias se tentam meter na cabeça das crianças e dos adolescentes e que ideias, na realidade, se metem? Que pensam desta curiosa democracia os jovens adultos (empregados e desempregados), o que querem, para onde vão?
E, além disto, que já é muito, sendo um pequeno resumo, coisas se possível mais básicas. Em que consiste, em concreto, o catolicismo em Portugal: quem assiste à missa, quem se confessa, quem participa na vida institucional da Igreja? E a família? Que a faz e quem a desfaz? Divorciamo-nos mais ou menos? Temos mais ou menos filhos? Por que valores morais nos determinamos em Moura e Penafiel, em Lisboa e em Vilar Formoso, nas classes trabalhadoras e nas «classes médias»? Em suma, quem somos nós, os portugueses, vários, contraditórios, transformáveis e transformado-se? Porque é com certeza óbvio que não somos, esse «povo», essa «nação», o ente etéreo e ambíguo que os tão dedicados políticos da República tão lestamente invocam, para se revestir de uma vaporosa autoridade e prometerem maravilhas, com o doce sossego de quem não precisa de prestar contas.
Pior ainda, Portugal, que não se conhece e ninguém conhece, podia talvez manifestar-se na elevisão, no teatro, no cinema, na poesia, no romance. A televisão, porém, é uma fonte de verborreia inextinguível, que nos exprime tanto como o dicionário Torrinha. O teatro, tirando a Cornucópia (segundo me contam), tornou-se, pelo que tenho visto, numa ressurreição em pobre e pedestre dos anos quarenta, quando Amélia Rey Colaço andava distraída.
A revista optou pelo comício nazi, e o «boulevard» pela inanidade lírica. Quanto ao cinema, discutido, subsidiado, objecto de guerras, arranhões e insultos, encontra-se definitivamente reduzido a um prazer solitário para iniciados, cheio de rabinhos, truques, insinuações e referências cultas, que dura três semanas numa sala pequena e logo se some sem ruído na justa obscuridade donde veio. Há cinema, porque meia dúzia de extravagantes persistem em considerar-se cineastas. A poesia, como sempre, rufa o tambor e tange a harpa, mas enquanto esperamos por outro Sena, ficámos só com os bibelots de vacuidade sonoro dos vates PS e congéneres. E, por fim, a prosa deu-nos um romance palavroso, passadista e pueril, «O que diz Molero», e pouco mais de consequência.
Que escrever, pois, senão de política, o imaginário do imaginário? Se se levanta outro espelho sobre o país civil, as ciências sociais, a arte, a filosofia, nada se reflecte ou reflectem-se sombras turvas e incompreensíveis. Os espelhos não prestam ou é Portugal, que apesar de alguma velha evidência em contrário, nunca existiu? Há mesmo um país, ou estamos todos a ser colectivamente sonhados pelo general Eanes, o dr. Soares, o dr. Sá Carneiro e o eng. Amaro da Costa?”
Vasco Pulido Valente
in Expresso, 5-5-1979
O artigo foi retirado da colectânea de crónicas e artigos de Vasco Pulido Valente “O Pais das Maravilhas” (edição Intervenção, 1979). É, sem dúvida, um texto datado. Mas, como é habitual no Vasco Pulido Valente, põe-nos a pensar. Graças a ele, ando há dias entretido com esta inquietante pergunta: Portugal (já) existe?
AUTOCRÍTICA
Por vezes, quando leio o que vou escrevendo, vem-me à memória uma frase de Churchill, dirigida a Walter Monckton:
“I still have the ideias, Walter, but I can't find the words to clothe them”
Caros leitores: as minhas sinceras desculpas.
Por vezes, quando leio o que vou escrevendo, vem-me à memória uma frase de Churchill, dirigida a Walter Monckton:
“I still have the ideias, Walter, but I can't find the words to clothe them”
Caros leitores: as minhas sinceras desculpas.
POIS É
COUNTING
Thinking in terms of one
Is easily done –
One room, one bed, one chair,
One person there,
Makes perfect sense; one set
Of wishes can be met,
One coffin filled.
But counting up to two
Is harder to do;
For one must be denied
Before it’s tried.
Philip Larkin, 1955
COUNTING
Thinking in terms of one
Is easily done –
One room, one bed, one chair,
One person there,
Makes perfect sense; one set
Of wishes can be met,
One coffin filled.
But counting up to two
Is harder to do;
For one must be denied
Before it’s tried.
Philip Larkin, 1955
BIRRA
Confirma-se: a Dra. Maria Barroso continua embirrada com o que lhe fizeram. Com a minha filha (de sete anos), costumo usar a velha técnica: não ligar, até a coisa desanuviar. Que tal se fizéssemos o mesmo com a Dra. Maria Barroso? E, já agora, se o fizermos, estaremos a contribuir para o seu 'desaparecimento'? Sem dúvida.
Confirma-se: a Dra. Maria Barroso continua embirrada com o que lhe fizeram. Com a minha filha (de sete anos), costumo usar a velha técnica: não ligar, até a coisa desanuviar. Que tal se fizéssemos o mesmo com a Dra. Maria Barroso? E, já agora, se o fizermos, estaremos a contribuir para o seu 'desaparecimento'? Sem dúvida.
PARTURIENT MONTES, NASCETUR RIDICULUS MUS *
O impoluto e virginal Dr. Manuel Monteiro vem, agora, passados oito anos, afirmar que o seu ex-partido (note-se: ex-partido) andou em negociatas a propósito do Orçamento de Estado de então. E diz que só fala se o Eng. Guterres lhe der autorização para tal. A sério: a postura e discurso do Sr. Nova Democracia já chegaram a um ponto que roçam o ridículo. As atoardas do Sr. Monteiro já nem sequer me inspiram a mais leve piada em torno das mesmas. Fica a pergunta: Manel, pá, para quando um CD?
* As montanhas darão à luz um ratinho ridículo (HORACIO)
O impoluto e virginal Dr. Manuel Monteiro vem, agora, passados oito anos, afirmar que o seu ex-partido (note-se: ex-partido) andou em negociatas a propósito do Orçamento de Estado de então. E diz que só fala se o Eng. Guterres lhe der autorização para tal. A sério: a postura e discurso do Sr. Nova Democracia já chegaram a um ponto que roçam o ridículo. As atoardas do Sr. Monteiro já nem sequer me inspiram a mais leve piada em torno das mesmas. Fica a pergunta: Manel, pá, para quando um CD?
* As montanhas darão à luz um ratinho ridículo (HORACIO)
PRESTEM ATENÇÃO: EU SÓ DIREI ISTO UMA VEZ
Coloquem nos vossos 'favoritos' o seguinte blogue: Diários de Lisboa. Depois, atentem nos 'posts' de um tal de Vodka7. Vão por mim. Vale a pena.
Bem-vindo V7!
Coloquem nos vossos 'favoritos' o seguinte blogue: Diários de Lisboa. Depois, atentem nos 'posts' de um tal de Vodka7. Vão por mim. Vale a pena.
Bem-vindo V7!
AINDA O JPC
Como não há duas sem três, chamo a atenção do auditório para o excelente e conciso artigo de João Pereira Coutinho, na última edição da revista Nova Cidadania, intitulado “A Herança de Burke”. Leiam. Está lá tudo.
Como não há duas sem três, chamo a atenção do auditório para o excelente e conciso artigo de João Pereira Coutinho, na última edição da revista Nova Cidadania, intitulado “A Herança de Burke”. Leiam. Está lá tudo.
QUEM TEM MEDO DE BERLUSCONI?
Na mesma edição do Indy, João Pereira Coutinho (JPC) fala-nos, ainda, de Berlusconi. JPC parece criticar a forma como se «defende» o Sr. Berlusconi com base no básico argumento do democrata típico: o homem foi eleito democraticamente, logo respeitinho e bola baixa.
Há dias afirmei o seguinte: "Mas ele é, se bem se lembram, o Primeiro Ministro de um país membro de pleno direito da União Europeia. Foi eleito democraticamente, com os votos de milhões de cidadãos italianos. É inaceitável que tivesse sido sujeito àquela pressão e a todo o tipo de insultos por parte de certos deputados do PE." Pressão e insultos esses, é bom recordar, anteriores ao mimo dirigido ao Sr. Shultz.
Mantenho o que disse, precisamente, pela simples razão de não querer confundir as coisas. A democracia – o pior sistema inventado à excepção de todos os outros – toma muitas formas (já o livro IV da ‘Política’ do Aristóteles explicava isso) e vale o que vale, dependendo de muitas outras envolventes. Como o próprio JPC refere, líderes eleitos democraticamente não faltam no mundo e, no passado, alguns dos mais brutais líderes chegaram ao poder por via do sufrágio universal (Hitler, remember?). Por si só, a democracia não assegura nada. O Iraque, por exemplo, não irá a lado nenhuma com a simples instauração de um regime democrático. Porque a grande diferença, que permite retirar da democracia as suas óbvias vantagens, dá pelo nome de ‘Primado da Lei’ e de ‘Estado de Direito’. Sem um corpo legal constituído e reconhecido, sem instituições, regras, autoridade e, sobretudo, sem uma cultura e uma tradição liberal de separação de poderes, não há democracia que resista a subversões.
