O MacGuffin: setembro 2011

quinta-feira, setembro 29, 2011

All must have prizes?

Por entre lamentos e indignações (que hoje em dia se banalizam que nem papo-secos) contra a decisão de Nuno Crato de cancelar a atribuição de prémios pecuniários aos melhores alunos (500 euróis por aluno), de que destaco este notável esforço para discordar precedido do anúncio da concordância, fui acometido de um ataque de nostalgia.

Nostalgia de um tempo em que, quando chegava a casa e anunciava uma boa nota, o meu pai dizia “muito bem… mas entende que não fizeste mais que a tua obrigação.” Ensinaram-me, vá se lá saber porquê (as pessoas antigamente eram meio parvas, há que dizê-lo) que ser bom naquilo que fazemos é uma obrigação conducente a um processo de auto-satisfação que, no final e em bom rigor, só a nós nos diz respeito. É uma «luta» interna, que travamos com a nossa capacidade, inteligência e força de vontade. É uma questão que encaixa em conceitos antigos, hoje em dia provavelmente démodés, como o brio, a dignidade e a modéstia.

É verdade que o mundo tem mudado para melhor, ao contrário do que vão dizendo os partidários do Armagedão. Mas em cretinice e idiotice estamos a atingir níveis inéditos. Premiar, numa escola pública, os melhores alunos com um prémio pecuniário, não é só estupidez: é uma forma de instituir uma relação causa-efeito entre competência/mérito e o dinheirinho. E é desta forma que estamos a criar «monstrinhos» cuja principal motivação para serem competentes, aplicados e responsáveis  aos 15 ou 17 anos é a respectiva retribuição monetária sob a forma de «prémio». Há qualquer coisa de muito errado em tudo isto.

PS: a minha mulher está aqui a dizer-me que terminou o secundário com média de 18 valores e que, por isso, lhe devem dinheiro (no mínimo 500€, mais juros e correcção monetária).

quarta-feira, setembro 28, 2011

"I am a talker. I talk a lot. I love the whole idea of public speaking."

A propósito disto, convém ler isto.

sábado, setembro 24, 2011

É pena porque às vezes diz umas coisas acertadas

O Dr. Marinho Pinto tem a seu favor o elemento-técnica que melhor convive com a democracia e, simultaneamente, maiores problemas lhe levanta: o populismo.

Não sendo uma prática estupidamente fácil, não é seguramente difícil. No caso do Dr. Marinho Pinto, a fórmula é, aliás, bastante conhecida: invocar os «ímpios interesses», auto-proclamando-se um intrépido combatente dos mesmos (no caso da actual ministra da Justiça, com acusações de nepotismo à mistura).

Em matéria de justiça, nada mais empolga uma plateia de leigos mais ou menos insatisfeitos com a vida, do que falar na putativa «corja» que dirige os «grandes escritórios de advocacia da capital», ou apontar o dedo à «teia de interesses» dos «poderosos», fazendo das palavras tremendos heroísmos de pulso.

Por entre a pose colérica e a bravata proto-revolucionária que habitualmente caracterizam o chinfrim que o Dr. Marinho Pinto faz questão de levar à cena a cada intervenção pública, disfarçando a sua muito particular e furtiva agendazinha política, o Dr. Marinho Pinto raramente concretiza, raramente faz prova das suas acusações, raramente explica, com factos, o que está a dizer.

Ao não o fazer, o Dr. Marinho Pinto não passa de um populista grotesco com aparentes laivos de arrivista, cuja cacofonia desarticulada já ninguém leva a sério. Como dizia hoje um senhor taxista em Lisboa, enquanto escutávamos a notícia relacionada com as últimas declarações do senhor Bastonário, «este gajo só sabe mandar bocas e dizer mal». Acreditem: os senhores taxistas às vezes dizem coisas acertadas.

Foi você que pediu um maniqueísmo?

Assisto às reacções inusitadas, pré ou pós-desfalecimento, das organizações sindicais às propostas de alteração da lei laboral. O tom é inevitavelmente o mesmo: os patrões não têm escrúpulos; os empregados são gente infinitamente boa e santa. Vai daí, há que elevar ao expoente máximo o princípio que encabeça toda e qualquer legislação laboral: há uma parte fraca (os trabalhadores) e há uma parte forte (o «patronato»). Para os sindicatos, a parte forte está sempre de faca afiada na direcção da parte fraca (provavelmente acharão que é para isso que se abrem empresas: para uns lixarem outros). Não admira, portanto, que, nas palavras de um sindicalista esperto e perspicaz, a proposta seja «execrável».

Dou de barato que a entidade empregadora detém, na relação contratual (ou num jargão mais elaborado, no «âmbito do vinculo laboral»), um ascendente sobre o trabalhador (é, aliás, das primeiras coisas que se aprende em cadeiras de Direito do Trabalho). Quando mais não seja, um (o trabalhador) depende do outro (patrão) para, digamos, viver.

