sábado, julho 25, 2009
sexta-feira, julho 24, 2009
Sem emenda
Qualquer capital de erudição e sofisticação que um homem possa ter adquirido ao longo de anos, seja por via da praxis dita «social» ou do aturado estudo filosófico da estética do amor e do belo – sempre sob a égide dos mais proeminentes escritores, filósofos, poetas e bardos que o mundo viu nascer - é patética e fatalmente conspurcado perante o prosaico vislumbramento de uma qualquer «fêmea» com certo(s) e determinado(s) atributo(s). Toda uma colectividade de gestos, tiques e expressões, apreendidas e ensaiadas com especial minúcia por entre páginas de Tchekovs, Greenes, Chandlers & Flauberts, ou visionamentos de Grants, Masons e Bogarts, é pura e simplesmente esquecido e/ou substituído de forma irremediável por dá cá aquela palha. A pose respeitável e grave, a expressão blasé e bogartmente desinteressada, o sorriso vendedor de charme, os gestos meio aristocráticos – tudo cede lugar ao olhar de basbaque, ao sorriso aparvalhado, à boca levemente escancarada, à epilepsia do gesto, à acidental e lúbrica baba. O ponto alto da figura triste é atingido quando, ao travelling da eterna transposição do «objecto» desejado, se segue a meia-volta voyeurista, de volta, lá está, ao «objecto». Quer-se dizer: um gajo bem que pode lutar contra os instintos e pensar para além dos instintos mas, como toda a gente sabe, ainda há muito pouco tempo a malta saiu da caverna.
quinta-feira, julho 23, 2009
Sorte, azar ou Pinóquio?
Quem por estes dias aterre em Portugal e, desconhecendo o território, os usos e costumes dos local peasants, procure alguma informação sobre a evolução política, económica e social do país utilizando um browser, pode ter, por um lado, a sorte de encontrar o SIMplex e, por outro, o azar de encontrar o SIMplex.
Sorte porque, como alienígena simpático e bem intencionado, ficará radiante por saber que chegou a um país na sua fase pós-trevas. Dissecando com alguma atenção (não muita porque aquilo é tão explicito e fundamentado que exige um esforço cognitivo mínimo) os relatos do SIMplex, chegará rapidamente à conclusão que esta paróquia viveu na escuridão até 2005, servida, até então, por um bando de alucinados basbaques alaranjados que nada fizeram pelo povo e tudo complicaram por manifesta incompetência e apego cego a interesses obscuros. Mais uma vez com relativa parcimónia intelectual (outra, aliás, não lhe é exigida), travará conhecimento com uma personagem extraordinária, mítica, dona de uma vontade indómita e de um coração de ouro – o Sr. Eng. José Sócrates, de seu nome -, o qual, durante quatro anos de dedicação sacrossanta e grande espírito de sacrifício, liderou com especial génio, notável zelo mas, acima de tudo, punho delico-forte o batalhão de bravos que resgataram o país do abismo.
Azar porque, como viajante não muito propenso a confusões e avesso a agitações de ordem social, aperceber-se-à de que aquela gente manhosa, acéfala e aparvalhada, cuja presença e acção tinha servido, até 2005, de tampão à luz, prepara agora com afinco, embora de forma meio atrapalhada segundo os cronistas do SIMplex, um regresso despudorado (a lata, vejam bem), utilizando, para o efeito, uma série de armas desleais. Bombas, mísseis, motins nos aquartelamentos, manobras subterrâneas de índole mercenária, obuzes de morteiro powered by Hamas? Nada disso. Muito pior: «maledicência», «linguagem politicamente paupérrima», «mentira travestida de verdade», populismo e demagogia muito, muito, muito ruins.
O que fazer, interrogar-se-à o forasteiro. Fugir para não ter que assistir ao fim do sonho e ao regresso das sombras? Ficar para ajudar esta gente de bem a liquidar a má gente, que se prepara agora para regressar e lixar o paraíso? Ou, numa insólita terceira via, acreditar que tudo aquilo não passa de retórica «paupérrima», fechar o browser, marcar mesa no Pinóquio e combater a gripe com o recurso à cervejinha? Escolha difícil, esta.
Sorte porque, como alienígena simpático e bem intencionado, ficará radiante por saber que chegou a um país na sua fase pós-trevas. Dissecando com alguma atenção (não muita porque aquilo é tão explicito e fundamentado que exige um esforço cognitivo mínimo) os relatos do SIMplex, chegará rapidamente à conclusão que esta paróquia viveu na escuridão até 2005, servida, até então, por um bando de alucinados basbaques alaranjados que nada fizeram pelo povo e tudo complicaram por manifesta incompetência e apego cego a interesses obscuros. Mais uma vez com relativa parcimónia intelectual (outra, aliás, não lhe é exigida), travará conhecimento com uma personagem extraordinária, mítica, dona de uma vontade indómita e de um coração de ouro – o Sr. Eng. José Sócrates, de seu nome -, o qual, durante quatro anos de dedicação sacrossanta e grande espírito de sacrifício, liderou com especial génio, notável zelo mas, acima de tudo, punho delico-forte o batalhão de bravos que resgataram o país do abismo.