Ora, que eu saiba, Berlusconi não é o primeiro-ministro do Burundi ou do Butão. É o primeiro-ministro de Itália onde um pleno e satisfatório Estado de Direito está instituído. Um Estado de Direito que já deu provas que baste da sua existência ‘palpável’, passo o pleonasmo. Defender o dever de respeitar o primeiro-ministro de um país democrático e civilizado, não é defender o cidadão e empresário Berlusconi. Dou de barato que o homem tem ares de mafioso. Eu próprio não gosta da figura e o tipo de histórias que o rodeiam não me inspiram confiança. Mas agrada-me não confundir as coisas. A qualquer altura, caso se prove a malignidade ou a ‘crooked nature’ do Sr. Berlusconi, poderei afirmar que mantenho a confiança no Estado italiano. Entendamo-nos: na democracia italiana, a alegada mafiosidade de Berlusconi não irá muito longe. Até lá, que haja um mínimo de respeito pelo homem, no desempenho das suas funções de chefe de Estado. Isto, é claro, se ele não insistir no tipo de afirmações recentemente ensaiadas...
Na mesma edição do Indy, João Pereira Coutinho (JPC) fala-nos, ainda, de Berlusconi. JPC parece criticar a forma como se «defende» o Sr. Berlusconi com base no básico argumento do democrata típico: o homem foi eleito democraticamente, logo respeitinho e bola baixa.
Há dias afirmei o seguinte: "Mas ele é, se bem se lembram, o Primeiro Ministro de um país membro de pleno direito da União Europeia. Foi eleito democraticamente, com os votos de milhões de cidadãos italianos. É inaceitável que tivesse sido sujeito àquela pressão e a todo o tipo de insultos por parte de certos deputados do PE." Pressão e insultos esses, é bom recordar, anteriores ao mimo dirigido ao Sr. Shultz.
Mantenho o que disse, precisamente, pela simples razão de não querer confundir as coisas. A democracia – o pior sistema inventado à excepção de todos os outros – toma muitas formas (já o livro IV da ‘Política’ do Aristóteles explicava isso) e vale o que vale, dependendo de muitas outras envolventes. Como o próprio JPC refere, líderes eleitos democraticamente não faltam no mundo e, no passado, alguns dos mais brutais líderes chegaram ao poder por via do sufrágio universal (Hitler, remember?). Por si só, a democracia não assegura nada. O Iraque, por exemplo, não irá a lado nenhuma com a simples instauração de um regime democrático. Porque a grande diferença, que permite retirar da democracia as suas óbvias vantagens, dá pelo nome de ‘Primado da Lei’ e de ‘Estado de Direito’. Sem um corpo legal constituído e reconhecido, sem instituições, regras, autoridade e, sobretudo, sem uma cultura e uma tradição liberal de separação de poderes, não há democracia que resista a subversões.
Ora, que eu saiba, Berlusconi não é o primeiro-ministro do Burundi ou do Butão. É o primeiro-ministro de Itália onde um pleno e satisfatório Estado de Direito está instituído. Um Estado de Direito que já deu provas que baste da sua existência ‘palpável’, passo o pleonasmo. Defender o dever de respeitar o primeiro-ministro de um país democrático e civilizado, não é defender o cidadão e empresário Berlusconi. Dou de barato que o homem tem ares de mafioso. Eu próprio não gosta da figura e o tipo de histórias que o rodeiam não me inspiram confiança. Mas agrada-me não confundir as coisas. A qualquer altura, caso se prove a malignidade ou a ‘crooked nature’ do Sr. Berlusconi, poderei afirmar que mantenho a confiança no Estado italiano. Entendamo-nos: na democracia italiana, a alegada mafiosidade de Berlusconi não irá muito longe. Até lá, que haja um mínimo de respeito pelo homem, no desempenho das suas funções de chefe de Estado. Isto, é claro, se ele não insistir no tipo de afirmações recentemente ensaiadas...
KAGAN E HOBBES
O meu amigo João Pereira Coutinho alertou, nas páginas da última edição do Indy, para a ignorância larvar que percorre muitos dos livros que ousam estabelecer paralelos entre a praxis política corrente e a filosofia política, dos filósofos clássicos aos modernos. Sobretudo quando as mesmas são percorridas por formas encapotadas de anacronismo. De facto, tomando como correcta a interpretação do livro “O Paraíso e o Poder” por parte do João, Robert Kagan parece não ter percebido o pensamento de Thomas Hobbes. Aliás, há inúmeros intelectuais e «opinion makers» que continuam a ver em Hobbes uma espécie de proto-belicista, inspirador das mais músculadas e brutais teses de intervenção do poder do Estado, quer interna quer externamente, em total dissonância com as teses Kantianas (mormente a Paz Perpétua).
Hobbes sempre defendeu a autoridade do Estado, mas nunca de forma gratuita. Defendeu-a na perspectiva da defesa do «rule of law» e dos preceitos fundamentais para a vida em sociedade, de forma a colmatar os defeitos da natureza humana em pleno estado natural. Hobbes não foi pela guerra nem pelo conflito, mas sim pela ordem e pela paz. Disso mesmo nos dá conta a sua teoria de Contrato Social.
Hobbes sempre negou que o homem fosse naturalmente social e político. O estado natural é um potencial estado de guerra na medida em que faltam produzir nas consciências individual e colectiva as noções de bem e de mal, certo ou errado, justo ou injusto. Faltam os preceitos e as referências legais, os legisladores e um poder comum capaz de fazer aplicar a lei. Dizer isto não é defender a guerra. Acrescente-se ainda o facto de, segundo Hobbes, “the general inclination of all mankind [is] a perpetual and restless desire of power after power”. Tudo isto associado à preocupação de auto-preservação do homem, encabeçada pela mais perniciosa mas influente das paixões: o medo. Em suma, Hobbes considerava, para a época, que o «rule of law» e as respectivas instituições de poder seriam essenciais para restringir o livre arbítrio, para estabelecer a ordem e para perspectivar a paz. Agora, parem lá com os paralelos, s. f. f.
O meu amigo João Pereira Coutinho alertou, nas páginas da última edição do Indy, para a ignorância larvar que percorre muitos dos livros que ousam estabelecer paralelos entre a praxis política corrente e a filosofia política, dos filósofos clássicos aos modernos. Sobretudo quando as mesmas são percorridas por formas encapotadas de anacronismo. De facto, tomando como correcta a interpretação do livro “O Paraíso e o Poder” por parte do João, Robert Kagan parece não ter percebido o pensamento de Thomas Hobbes. Aliás, há inúmeros intelectuais e «opinion makers» que continuam a ver em Hobbes uma espécie de proto-belicista, inspirador das mais músculadas e brutais teses de intervenção do poder do Estado, quer interna quer externamente, em total dissonância com as teses Kantianas (mormente a Paz Perpétua).
Hobbes sempre defendeu a autoridade do Estado, mas nunca de forma gratuita. Defendeu-a na perspectiva da defesa do «rule of law» e dos preceitos fundamentais para a vida em sociedade, de forma a colmatar os defeitos da natureza humana em pleno estado natural. Hobbes não foi pela guerra nem pelo conflito, mas sim pela ordem e pela paz. Disso mesmo nos dá conta a sua teoria de Contrato Social.
Hobbes sempre negou que o homem fosse naturalmente social e político. O estado natural é um potencial estado de guerra na medida em que faltam produzir nas consciências individual e colectiva as noções de bem e de mal, certo ou errado, justo ou injusto. Faltam os preceitos e as referências legais, os legisladores e um poder comum capaz de fazer aplicar a lei. Dizer isto não é defender a guerra. Acrescente-se ainda o facto de, segundo Hobbes, “the general inclination of all mankind [is] a perpetual and restless desire of power after power”. Tudo isto associado à preocupação de auto-preservação do homem, encabeçada pela mais perniciosa mas influente das paixões: o medo. Em suma, Hobbes considerava, para a época, que o «rule of law» e as respectivas instituições de poder seriam essenciais para restringir o livre arbítrio, para estabelecer a ordem e para perspectivar a paz. Agora, parem lá com os paralelos, s. f. f.
TUDO CONFIRMADO
A minha namorada lançou o repto: “se queres criticar tens de lá ir”. Ao Évora Moda 2003, entenda-se. Ok. Vou ao Évora Moda 2003. E, Sábado (day 2), fui ao Évora Moda 2003. E, passadas duas horas de Évora Moda 2003 – onde, à excepção do Tenente, da Anabela Baldaque e de um tal Paulo Azenha, assisti a um desfile de trapos pindéricos, ouvi a Alexandra cantar Amália em três momentos distintos, e assisti, incrédulo e, sobretudo, incomodado, à ovação magnânima a Carlos Castro – passadas duas horas, dizia, de Évora Moda, confirmei o que já aqui tinha escrito sobre o assunto. E pensar que foram gastos 75.000 euros na organização do evento...