Mas quando alguém da CGTP refere, parafraseio, que com a introdução da possibilidade de despedir um trabalhador com base na (falta de) produtividade, se abre a porta a que um patrão com menos escrúpulos fixe um determinado objectivo que ele sabe à partida inatingível para «lixar» o trabalhador, há qualquer coisa de estupidamente parcial nesta disposição mental.

A pergunta a que os senhores sindicalistas nunca, jamais, responderam – nem provavelmente lhes cabe a eles responder, empenhados que estão em cumprir a defesa inapelável dos fracos – é esta: como pode um patrão defender-se, na actual lei, de um trabalhador, usando agora a mesma terminologia, «pouco escrupuloso»? Dito de outra forma: que mecanismos a actual lei confere à entidade empregadora para que esta possa afastar, sem grandes dramas ou prejuízos (leia-se sem a burlesca teia burocrática e processual), um trabalhador simplesmente incompetente?

A pergunta é desnecessária. Para os sindicatos não há trabalhadores incompetentes ou sem «escrúpulos». Quando um trabalhador não cumpre as suas funções de forma responsável e competente, a culpa é invariavelmente do «patronato», que: a) não organizou e geriu a empresa como lhe competia (a já lendária incapacidade gestora dos patrões portugueses); b) não disponibilizou ao trabalhador os meios adequados à prossecução da função que lhe foi incumbida; c) não o formou ou ensinou; d) ou pura e simplesmente porque se trata de um bando de «blood sucking freaks».

E assim continuamos todos: contentes, valentes, orgulhosos, cada um cumprindo o papel que o Altíssimo lhe atribuiu, nesta ordem cósmica tão bem arrumadinha.

sexta-feira, setembro 23, 2011

Acesso bloqueado

Sérgio Godinho. Pois é: Sérgio. Godinho. Havia olvidado o Sérgio. E havia olvidado a razão porque o artista Sérgio Godinho me causava transtornos de vária ordem (psíquicos, intestinais, etc.). Mas o Sérgio voltou. E, com ele, um disco que contém a musica "Acesso Bloqueado". Obrigado, Sérgio. Já me lembrei.

Chegou a minha estação favorita

quinta-feira, setembro 22, 2011

Ah, a Bélgica

Este artigo do Rui Tavares – um político (e) comentador que tento seguir acalentando sempre a ideia de um dia poder vir a concordar com as suas ideias porque se concordar com as ideias de uma pessoa manifestamente inteligente isso pode fazer de mim uma pessoa igualmente inteligente - encerra uma explicação tão simpática e arrumadinha da realidade que apetece não contrariar. É pena, de facto, mas não há como não o fazer.

Quando Rui Tavares tenta explicar a razão para o facto de a Bélgica escapar, incólume, às desconfianças ou, se quiserem, às diatribes dos «mercados», escrevendo «sem o choque contracionário que tem atacado as nossas economias da austeridade, a economia belga cresce de forma mais saudável, e ajudará a diminuir o défice e a pagar a dívida», espanta-me o lado pueril/ingénuo do seu argumentário. No limite, trata-se de uma técnica argumentativa que encaixa numa longa e notável tradição: a de colocar os factos ao serviço de uma tese particular, ajustando-os de forma milimétrica.

As medidas de austeridade que estão a ser implementadas em países como a Grécia, Portugal e Irlanda (e Itália, mesmo sem a visita da troika), não nasceram do nada. Não foram uma opção estratégica levada a cabo de forma livre pelos respectivos governos. Foram, antes, a consequência de um descalabro continuado, paulatino, sem sinais de reversão, de dívidas soberanas e de défices orçamentais de grandeza não despiciente. Em bom rigor, as medidas de austeridade foram impostas – quer pelos factos, quer pelas instituições que vieram em auxílio desses países (ou ambas) – em países cujo modelo económico, os indicadores macroeconómicos e a dependência face ao exterior, não permitiram convencer os «mercados» da natureza pontual, de origem maioritariamente sistémica (logo mais ou menos transitória), da crise que esses países atravessavam.

Rui Tavares tenta convencer-nos de que a crise dos países «atacados» pelos «mercados» foi consequência das medidas de austeridade – e que, por causa delas, esses países, ao contrário da Bélgica, não cresceram e prosperaram livre e alegremente. Ou seja, Rui Tavares inverte a ordem dos factos.

Sim, é verdade: a Bélgica não é propriamente um exemplo de racionalidade e saneamento financeiro. Mas bastava observar os dados relativos à evolução da dívida pública belga (interna e externa) e uma série de indicadores macroeconómicos (PIB, PIB per capita, taxa de crescimento, produtividade laboral por hora de trabalho, balança comercial, etc.) para perceber as diferenças. A PORDATA é muito útil nestas coisas. Seria fastidioso fazer, aqui, um levantamento desses indicadores. Mas teria sido muito útil a Rui Tavares, esse pequeno trabalhinho de casa. Minutos antes de carregar no botão «publish».

PS: Ora nem mais.

RIP

Os REM - que não faziam um álbum decente desde 1988 (e Green já era o que era...) - acabaram.

Descansem em paz.

Um post à Detective Cantor

Contagem de vezes em que o Henrique Raposo postou a capa do seu (bom) livro “Um Mundo Sem Europeus”, só em 2011 = 17

É só cinismo ou tem outro nome?

Que nome se dá ao transtorno psíquico que leva uma pessoa a sentimentos de repulsa e a reclamar castigo exemplar em relação a outra porque, inconscientemente, vê reflectidos nesta os seus próprios defeitos?

Ao longo de décadas, Alberto João Jardim abraçou o keynesianismo à lá Sócrates: o investimento público como motor eterno e inesgotável da riqueza do povo. E se adiou (ou, se quiserem, escondeu) o registo contabilístico da despesa, nada que o anterior governo não tivesse praticado (“governo adiou despesa pública para melhorar défice”, lembram-se?).

Portanto, meus caros, entendamo-nos: não está em causa a crítica ao comportamento imperdoável e irresponsável de Alberto João Jardim; está em causa a auto-proclamada autoridade moral dos socialistas (ainda por cima pela voz de Carlos Zorrinho, um seguidor canídeo de José Sócrates) para falar destas questões, ou melhor, para falar «assim» destas questões (em registo «lição de moral» e pose «indignada», como se o passado fosse uma galáxia distante e o presente uma ilha no Atlântico).

O que Alberto João Jardim fez na Madeira (gastar sem olhar às consequências, em nome do «bem comum» e do «Estado Social»), não é muito diferente do que José Sócrates fez no continente. Pudor e vergonha na cara é coisa rara, por estes dias, nas hostes socialistas.

domingo, setembro 18, 2011

Perdeu a graça

Qualquer módico de graça que a descontraída, desavergonhada e provocadora, embora não raras vezes boçal e mal-educada, postura de Alberto João Jardim fazia planar sobre a cinzenta, amorfa e patética política portuguesa, acabou de se extinguir. O que se passou nas contas da Madeira não pode deixar ninguém indiferente. O habitual encolher de ombros que tendíamos a fazer perante as diatribes de Alberto João, deixou de servir. Mais ainda no caso dos que tanto se revoltaram contra a forma como o senhor engenheiro geriu os dinheiros públicos e fingiu que o dinheiro seria infinitamente elástico. Dito isto, não deixa de ser pateta e patética a forma como os socráticos reclamam, agora, que se acabe com a contumácia e se apurem responsabilidades. Após sete anos de emudecimento no «contnente». Não se enxergam.

Iniciativa revista SÁBADO: Quer conhecer José Rodrigues dos Santos?

Não.

Vem aí algo de espectacular

Ando por estes dias muito dado à paz entre os povos, as classes e as claques e, nesse sentido, tendo a vislumbrar no aparente idiotismo de certas declarações, algo de bom e promissor para o futuro da pessoa de bem que as profere. Vejamos o caso António José Seguro, esse outrora imberbe e eterno príncipe da política portuguesa, agora empossado rei, perdão, secretário-geral do partido do senhor engenheiro José Sócrates (lembram-se?).

Tenho para mim que a inebriante e pungente indignação de que se reveste o jovem António José para comentar as recentes trafulhices do Sr. Jardim e a suposta «cumplicidade» envergonhada do primeiro-ministro no caso (vamos todos fazer de conta de que o Dr. Passos Coelho sabia do que se passava e, sabendo, a tudo anuiu), é, afinal, uma forma de ensaiar algo de muito parecido em relação aos governantes que, até há três meses e picos, mandavam nesta chafarica.

Antevejo, por isso, e para muito breve, algo de muito singular na vida política portuguesa, e que será devidamente televisionado: o jovem António José, frente a um espelho, olhando-se nos olhos, declarando «retiro-lhe a si, meu caro senhor, e desde já, qualquer tipo de legitimidade política para criticar o actual governo e toda a confiança política para levar a cabo a função de líder do principal partido da oposição, caso V. Exa. não venha a público demarcar-se do anterior primeiro-ministro, por sinal líder do partido de que o senhor é actualmente secretário-geral».

Estou mortinho para ver.