PS: by the way, é o conteúdo dos trapos o verdadeiro catalisador do putativo fascínio da moda. O resto são trapos.
A minha namorada lançou o repto: “se queres criticar tens de lá ir”. Ao Évora Moda 2003, entenda-se. Ok. Vou ao Évora Moda 2003. E, Sábado (day 2), fui ao Évora Moda 2003. E, passadas duas horas de Évora Moda 2003 – onde, à excepção do Tenente, da Anabela Baldaque e de um tal Paulo Azenha, assisti a um desfile de trapos pindéricos, ouvi a Alexandra cantar Amália em três momentos distintos, e assisti, incrédulo e, sobretudo, incomodado, à ovação magnânima a Carlos Castro – passadas duas horas, dizia, de Évora Moda, confirmei o que já aqui tinha escrito sobre o assunto. E pensar que foram gastos 75.000 euros na organização do evento...
PS: by the way, é o conteúdo dos trapos o verdadeiro catalisador do putativo fascínio da moda. O resto são trapos.
MR. AVIZ
Estive a escassos minutos/metros de conhecer pessoalmente o Francisco José Viegas – alma mater do absolutamente obrigatório Aviz.
Tudo começou com o telefonema da minha amiga Anabela (co-proprietária, com o Luis, da livraria Som das Letras, em Évora) ao fim da tarde de sexta-feira.
- Sabes quem está aqui comigo?
- Não.
- O Aviz.
- O Aviz? Mas quem é o Aviz?
- O Francisco José Viegas?
- “O” Aviz? A sério?! Onde?
- No Alçude. Veio aqui falar sobre Lusofonia.
- Lusofonia... hmm (bocejo).
- Eu disse-lhe que te conhecia e ele quer conhecer-te.
- Mas isso é fantástico. Assim que puder vou para aí.
Depois de um serão estupidamente atribulado, chego ao Alçude por volta das 23 horas. Procurei, nervosamente, a figura do FJV. A Anabela veio ter comigo: “Está a falar. Ele e o Agualusa”.
Aguardei, durante algum tempo, ouvindo a conversa. Embora o assunto me interessasse tanto como Física Quântica, deu para verificar duas coisas: 1) o Francisco é um contador de histórias nato, daqueles que apetece ouvir horas a fio; 2) o Francisco irradia simpatia de qualquer ângulo.
Infelizmente, como disse um dia o Zé Diogo Quintela, valores mais baixos chamavam por mim (era suposto resgatar a minha namorada do Évora Moda quando batesse a meia-noite. Foi o que fiz. Quando lá cheguei, já o carro dela se tinha transformado numa abóbora).
Ainda assim caro Fransciso, foi um prazer. O abraço fica para a próxima.
PS2: sobre Évora, escreverei um dia. O estado a que foi votada a minha cidade, de há décadas a esta parte, obriga-me a ser cauteloso sobre o assunto. Está muito calor e eu, para já, não quero desesperar.
Estive a escassos minutos/metros de conhecer pessoalmente o Francisco José Viegas – alma mater do absolutamente obrigatório Aviz.
Tudo começou com o telefonema da minha amiga Anabela (co-proprietária, com o Luis, da livraria Som das Letras, em Évora) ao fim da tarde de sexta-feira.
- Sabes quem está aqui comigo?
- Não.
- O Aviz.
- O Aviz? Mas quem é o Aviz?
- O Francisco José Viegas?
- “O” Aviz? A sério?! Onde?
- No Alçude. Veio aqui falar sobre Lusofonia.
- Lusofonia... hmm (bocejo).
- Eu disse-lhe que te conhecia e ele quer conhecer-te.
- Mas isso é fantástico. Assim que puder vou para aí.
Depois de um serão estupidamente atribulado, chego ao Alçude por volta das 23 horas. Procurei, nervosamente, a figura do FJV. A Anabela veio ter comigo: “Está a falar. Ele e o Agualusa”.
Aguardei, durante algum tempo, ouvindo a conversa. Embora o assunto me interessasse tanto como Física Quântica, deu para verificar duas coisas: 1) o Francisco é um contador de histórias nato, daqueles que apetece ouvir horas a fio; 2) o Francisco irradia simpatia de qualquer ângulo.
Infelizmente, como disse um dia o Zé Diogo Quintela, valores mais baixos chamavam por mim (era suposto resgatar a minha namorada do Évora Moda quando batesse a meia-noite. Foi o que fiz. Quando lá cheguei, já o carro dela se tinha transformado numa abóbora).
Ainda assim caro Fransciso, foi um prazer. O abraço fica para a próxima.
PS2: sobre Évora, escreverei um dia. O estado a que foi votada a minha cidade, de há décadas a esta parte, obriga-me a ser cauteloso sobre o assunto. Está muito calor e eu, para já, não quero desesperar.
domingo, julho 13, 2003
A RECEITA
4 postas de pescada
Sal e pimenta
Sumo de limão
3 colheres de sopa de manteiga
2 cebolas grandes
2 cenouras
2,5 dl de água
2,5 dl de vinho branco
2 colheres de sobremesa de farinha
100 g de cogumelos
2 gemas de ovo
125 g de natas
Tempere as postas de pescada com sal, pimenta e sumo de limão. Num tacho, aloure as postas de pescada com metade da porção de manteiga, durante 3 minutos de cada lado.
Corte as cebolas e as cenouras em rodelas finíssimas. Dê uma rápida fervura às cenouras e escorra-as. Junte tudo às postas de pescada. Junte ainda a água, o vinho branco, a restante manteiga e polvilhe com a farinha. Tempere com sal e pimenta. Tape o recipiente e deixe cozer sobre lume brando durante 15 minutos. Passado este tempo, junte os cogumelos cortados ao meio e deixe cozer mais 10 minutos, com o recipiente destapado.
Coloque as postas de pescada numa travessa funda.
Junte as gemas e as natas ao molho. Leve a lume brando, agitando o recipiente. Rectifique os temperos. Cubra as postas de pescada com parte do molho. Sirva o restante à parte, numa molheira.
Acompanhe com puré de batata, que pode ser apresentado à parte ou à volta da pescada, passado por uma seringa com o bico largo.
Segundo a mítica Maria de Lourdes Modesto, esta é a receita da PESCADA CHARLOTTE. Com este nome, só pode ser uma delícia.
4 postas de pescada
Sal e pimenta
Sumo de limão
3 colheres de sopa de manteiga
2 cebolas grandes
2 cenouras
2,5 dl de água
2,5 dl de vinho branco
2 colheres de sobremesa de farinha
100 g de cogumelos
2 gemas de ovo
125 g de natas
Tempere as postas de pescada com sal, pimenta e sumo de limão. Num tacho, aloure as postas de pescada com metade da porção de manteiga, durante 3 minutos de cada lado.
Corte as cebolas e as cenouras em rodelas finíssimas. Dê uma rápida fervura às cenouras e escorra-as. Junte tudo às postas de pescada. Junte ainda a água, o vinho branco, a restante manteiga e polvilhe com a farinha. Tempere com sal e pimenta. Tape o recipiente e deixe cozer sobre lume brando durante 15 minutos. Passado este tempo, junte os cogumelos cortados ao meio e deixe cozer mais 10 minutos, com o recipiente destapado.
Coloque as postas de pescada numa travessa funda.
Junte as gemas e as natas ao molho. Leve a lume brando, agitando o recipiente. Rectifique os temperos. Cubra as postas de pescada com parte do molho. Sirva o restante à parte, numa molheira.
Acompanhe com puré de batata, que pode ser apresentado à parte ou à volta da pescada, passado por uma seringa com o bico largo.
Segundo a mítica Maria de Lourdes Modesto, esta é a receita da PESCADA CHARLOTTE. Com este nome, só pode ser uma delícia.
sexta-feira, julho 11, 2003
MERCADO DA CARNE
Observo as capas das revistas do 'corazon', e fico a saber: Sofia Alves separada, inicia relação com fulano tal; Rita Seguro deixa marido e começa a luta pela custódia dos filhos; marido de Alexandra Lencastre sai de casa; Rita Ribeiro divorcia-se do seu centésimo marido. É caso para dizer: touradas da vida real.
Observo as capas das revistas do 'corazon', e fico a saber: Sofia Alves separada, inicia relação com fulano tal; Rita Seguro deixa marido e começa a luta pela custódia dos filhos; marido de Alexandra Lencastre sai de casa; Rita Ribeiro divorcia-se do seu centésimo marido. É caso para dizer: touradas da vida real.
quinta-feira, julho 10, 2003
PAUL JOHNSON
De cada vez que pego num livro de Paul Johnson (e, acreditem, faço-a com uma regularidade quase diária), sinto que sou pequenino. Ignorante. Uma besta. Por segundos, chego mesmo a embrutecer. E, depois, fico embevecido a lê-lo, horas a fio.
A simplicidade e elegância da sua escrita são absolutamente magnéticas. A sua erudição é de tal forma avassaladora que me atrevo a dizer que Johnson é, ele próprio, uma enciclopédia ambulante viva. Acrescente-se, ainda, este facto insofismável: a suprema qualidade literária da História deste historiador/jornalista/jardineiro. Em Johnson a História é, sobretudo, gente. Pessoas, de carne e osso. Contraditórias, falíveis, épicas, medíocres. Por último, Paul Johnson ensina-nos que a História foi, é e continuará a ser atravessada por uma dose de imponderabilidade à qual não podemos virar a cara.
De cada vez que pego num livro de Paul Johnson (e, acreditem, faço-a com uma regularidade quase diária), sinto que sou pequenino. Ignorante. Uma besta. Por segundos, chego mesmo a embrutecer. E, depois, fico embevecido a lê-lo, horas a fio.
A simplicidade e elegância da sua escrita são absolutamente magnéticas. A sua erudição é de tal forma avassaladora que me atrevo a dizer que Johnson é, ele próprio, uma enciclopédia ambulante viva. Acrescente-se, ainda, este facto insofismável: a suprema qualidade literária da História deste historiador/jornalista/jardineiro. Em Johnson a História é, sobretudo, gente. Pessoas, de carne e osso. Contraditórias, falíveis, épicas, medíocres. Por último, Paul Johnson ensina-nos que a História foi, é e continuará a ser atravessada por uma dose de imponderabilidade à qual não podemos virar a cara.
MODA
Este fim-de-semana realiza-se, em Évora, mais uma edição do “Évora Moda”, com a presença do Sr. Carlos Castro e sus muchachas, onde pontua a inenarrável Wanda Stuart (Meu Deus: como eu adoraria ver o Kevin Klein a trucidá-la!). A organização – a cargo da Câmara Municipal de Évora e da Delegação do Alentejo das Mulheres Empresárias - anuncia, num misto de orgulho e emoção, a presença de “criadores consagrados”. Vai haver um espectáculo subordinado ao tema “O Romantismo de Moda”. Vão ser cortadas artérias no centro histórico de Évora. E por aí fora. Confesso que fico um pouco intrigado com o mundo da moda e custa-me entender o histerismo em torno deste tipo de «organizações». A importância atribuída à moda chegou ao ponto de se lhe atribuir uma dimensão e um estatuto paralelo a um qualquer evento cultural. Políticos há que incluem no seu role de ‘achievments’ eventos desta natureza. Em Évora, por exemplo, o facto é visto por políticos e por gente próxima do executivo camarário como um sinal de “mudança”, “dinamização” e “desenvolvimento”. Escrevi que não percebia o fenómeno? Mentira. Entendo-o na perfeição. Os tempos, e o estado actual da denominada cultura popular, estão de feição para o ‘mundo da moda’. É o velho paradigma do Wharol aliado a um hiper-hedonismo e à consagração da vaidade humana. No fundo, o mundo da moda, e a adesão popular ao mesmo, é mais uma das faces visíveis da decadência do pós-pós-pós-modernismo, na aurora de um novo milénio - marcado pelo transitório, pelo acessório e pelo fogo fátuo das lantejoulas.
Este fim-de-semana realiza-se, em Évora, mais uma edição do “Évora Moda”, com a presença do Sr. Carlos Castro e sus muchachas, onde pontua a inenarrável Wanda Stuart (Meu Deus: como eu adoraria ver o Kevin Klein a trucidá-la!). A organização – a cargo da Câmara Municipal de Évora e da Delegação do Alentejo das Mulheres Empresárias - anuncia, num misto de orgulho e emoção, a presença de “criadores consagrados”. Vai haver um espectáculo subordinado ao tema “O Romantismo de Moda”. Vão ser cortadas artérias no centro histórico de Évora. E por aí fora. Confesso que fico um pouco intrigado com o mundo da moda e custa-me entender o histerismo em torno deste tipo de «organizações». A importância atribuída à moda chegou ao ponto de se lhe atribuir uma dimensão e um estatuto paralelo a um qualquer evento cultural. Políticos há que incluem no seu role de ‘achievments’ eventos desta natureza. Em Évora, por exemplo, o facto é visto por políticos e por gente próxima do executivo camarário como um sinal de “mudança”, “dinamização” e “desenvolvimento”. Escrevi que não percebia o fenómeno? Mentira. Entendo-o na perfeição. Os tempos, e o estado actual da denominada cultura popular, estão de feição para o ‘mundo da moda’. É o velho paradigma do Wharol aliado a um hiper-hedonismo e à consagração da vaidade humana. No fundo, o mundo da moda, e a adesão popular ao mesmo, é mais uma das faces visíveis da decadência do pós-pós-pós-modernismo, na aurora de um novo milénio - marcado pelo transitório, pelo acessório e pelo fogo fátuo das lantejoulas.
E AGORA?
Li algures que o acto sexual é benéfico para todo o tipo de cefaleias. Eu sempre desconfiei que o segredo para combater as enxaquecas estava subliminarmente contido na segunda metade do próprio vocábulo. Quanto ao mulherio: “Novas Desculpas Precisam-se”.
Li algures que o acto sexual é benéfico para todo o tipo de cefaleias. Eu sempre desconfiei que o segredo para combater as enxaquecas estava subliminarmente contido na segunda metade do próprio vocábulo. Quanto ao mulherio: “Novas Desculpas Precisam-se”.
O DANDY DO PS
Desde muito cedo ensinaram-me que, na arte de (bem) vestir, se exige descrição, parcimónia e uma boa dose de desinteresse pelo assunto. Tão mau como vestir mal é dar a entender, pela forma como nos vestimos, que nos preocupamos excessivamente com o estilo e o tom dos trapinhos que envergamos. Vem isto a propósito do Eng. José Sócrates e do que foi escrito pelo excelente Pedro Lomba. Tenho um problema com o Eng. Sócrates. Quando observo os seus fatos ‘multi-color’ estupidamente imaculados, sem o mínimo vestígio de um só vinco; o cabelo severamente arranjado; a linguagem gestual monocórdica e, em momentos mais casual, o blaser de cabedal preto com a respectiva gola alta da mesma cor (numa tentativa de fugir ao mainstream e de abraçar um estilo ‘cool’ e ‘avantgarde’), vislumbro sempre produção a mais para o meu gosto. Há no engenheiro um excesso de vaidade e um narcisismo latente que me impõe as maiores reservas. Junte-se a tudo isto uma clara propensão para o dogmatismo ‘nomenklado’, para as declarações definitivas, para a objectividade mais asséptica e para o exercício de um moralismo politicamente parcial, et voilà: não vou à bola com o homem. E tenho pena porque, no PS, ele é bem capaz de ser do melhor que por lá anda.
Desde muito cedo ensinaram-me que, na arte de (bem) vestir, se exige descrição, parcimónia e uma boa dose de desinteresse pelo assunto. Tão mau como vestir mal é dar a entender, pela forma como nos vestimos, que nos preocupamos excessivamente com o estilo e o tom dos trapinhos que envergamos. Vem isto a propósito do Eng. José Sócrates e do que foi escrito pelo excelente Pedro Lomba. Tenho um problema com o Eng. Sócrates. Quando observo os seus fatos ‘multi-color’ estupidamente imaculados, sem o mínimo vestígio de um só vinco; o cabelo severamente arranjado; a linguagem gestual monocórdica e, em momentos mais casual, o blaser de cabedal preto com a respectiva gola alta da mesma cor (numa tentativa de fugir ao mainstream e de abraçar um estilo ‘cool’ e ‘avantgarde’), vislumbro sempre produção a mais para o meu gosto. Há no engenheiro um excesso de vaidade e um narcisismo latente que me impõe as maiores reservas. Junte-se a tudo isto uma clara propensão para o dogmatismo ‘nomenklado’, para as declarações definitivas, para a objectividade mais asséptica e para o exercício de um moralismo politicamente parcial, et voilà: não vou à bola com o homem. E tenho pena porque, no PS, ele é bem capaz de ser do melhor que por lá anda.
segunda-feira, julho 07, 2003
domingo, julho 06, 2003
FRAGMENTS OF A RAINY SEASON
Hannibal Records, 1992
Do Not Go Gentle Into That Good Night
Words: Dylan Thomas
Do not go gentle into that good night,
Old age should burn and rave at close of day;
Rage, rage against the dying of the light.
Though wise men at their end know dark is right,
Because their words had forked no lightning they
Do not go gentle into that good night.
Good men, the last wave by, crying how bright Their frail deeds might have danced in a green bay Rage, rage against the dying of the light.
Wild men who caught and sang the sun in flight,
And learn, too late, they grieved it on its way,
Do not go gentle into that good night.
Grave men, near death, who see with blinding sight
Blind eyes could blaze like meteors and be gay,
Rage, rage against the dying of the light.
And you, my father, there on the sad height,
Curse, bless, me now with your fierce tears, I pray.
Do not go gentle into that good night.
Rage, rage against the dying of the light.
John Cale. Ao vivo. Sublime.
Hannibal Records, 1992
Do Not Go Gentle Into That Good Night
Words: Dylan Thomas
Do not go gentle into that good night,
Old age should burn and rave at close of day;
Rage, rage against the dying of the light.