(publicado originalmente aqui)

quarta-feira, setembro 14, 2011

Se não fosse o gajo do fato com gravata

os acontecimentos ter-se-iam revelado trágicos.

terça-feira, setembro 13, 2011

Esta menina está de volta

Pop pop pop

A melhor canção pop de 2011 está encontrada (e arrisco dizê-lo a mais de três meses do fim do ano). Chama-se "Days" e pode ser encontrada neste cêdê:


O que me dizes, Lourenço?


sexta-feira, setembro 02, 2011

Haja esperança

quinta-feira, setembro 01, 2011

Está demorado, o biltre


Da rapina

É um clássico: falta dinheiro para sustentar o Estado-glutão? Há risco de insolvência? A meta orçamental está cada vez mais longe? «Ó Vitor (antes Fernando), sacode aí a ralé». Depois, perante a voz de protesto da ralé – que importa sempre manter quietinha, no seu providencial destino subalterno -, apontam-se baterias ao grupo que, na verdade, as «estava a pedir»: os ricos. Para quem não sabe, os ricos, em Portugal, constituem um bando de ignaros que roubou, explorou, ludibriou e acidentalmente matou com o intuito de promover uma série de patifarias e excentricidades repugnantes: encher a garagem de Bentleys Continental; acrescentar zeros «astronómicos» (à direita) na conta bancária; distribuir pelas amantes apartamentos em zonas chiques mas discretas; viver da especulação; deter terra sem nela lançar uma semente (o Luís Naves pode, depois, explicar isto de forma um pouco mais polida).

Ao contrário dos avaros intelectuais, disponho-me, desde já, a contribuir para esta gloriosa empresa de colecta justiceira, apresentando algumas ideias que só o público-alvo pode considerar indignas:

  • Medida n.º 1: comissão de luxo de 100€ por cada minuto no interior de restaurantes de luxo (tipo Tavares Rico ou Eleven). Receita mínima: 1.500€ (para não pagar mais, o rico terá de comer em apenas 15 minutos). Excepções: Pap’Açorda e Bica do Sapato (por razões óbvias: frequentados na sua maioria por gente do milieu cultural e/ou intelectual português, a viver no limiar da pobreza ou com fortuna de origem respeitável);
  • Medida n.º 2: 50,00€ de imposto por cada pancada em bola de golfe. Justificação: aproveitar o mau jeito do rico (sobretudo o subtipo pato-bravo) que raramente faz melhor que um Triple Bogey;
  • Medida n.º 3: criação de uma brigada profissionalizada (mas não sindicalizada) para fiscalização de sinais exteriores de riqueza. Zonas e áreas especificas de actuação: Avenida de Liberdade; átrios dos hotéis Ritz Four Seasons, Lapa, Le Méridien Penina Golf & Resort e Quinta do Lago; stands dos representantes oficiais das marcas Bentley, Aston Martin, Porsche, Ferrari e Maserati (no caso dos Mercedes e dos BMWs, só para modelos acima da classe E e série 5, respectivamente); clínicas de cirurgia estética e similares;
  • Medida n.º 4: o regresso do justíssimo imposto sucessório, com a particularidade de, no caso de falecimento de um rico, o Estado se equiparar a descendente de primeiro grau.


Não têm que agradecer.

(também publicado aqui)

Aposta simples

Da esquerda à direita, do Altíssimo ao reino de Hades, toda a minha gente grita, sussurra, sonha, acalenta e bebe a solução: «cortar a despesa». Socialistas, trotskistas, comunistas, sociais-democratas, democratas-cristãos, indecisos, mata-mosquitos, vira-casacas e cata-ventos, todos, em uníssono, apontam o caminho: «corte-se na Despesa!» (subentende-se na despesa do Estado). É este o caldo «liberal» onde, hoje em dia, se comprazem os espíritos mesquinhamente práticos dos políticos e intelectuais da paróquia lusa. Fizeram, ao que parece, as contas.Agora, perante o cenário de mais impostos, a solução nunca foi tão unânime: «corte-se na Despesa».
Longe de mim perturbar uma ideia que adquiriu a solenidade severa e salvífica de um dogma. Cortar na despesa? Ó meus amigos: vamos a isso!

Quero, apenas, colocar o pouco dinheiro que me resta numa aposta simples (dispenso a múltipla): no dia em que se anunciar um rol mais ou menos sistematizado e, digamos, transversal, de medidas de «corte na Despesa», a unanimidade mudará de sinal. Nesse dia, eis o que iremos escutar dos mesmíssimos espíritos iluminados:

- Cortar assim, sem critério? Que horror!

- As pessoas não podem ser observadas como números. Que insensibilidade!

- Estas medidas vão conduzir a mais desemprego e recessão!

- O encerramento destes serviços representa um duro golpe no Estado Social!

- A falta de sensibilidade social deste governo é atroz!

- Estas empresas municipais geram emprego e desempenham uma função vital, sem a qual o Estado, por via das autarquias, se demitirá do seu papel social!

Está apostado.

(originalmente publicado aqui)
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