Though wise men at their end know dark is right,
Because their words had forked no lightning they
Do not go gentle into that good night.
Good men, the last wave by, crying how bright Their frail deeds might have danced in a green bay Rage, rage against the dying of the light.
Wild men who caught and sang the sun in flight,
And learn, too late, they grieved it on its way,
Do not go gentle into that good night.
Grave men, near death, who see with blinding sight
Blind eyes could blaze like meteors and be gay,
Rage, rage against the dying of the light.
And you, my father, there on the sad height,
Curse, bless, me now with your fierce tears, I pray.
Do not go gentle into that good night.
Rage, rage against the dying of the light.
John Cale. Ao vivo. Sublime.
HERBERTO HELDER
“A minha idade é assim – verde, sentada.
Tocando para baixo as raízes da eternidade.
Um grande número de meses sem muitas saídas,
soando
estreitos sinos, mudando em cores mergulhadas.
A minha idade espera, enquanto abre
os seus candeeiros. Idade
de uma voracidade masculina.
Cega.
Parada.
Algumas mãos fixam-se à sua volta.
Idade que ainda canta com a boca
dobrada. As semanas caminham para diante
com um espírito dentro.
Mergulham na sua solidão, e aparecem
batendo contra a luz.
É uma idade com sangue prendendo
as folhas. Terrível. Mexendo no lugar do silêncio.
Idade sem amor bloqueada pelo êxtase
do tempo. Fria.
Com a cor imensa de um símbolo.
Eu trabalho nas luzes antigas, em frente
das ondas da noite. Bato a pedra
dentro do meu coração. Penso, ameaçado pela morte.
E uma raiz séca, canta-se
no calor. É uma idade cor de salsa.
Amarga. Imagino
dentro de mim. Trabalho de encontro à noite.
Procuro uma imagem dura.
Estou sentado, e falo da ironia de onde
uma rosa se levanta pelo ar.
A idade é uma vileza espalhada
no léxico. Em sua densidade quebram-se
os dedos. Está sentada.
Os poentes ciclistas passam sem barulho.
Passam animais de púrpura.
Passam pedregulhos de treva.
É para a frente que as águas escorregam.
Idade que a candura da vida sufoca,
idade agachada, atenta
à sua ciência. Que imita por um lado
as nações celestes. Que imita
por um lado a terra
Quente.
Trabalhando, nua, diante da noite.”
in Teoria Sentada
“A minha idade é assim – verde, sentada.
Tocando para baixo as raízes da eternidade.
Um grande número de meses sem muitas saídas,
soando
estreitos sinos, mudando em cores mergulhadas.
A minha idade espera, enquanto abre
os seus candeeiros. Idade
de uma voracidade masculina.
Cega.
Parada.
Algumas mãos fixam-se à sua volta.
Idade que ainda canta com a boca
dobrada. As semanas caminham para diante
com um espírito dentro.
Mergulham na sua solidão, e aparecem
batendo contra a luz.
É uma idade com sangue prendendo
as folhas. Terrível. Mexendo no lugar do silêncio.
Idade sem amor bloqueada pelo êxtase
do tempo. Fria.
Com a cor imensa de um símbolo.
Eu trabalho nas luzes antigas, em frente
das ondas da noite. Bato a pedra
dentro do meu coração. Penso, ameaçado pela morte.
E uma raiz séca, canta-se
no calor. É uma idade cor de salsa.
Amarga. Imagino
dentro de mim. Trabalho de encontro à noite.
Procuro uma imagem dura.
Estou sentado, e falo da ironia de onde
uma rosa se levanta pelo ar.
A idade é uma vileza espalhada
no léxico. Em sua densidade quebram-se
os dedos. Está sentada.
Os poentes ciclistas passam sem barulho.
Passam animais de púrpura.
Passam pedregulhos de treva.
É para a frente que as águas escorregam.
Idade que a candura da vida sufoca,
idade agachada, atenta
à sua ciência. Que imita por um lado
as nações celestes. Que imita
por um lado a terra
Quente.
Trabalhando, nua, diante da noite.”
in Teoria Sentada
CUIDADO
“Um escritor medíocre deve acautelar-se contra a substituição muito rápida de uma expressão rude e incorrecta por uma correcta. Ao fazê-lo, mata a sua ideia original que, pelo menos, era ainda um rebento vivo. Agora está murcha e já nada vale. Pode, se quiser, atirá-la para o monte do lixo. Ao passo que o pequeno e miserável rebento ainda valia alguma coisa.”
LUDWIG WITTGENSTEIN, 1949.
“Um escritor medíocre deve acautelar-se contra a substituição muito rápida de uma expressão rude e incorrecta por uma correcta. Ao fazê-lo, mata a sua ideia original que, pelo menos, era ainda um rebento vivo. Agora está murcha e já nada vale. Pode, se quiser, atirá-la para o monte do lixo. Ao passo que o pequeno e miserável rebento ainda valia alguma coisa.”
LUDWIG WITTGENSTEIN, 1949.
V. P. V.
Preocupa-me a ausência do Vasco Pulido Valente, no DN. “Por motivos pessoais, Vasco Pulido Valente não escreverá a sua crónica habitual nas próximas semanas”. É o que se lê, há semanas. Temo que seja a puta da saúde (para não falar na puta da idade). Esperemos que não. Volta Vasco. Fazes muita falta.
Preocupa-me a ausência do Vasco Pulido Valente, no DN. “Por motivos pessoais, Vasco Pulido Valente não escreverá a sua crónica habitual nas próximas semanas”. É o que se lê, há semanas. Temo que seja a puta da saúde (para não falar na puta da idade). Esperemos que não. Volta Vasco. Fazes muita falta.
DE PONTA
O Heterodoxias fala-nos da “Filosofia do Norte e Filosofia do Sul”. Nem uma, nem outra. Prefiro a Filosofia de Ponta.
O Heterodoxias fala-nos da “Filosofia do Norte e Filosofia do Sul”. Nem uma, nem outra. Prefiro a Filosofia de Ponta.
TULIUS, ESTÁ DESCANSADO: NADA MAIS MOSTRAREI
O meu amigo Tulius, companheiro pastilhento e eterno exilado em N.Y., achou por bem expor algumas considerações sobre o facto de eu ter colocado a única fotografia digitalizada de que disponho, na blogosfera (uma decisão que foi, sobretudo, para «consumo interno»). Mais: descobriu – ele é espertíssimo – que o meu enquadramento num background de lombadas e lombadas de livros, teve como intenção insinuar que sou um tipo extremamente culto, letrado e sofisticado.
Confesso, Tulius, apanhaste-me. Quem me conhece, sabe perfeitamente que eu não passo de um pedante e de um vaidoso. Ao pé de mim, o Manel Maria Carrilho é um pelintra. Estive, inclusivamente, tentado a aparecer deitado no sofá, totalmente nu, coberto apenas por livros do Wittgenstein, Kant, Berlin, Oakeshott, Strauss, Yeats, Beckett, etc. etc. etc. Mas depois pensei: nãã. Demasiado evidente.
PS: quanto à suposta “declaração de amor” a Manuel Monteiro, ele estava, obviamente, a brincar. Como diria o meu amigo Maradona: fosga-se!
PS2: agradeço à minha filha o facto de ter tido a brilhante ideia de me tirar aquela fotografia. Thanks Sofia!
O meu amigo Tulius, companheiro pastilhento e eterno exilado em N.Y., achou por bem expor algumas considerações sobre o facto de eu ter colocado a única fotografia digitalizada de que disponho, na blogosfera (uma decisão que foi, sobretudo, para «consumo interno»). Mais: descobriu – ele é espertíssimo – que o meu enquadramento num background de lombadas e lombadas de livros, teve como intenção insinuar que sou um tipo extremamente culto, letrado e sofisticado.
Confesso, Tulius, apanhaste-me. Quem me conhece, sabe perfeitamente que eu não passo de um pedante e de um vaidoso. Ao pé de mim, o Manel Maria Carrilho é um pelintra. Estive, inclusivamente, tentado a aparecer deitado no sofá, totalmente nu, coberto apenas por livros do Wittgenstein, Kant, Berlin, Oakeshott, Strauss, Yeats, Beckett, etc. etc. etc. Mas depois pensei: nãã. Demasiado evidente.
PS: quanto à suposta “declaração de amor” a Manuel Monteiro, ele estava, obviamente, a brincar. Como diria o meu amigo Maradona: fosga-se!
PS2: agradeço à minha filha o facto de ter tido a brilhante ideia de me tirar aquela fotografia. Thanks Sofia!
A VERDADEIRA NATUREZA DO HAMAS
Eu pasmo com a relativa e aparente bonomia como se relatam as movimentações do Hamas, por terras do médio-oriente. Tudo parte da mesma premissa: o Hamas é uma organização de carácter social, albergando uma facção mais radical que luta, com as armas de que dispõe, pela independência dos palestinianos, contra a ocupação de um país agressor. Para além de tratar de criancinhas e velhinhos, o Hamas tem, desta forma, tempo ainda para lutar corajosamente pelo seu povo. Coisa perfeitamente justificável e compreensível. Afinal de contas, a face violenta do Hamas é fruto da ocupação Israelita, segundo dizem. Finda esta, o Hamas deporá as granadas e os homens bomba, passando a viver em paz consigo próprio e com o mundo.
Quem pensa assim, quem tenta relatar os acontecimentos à luz desta ideia, das três uma: ou é ignorante, ou sofre de amnésia ou é hipócrita. Sempre que abordo este tema, lembro-me de uma entrevista concedida à CBS por um dos mais destacados lideres do Hamas, em finais de 2001. Afirmava ele que “a maioria da população apoia o Hamas e as suas acções contra Israel”, dando a entender que, ou Arafat já não interessava, ou era conivente com tudo e todos. No final, quando o jornalista lhe perguntou, olhos nos olhos, se as acções do Hamas terminariam no dia em que Israel retirasse totalmente dos territórios ocupados e reconhecesse a existência de uma Estado palestino, a resposta foi simples: “Talvez...”, acompanhada de uma sonora gargalhada. E mais não disse. Não precisa, acrescento eu.
Eu pasmo com a relativa e aparente bonomia como se relatam as movimentações do Hamas, por terras do médio-oriente. Tudo parte da mesma premissa: o Hamas é uma organização de carácter social, albergando uma facção mais radical que luta, com as armas de que dispõe, pela independência dos palestinianos, contra a ocupação de um país agressor. Para além de tratar de criancinhas e velhinhos, o Hamas tem, desta forma, tempo ainda para lutar corajosamente pelo seu povo. Coisa perfeitamente justificável e compreensível. Afinal de contas, a face violenta do Hamas é fruto da ocupação Israelita, segundo dizem. Finda esta, o Hamas deporá as granadas e os homens bomba, passando a viver em paz consigo próprio e com o mundo.
Quem pensa assim, quem tenta relatar os acontecimentos à luz desta ideia, das três uma: ou é ignorante, ou sofre de amnésia ou é hipócrita. Sempre que abordo este tema, lembro-me de uma entrevista concedida à CBS por um dos mais destacados lideres do Hamas, em finais de 2001. Afirmava ele que “a maioria da população apoia o Hamas e as suas acções contra Israel”, dando a entender que, ou Arafat já não interessava, ou era conivente com tudo e todos. No final, quando o jornalista lhe perguntou, olhos nos olhos, se as acções do Hamas terminariam no dia em que Israel retirasse totalmente dos territórios ocupados e reconhecesse a existência de uma Estado palestino, a resposta foi simples: “Talvez...”, acompanhada de uma sonora gargalhada. E mais não disse. Não precisa, acrescento eu.
sábado, julho 05, 2003
CIDADES INVISÍVEIS?
Miguel Sousa Tavares, num ‘post scritpum’ incluído numa excelente crónica sobre Buenos Aires publicada no Público, escreve:
(...) José Lamego aspira a ser um dos administradores escolhidos pelos americanos para governar o Iraque conquistado por George Bush. Como ontem aqui escrevia José Manuel Fernandes, este é um cargo “do interesse do país, pois pode vir a abrir as portas do Iraque a muitas empresas portuguesas”. Preto no branco: assumimos a vontade de partilhar de um direito de saque sobre um país estranho, direito esse fundado na agressão militar dos EUA; assumimos que o principal papel dos administradores civis do Iraque não é o servir os interesses das empresas do seu país de origem; e assumimos que a nossa política externa pode ser ditada pelo interesse das nossas empresas de construção civil ou outras.”
Visão curta, preconceito e má-fé: tudo misturado nesta pequena passagem. É pena. Miguel Sousa Tavares é uma pessoa inteligente, com a qual costumo estar de acordo. Mas, de tempos a tempos, a pena foge-lhe para o mais prosaico maniqueísmo (e, ultimamente, tudo o que envolva os EUA não tem a mínima das hipóteses).
Para Miguel Sousa Tavares, as empresas (lá está o velho preconceito dos ‘interesses’ e do ‘capital’) vão lá sacar o que é delas (o dinheirinho), ponto final, parágrafo. Não vão construir casas, pontes, estradas; não vão criar parceiras com as empresas locais; não vão transferir know-how; não vão dar emprego a milhares de iraquianos; não vão dar formação; não vão, também, correr riscos; nada. O que nos remete para a velha incompreensão por parte de certa gente sobre o que é o capitalismo. O capitalismo é isso mesmo: é receber, ganhar, mas é também dar, pagar, reaplicar a riqueza entreatnto gerada, para benefício do meio. Por detrás da simplista visão do lucro (tu pagas 100 por aquilo que me custou 50), as trocas comerciais entre países são um dos maiores motores de desenvolvimento. E isto é válido principalmente em países que sofrem de um atraso endémico e que se dispõem a abrir as suas portas ao investimento estrangeiro. De nada vale a ladainha dos abusos por parte de certas multinacionais. Histórias como as da Nike (um clássico no que toca a argumentos anti-globalização) devem ser observadas com objectividade e não devem servir para extrapolações. Casos são casos, e há que saber denunciá-los e corrigi-los. Só.
Não vou negar que as empresas não ganhem no Iraque aquilo a que têm direito (são empresas e não instituições de caridade). Mas ver as coisas só por esse prisma é próprio de quem usa e abusa do preconceito para esconder a falta de conhecimento.
Miguel Sousa Tavares, num ‘post scritpum’ incluído numa excelente crónica sobre Buenos Aires publicada no Público, escreve:
(...) José Lamego aspira a ser um dos administradores escolhidos pelos americanos para governar o Iraque conquistado por George Bush. Como ontem aqui escrevia José Manuel Fernandes, este é um cargo “do interesse do país, pois pode vir a abrir as portas do Iraque a muitas empresas portuguesas”. Preto no branco: assumimos a vontade de partilhar de um direito de saque sobre um país estranho, direito esse fundado na agressão militar dos EUA; assumimos que o principal papel dos administradores civis do Iraque não é o servir os interesses das empresas do seu país de origem; e assumimos que a nossa política externa pode ser ditada pelo interesse das nossas empresas de construção civil ou outras.”
Visão curta, preconceito e má-fé: tudo misturado nesta pequena passagem. É pena. Miguel Sousa Tavares é uma pessoa inteligente, com a qual costumo estar de acordo. Mas, de tempos a tempos, a pena foge-lhe para o mais prosaico maniqueísmo (e, ultimamente, tudo o que envolva os EUA não tem a mínima das hipóteses).
Para Miguel Sousa Tavares, as empresas (lá está o velho preconceito dos ‘interesses’ e do ‘capital’) vão lá sacar o que é delas (o dinheirinho), ponto final, parágrafo. Não vão construir casas, pontes, estradas; não vão criar parceiras com as empresas locais; não vão transferir know-how; não vão dar emprego a milhares de iraquianos; não vão dar formação; não vão, também, correr riscos; nada. O que nos remete para a velha incompreensão por parte de certa gente sobre o que é o capitalismo. O capitalismo é isso mesmo: é receber, ganhar, mas é também dar, pagar, reaplicar a riqueza entreatnto gerada, para benefício do meio. Por detrás da simplista visão do lucro (tu pagas 100 por aquilo que me custou 50), as trocas comerciais entre países são um dos maiores motores de desenvolvimento. E isto é válido principalmente em países que sofrem de um atraso endémico e que se dispõem a abrir as suas portas ao investimento estrangeiro. De nada vale a ladainha dos abusos por parte de certas multinacionais. Histórias como as da Nike (um clássico no que toca a argumentos anti-globalização) devem ser observadas com objectividade e não devem servir para extrapolações. Casos são casos, e há que saber denunciá-los e corrigi-los. Só.
Não vou negar que as empresas não ganhem no Iraque aquilo a que têm direito (são empresas e não instituições de caridade). Mas ver as coisas só por esse prisma é próprio de quem usa e abusa do preconceito para esconder a falta de conhecimento.
HOW OLD
Um amigo meu, de nacionalidade holandesa, telefonou-me há dias para me convidar a assistir a um concerto da sua banda. Perguntei-lhe quem eram os outros elementos (ele era o vocalista), ao que respondeu tratar-se de um «grupo de jovens universitários, com uma média de idades a rondar os 20 anos». De seguida, perguntei-lhe que género de música tocavam. “Mainly rock”, respondeu-me. Quais eram as suas influências? “Led Zepplin, Doors, Deep Purple”. E foi então que pensei: tão novos e já tão velhos.
Um amigo meu, de nacionalidade holandesa, telefonou-me há dias para me convidar a assistir a um concerto da sua banda. Perguntei-lhe quem eram os outros elementos (ele era o vocalista), ao que respondeu tratar-se de um «grupo de jovens universitários, com uma média de idades a rondar os 20 anos». De seguida, perguntei-lhe que género de música tocavam. “Mainly rock”, respondeu-me. Quais eram as suas influências? “Led Zepplin, Doors, Deep Purple”. E foi então que pensei: tão novos e já tão velhos.
PALAVRA DO SENHOR
NEVER GIVE ALL THE HEART
Never give all the heart, for love
Will hardly seem worth thinking of
To passionate women if it seem
Certain, and they never dream
That it fades out from kiss to kiss;
For everything that’s lovely is
But a brief, dreamy, kind delight,
O never give the heart outright,
For they, for all smooth lips can say,
Have given their hearts up to the play.
And who could play it well enough
If dead and dumb and blind with love?
He that made this knows all the cost,
For he gave all his heart and lost.
W. B. Yeats
NEVER GIVE ALL THE HEART
Never give all the heart, for love
Will hardly seem worth thinking of
To passionate women if it seem
Certain, and they never dream
That it fades out from kiss to kiss;
For everything that’s lovely is
But a brief, dreamy, kind delight,
O never give the heart outright,
For they, for all smooth lips can say,
Have given their hearts up to the play.
And who could play it well enough
If dead and dumb and blind with love?
He that made this knows all the cost,
For he gave all his heart and lost.
W. B. Yeats
BERLUSCONI NO PE
O incidente “Berlusconi no PE” serve para provar várias coisas. A primeira, que existe uma esquerda que está longe de exercitar a tolerância e o respeito pelas regras da democracia que habitualmente apregoa. O Sr. Berlusconi pode ser um demagogo e um populista; pode vestir mal, ter cara de mafioso e estar ligado aos ‘grandes interesses’. Mas ele é, se bem se lembram, o Primeiro Ministro de um país membro de pleno direito da União Europeia. Foi eleito democraticamente, com os votos de milhões de cidadãos italianos. É inaceitável que tivesse sido sujeito àquela pressão e a todo o tipo de insultos por parte de certos deputados do PE. A segunda, que a propensão para o moralismo mais bacoco por parte desses mesmos esquerdistas, continua na ordem do dia. A terceira, que existe uma tendência para a cegueira por parte de certos analistas, que só ouviram o ‘insulto’ de Berlusconi a um pobre e inocente deputado chamado Schultz. Nada mais ouviram. Finalmente, a quarta: o Sr. Berlusconi devia ser mais inteligente e comedido para evitar cair, também, no insulto gratuito e deselegante. É assim que, por vezes, se perde a razão.
O incidente “Berlusconi no PE” serve para provar várias coisas. A primeira, que existe uma esquerda que está longe de exercitar a tolerância e o respeito pelas regras da democracia que habitualmente apregoa. O Sr. Berlusconi pode ser um demagogo e um populista; pode vestir mal, ter cara de mafioso e estar ligado aos ‘grandes interesses’. Mas ele é, se bem se lembram, o Primeiro Ministro de um país membro de pleno direito da União Europeia. Foi eleito democraticamente, com os votos de milhões de cidadãos italianos. É inaceitável que tivesse sido sujeito àquela pressão e a todo o tipo de insultos por parte de certos deputados do PE. A segunda, que a propensão para o moralismo mais bacoco por parte desses mesmos esquerdistas, continua na ordem do dia. A terceira, que existe uma tendência para a cegueira por parte de certos analistas, que só ouviram o ‘insulto’ de Berlusconi a um pobre e inocente deputado chamado Schultz. Nada mais ouviram. Finalmente, a quarta: o Sr. Berlusconi devia ser mais inteligente e comedido para evitar cair, também, no insulto gratuito e deselegante. É assim que, por vezes, se perde a razão.
sexta-feira, julho 04, 2003
LIVROS, PARA QUE VOS QUERO
Na mais recente edição da revista Literary Review, Paul Johnson fala-nos sobre as diferentes abordagens do homem e da mulher em relação aos livros. Admitindo que os homens e as mulheres lêem e escrevem livros de forma mais ou menos idêntica, Johnson parece encontrar as grandes diferenças a outro nível: na forma como se compram, tratam, arrumam, armazenam e classificam os livros. Segundo Johnson, a atitude do homem em relação aos mesmos é, acima de tudo, emocional, sentimental, possessiva, romântica. Para o ‘macho’ bibliófilo, os livros são colonizadores que estabelecem inicialmente uma ponte para, com o tempo, avançarem com a ocupação do espaço. Ocupação esta a que os homens assistem de sorriso nos lábios. As mulheres são, pelo contrário, bem mais práticas. Para estas, os livros são para se usar. Quando essa função cessa, passam irremediavelmente à prosaica categoria de receptáculos de pó. Há, por isso, que os colocar a salvo da luz, da humidade, do pó e, melhor ainda, da vista – não se vá dar o caso de se voltarem a desarrumar.
Anthony Powell, por exemplo, na sua declarada paixão pelos livros, achava que os mesmos serviam também de mobília ou de objecto de decoração. Paul Johnson cita, ainda, o caso de Gladstone para evidenciar como a relação quase obsessiva com os livros, conduz inclusivamente a certos rituais e a certas «especializações». O estadista inglês era um exímio leitor e coleccionador de livros (mais de 20.000 volumes referidos ao longo dos seus diários), com um olho de tal forma experiente para a sua estética e física que lhe permitia calcular, através de um olhar fugaz, quantos livros caberiam em determinado espaço. Chegava, olhava e o veredicto era quase imediato: “nesta sala poderá arrumar cerca de 2.320 livros.”
No particular e modesto caso deste vosso bloguista, a situação é, em todo, similar. Não na parte que toca a cálculos - nem sequer tenho a noção exacta de quantos livros possuo (a última vez o número atirava-se para os novecentos e tal...) - mas no que respeita ao tratamento e acondicionamento dos mesmos. Sem mostrar a mais leve resistência, deixei que os livros tomassem literalmente de assalto a minha casa. É vê-los, por todo o lado: no quarto (chão e móveis), na cozinha, na sala (chão e móveis), na casa-de-banho (!). Quanto à posição feminina, o habitual: estou invariavelmente a levar nas orelhas (não que as tenha grandes, como as do MEC, mas para lá caminham com os puxões).
Pois eu digo: saquem-me a televisão, o DVD, o amplificador, o gira-discos, o leitor e respectivos CD’s; tirem-me os quadros, o aparador, a mesa, os cortinados, os bibelots, as bugigangas, os tapetes; penhorem-me a cadeira Corbusier, o espremedor de citrinos estupidamente estilizado, os candeeiros Artemide, etc. etc. Desde que não levem os meus livros e o meu velho e bom sofá, tudo bem. E, já agora, a cama também não. Um gajo tem de dormir umas horas, de quando em vez.
Na mais recente edição da revista Literary Review, Paul Johnson fala-nos sobre as diferentes abordagens do homem e da mulher em relação aos livros. Admitindo que os homens e as mulheres lêem e escrevem livros de forma mais ou menos idêntica, Johnson parece encontrar as grandes diferenças a outro nível: na forma como se compram, tratam, arrumam, armazenam e classificam os livros. Segundo Johnson, a atitude do homem em relação aos mesmos é, acima de tudo, emocional, sentimental, possessiva, romântica. Para o ‘macho’ bibliófilo, os livros são colonizadores que estabelecem inicialmente uma ponte para, com o tempo, avançarem com a ocupação do espaço. Ocupação esta a que os homens assistem de sorriso nos lábios. As mulheres são, pelo contrário, bem mais práticas. Para estas, os livros são para se usar. Quando essa função cessa, passam irremediavelmente à prosaica categoria de receptáculos de pó. Há, por isso, que os colocar a salvo da luz, da humidade, do pó e, melhor ainda, da vista – não se vá dar o caso de se voltarem a desarrumar.
Anthony Powell, por exemplo, na sua declarada paixão pelos livros, achava que os mesmos serviam também de mobília ou de objecto de decoração. Paul Johnson cita, ainda, o caso de Gladstone para evidenciar como a relação quase obsessiva com os livros, conduz inclusivamente a certos rituais e a certas «especializações». O estadista inglês era um exímio leitor e coleccionador de livros (mais de 20.000 volumes referidos ao longo dos seus diários), com um olho de tal forma experiente para a sua estética e física que lhe permitia calcular, através de um olhar fugaz, quantos livros caberiam em determinado espaço. Chegava, olhava e o veredicto era quase imediato: “nesta sala poderá arrumar cerca de 2.320 livros.”
No particular e modesto caso deste vosso bloguista, a situação é, em todo, similar. Não na parte que toca a cálculos - nem sequer tenho a noção exacta de quantos livros possuo (a última vez o número atirava-se para os novecentos e tal...) - mas no que respeita ao tratamento e acondicionamento dos mesmos. Sem mostrar a mais leve resistência, deixei que os livros tomassem literalmente de assalto a minha casa. É vê-los, por todo o lado: no quarto (chão e móveis), na cozinha, na sala (chão e móveis), na casa-de-banho (!). Quanto à posição feminina, o habitual: estou invariavelmente a levar nas orelhas (não que as tenha grandes, como as do MEC, mas para lá caminham com os puxões).
Pois eu digo: saquem-me a televisão, o DVD, o amplificador, o gira-discos, o leitor e respectivos CD’s; tirem-me os quadros, o aparador, a mesa, os cortinados, os bibelots, as bugigangas, os tapetes; penhorem-me a cadeira Corbusier, o espremedor de citrinos estupidamente estilizado, os candeeiros Artemide, etc. etc. Desde que não levem os meus livros e o meu velho e bom sofá, tudo bem. E, já agora, a cama também não. Um gajo tem de dormir umas horas, de quando em vez.
AINDA O 160º ANIVERSÁRIO DA “THE ECONOMIST”
“The truth about market liberalisation and economic growth is not that it increases inequality, nor that it hurts the poor: just the opposite. Rather, the truth is that some large parts of the poor world are pulling themselves out of poverty while others are not. Those poorer parts include some countries in Asia, inclunding Pakistan and Central Asia, and some in Latin America as well as most of the Middle East, where liberalisation has scarcely been attempted and revenues from oil have lately declined. Most notably, though, they include, more or less, a whole continent, namely Africa. There, incomes have stagnated or even declined, and life expectations are falling too, thanks to AIDS and other plagues. Home to 13% of the world’s population, the continent accounts for merely 3% of world GDP. The lack of progress in Africa, not the supposed evils of globalisation, is where the most difficult problem of economic development lies.”
Há anos que a revista The Economist vem tentado provar e demonstrar, até à exaustão, aquilo que está resumido nesta breve passagem. Através de estudos sérios, criteriosamente formulados e levados a cabo por gente competente, com base em dados concretos e levando em linha de conta as mais diversas variáveis e as dificuldades inerentes às mais complexas aferições, a broader picture está aí, para quem a quiser ver: o mundo caminha, de há pelo menos cinquenta anos a esta parte, para uma maior equidade na distribuição do rendimento e da riqueza; para formas de crescimento integrado entre países de diferentes dimensões económicas que abraçaram o modelo liberal associado à democracia; para a diminuição percentual do número de pessoas a viver abaixo do limiar da pobreza; para um aumento significativo da chamada classe média, aplicada a cada realidade. E o que nos dizem os anti-capitalistas, os movimentos anti-globalização, o Sr. Saramgo, o Sr. Sousa Santos e o Sr. Prado Coelho? Que caminhamos para o fosso. Para o doomsday. Para o inferno.
Bem que podiam dizer: “o Inferno somos nós”. A que eu acrescentaria: e todos aqueles que, como eles, são incapazes de descer à terra, recolher a soberba e parar para perceber que existe um mundo diferente do imaginado. Um mundo real, palpável, bem mais complexo e difuso. Um mundo que importa conhecer e aperfeiçoar, desassombradamente, sem a demagogia dos ideais inexequíveis (vazios porque sem qualquer sentido e aplicação prática).
Hoje em dia já deveria ser perfeitamente claro para todos - à esquerda, à direita, em cima ou em baixo - que mudanças drásticas não existem e que quaisquer tentativas nesse sentido produzem efeitos colaterais nefastos. Perceber isso não é defender “mais do mesmo”, nem admitir que o actual estado civilizacional é imutável. É perceber que este caminho poderá ser, e tudo indica que sim, o único possível. É perceber que existem instrumentos e políticas cujo efeito tem sido benéfico, no médio e longo prazo. E é perceber que o que temos de fazer é aperfeiçoar cuidadosamente o modelo actual de desenvolvimento. Incentivá-lo, acarinhá-o, compreendê-lo. Nunca amordaçá-lo, invertê-lo, subvertê-lo. Em termos macroeconómicos, a globalização económica, aliada ao liberalismo e à democracia, resulta. Não perceber isto é não perceber nada.
“The truth about market liberalisation and economic growth is not that it increases inequality, nor that it hurts the poor: just the opposite. Rather, the truth is that some large parts of the poor world are pulling themselves out of poverty while others are not. Those poorer parts include some countries in Asia, inclunding Pakistan and Central Asia, and some in Latin America as well as most of the Middle East, where liberalisation has scarcely been attempted and revenues from oil have lately declined. Most notably, though, they include, more or less, a whole continent, namely Africa. There, incomes have stagnated or even declined, and life expectations are falling too, thanks to AIDS and other plagues. Home to 13% of the world’s population, the continent accounts for merely 3% of world GDP. The lack of progress in Africa, not the supposed evils of globalisation, is where the most difficult problem of economic development lies.”
Há anos que a revista The Economist vem tentado provar e demonstrar, até à exaustão, aquilo que está resumido nesta breve passagem. Através de estudos sérios, criteriosamente formulados e levados a cabo por gente competente, com base em dados concretos e levando em linha de conta as mais diversas variáveis e as dificuldades inerentes às mais complexas aferições, a broader picture está aí, para quem a quiser ver: o mundo caminha, de há pelo menos cinquenta anos a esta parte, para uma maior equidade na distribuição do rendimento e da riqueza; para formas de crescimento integrado entre países de diferentes dimensões económicas que abraçaram o modelo liberal associado à democracia; para a diminuição percentual do número de pessoas a viver abaixo do limiar da pobreza; para um aumento significativo da chamada classe média, aplicada a cada realidade. E o que nos dizem os anti-capitalistas, os movimentos anti-globalização, o Sr. Saramgo, o Sr. Sousa Santos e o Sr. Prado Coelho? Que caminhamos para o fosso. Para o doomsday. Para o inferno.
Bem que podiam dizer: “o Inferno somos nós”. A que eu acrescentaria: e todos aqueles que, como eles, são incapazes de descer à terra, recolher a soberba e parar para perceber que existe um mundo diferente do imaginado. Um mundo real, palpável, bem mais complexo e difuso. Um mundo que importa conhecer e aperfeiçoar, desassombradamente, sem a demagogia dos ideais inexequíveis (vazios porque sem qualquer sentido e aplicação prática).
Hoje em dia já deveria ser perfeitamente claro para todos - à esquerda, à direita, em cima ou em baixo - que mudanças drásticas não existem e que quaisquer tentativas nesse sentido produzem efeitos colaterais nefastos. Perceber isso não é defender “mais do mesmo”, nem admitir que o actual estado civilizacional é imutável. É perceber que este caminho poderá ser, e tudo indica que sim, o único possível. É perceber que existem instrumentos e políticas cujo efeito tem sido benéfico, no médio e longo prazo. E é perceber que o que temos de fazer é aperfeiçoar cuidadosamente o modelo actual de desenvolvimento. Incentivá-lo, acarinhá-o, compreendê-lo. Nunca amordaçá-lo, invertê-lo, subvertê-lo. Em termos macroeconómicos, a globalização económica, aliada ao liberalismo e à democracia, resulta. Não perceber isto é não perceber nada.
IMPERDÍVEL
A edição comemorativa do aniversário da revista The Economist está simplesmente divinal. A guardar religiosamente. Aconselha-se a fotocopiá-la e a distribuir pelos anti-capitalistas que nos sejam mais próximos. Fazer crer que é sempre bonito aprender alguma coisa. Como diz o povo, mais vale tarde do que nunca.
A edição comemorativa do aniversário da revista The Economist está simplesmente divinal. A guardar religiosamente. Aconselha-se a fotocopiá-la e a distribuir pelos anti-capitalistas que nos sejam mais próximos. Fazer crer que é sempre bonito aprender alguma coisa. Como diz o povo, mais vale tarde do que nunca.
DAR A CARA
Por uma questão pessoal e de 'accountability', num gesto inédito na blogosfera, dou hoje a cara. É este o tipo que devem socar, pontapear, beijar, abraçar, cumprimentar ou simplesmente ignorar, caso se cruzem com ele na rua. Eis o MacGuffin:
PS: posso ter cara de puto, mas...
Por uma questão pessoal e de 'accountability', num gesto inédito na blogosfera, dou hoje a cara. É este o tipo que devem socar, pontapear, beijar, abraçar, cumprimentar ou simplesmente ignorar, caso se cruzem com ele na rua. Eis o MacGuffin:
PS: posso ter cara de puto, mas...
quarta-feira, julho 02, 2003
A ‘GAFFE’ DO CORREIO DA MANHÃ
Ao contrário do que foi noticiado pelo Correio da Manhã, este blogue não pertence ao jornalista/escritor Miguel Esteves Cardoso. Aliás, bastava uma rápida consulta ao mesmo para rapidamente se constatar que o seu autor (me, myself and I) (ainda) está a milhas da prosa espirituosa, correcta e irresistível do Miguel Esteves Cardoso.
O site do meu amigo M. E. C. é este.
PS: os meus agradecimentos à querida Zazie pela chamada de atenção.
Ao contrário do que foi noticiado pelo Correio da Manhã, este blogue não pertence ao jornalista/escritor Miguel Esteves Cardoso. Aliás, bastava uma rápida consulta ao mesmo para rapidamente se constatar que o seu autor (me, myself and I) (ainda) está a milhas da prosa espirituosa, correcta e irresistível do Miguel Esteves Cardoso.
O site do meu amigo M. E. C. é este.
PS: os meus agradecimentos à querida Zazie pela chamada de atenção.