Azar porque, como viajante não muito propenso a confusões e avesso a agitações de ordem social, aperceber-se-à de que aquela gente manhosa, acéfala e aparvalhada, cuja presença e acção tinha servido, até 2005, de tampão à luz, prepara agora com afinco, embora de forma meio atrapalhada segundo os cronistas do SIMplex, um regresso despudorado (a lata, vejam bem), utilizando, para o efeito, uma série de armas desleais. Bombas, mísseis, motins nos aquartelamentos, manobras subterrâneas de índole mercenária, obuzes de morteiro powered by Hamas? Nada disso. Muito pior: «maledicência», «linguagem politicamente paupérrima», «mentira travestida de verdade», populismo e demagogia muito, muito, muito ruins.
O que fazer, interrogar-se-à o forasteiro. Fugir para não ter que assistir ao fim do sonho e ao regresso das sombras? Ficar para ajudar esta gente de bem a liquidar a má gente, que se prepara agora para regressar e lixar o paraíso? Ou, numa insólita terceira via, acreditar que tudo aquilo não passa de retórica «paupérrima», fechar o browser, marcar mesa no Pinóquio e combater a gripe com o recurso à cervejinha? Escolha difícil, esta.
Interpretações
Sócrates disse: "Está para nascer um primeiro-ministro que faça melhor no défice do que eu".
A leitura correcta é: "Ainda estão para nascer alguns dos primeiros-ministros que hão-de pagar o meu défice." (daqui)
A leitura correcta é: "Ainda estão para nascer alguns dos primeiros-ministros que hão-de pagar o meu défice." (daqui)
quarta-feira, julho 22, 2009
Uma aparente patetice que faz cada vez mais sentido
How many times have you heard someone say
If I had his money I'd do things my way
But little they know that it's so hard to find
One rich man in ten with a satisfied mind
For money can't buy back your youth when you're old
Or a friend when you're lonely or a heart that's grown cold
The wealthiest person is a pauper at times
Compared to the man with a satisfied mind
Once I was living in fortune and fame
I had all that I dreamed of to get a start in lifes game
Then suddenly it happened and I lost every dime
But I'm richer by far with a satisfied mind
Satisfied Mind Jonathan Richman
Pura preguiça
Listas de títulos. Siete azules para una sonrisa: inmundo; Midsummer's Night Dream, Noches áticas: buenos; Confessions of an English Opium-Eater: malo; BORGES: «Kant no buscaba títulos poéticos: tenía una idea informativa... Fundamentación de la metafísica de las costumbres. Su refutación de Swedenborg es una bobera y una vergüenza el libro sobre los caracteres de los pueblos. Cómo no comprendió que si él no había viajado no debía escribir un libro de observaciones así? Recogió lugares comunes...».
BIOY: «Empecé La guerra y la paz». BORGES: «Cuesta entrar. Es un novelista muy hábil? Qué va a ser! Yo creo que lo mejor es leer todo lo que se refiere a la guerra». Sarcásticamente agrega: «Pero entoces te perdés el idilio...».
Las otras noches decíamos: «Pondríamos desenmascarar a nuestros enemigos. No lo haremos. Por altura? Por cobardía? Por generosidad? Nada de eso. Por pura pereza...».
in Borges de Adolfo Bioy Casares (Ediciones Destino, 2006), pagina 544.
terça-feira, julho 21, 2009
Agradecem-se sugestões porque eu bloqueei a meio do caminho
Os discos portugueses mais interessantes dos últimos trinta anos (*):
(*) Eu tinha prometido a mim mesmo deixar-me destas tretas, mas depois do SIMplex tudo é possível. Vem aí o século XXII.
(*) Eu tinha prometido a mim mesmo deixar-me destas tretas, mas depois do SIMplex tudo é possível. Vem aí o século XXII.
Tudo isto porque receiam que a «velhota» venha estagnar o país ou inverter o progresso?
Bem espremidos, os argumentos dos amigos da Fernanda e do José baseiam-se mais na suposta incapacidade governativa das gentes do PSD, do que propriamente nos méritos do governo PS e do seu primeiro-ministro. O tom geral é este: o país não pode esperar quatro anos enquanto uma senhora de provecta idade hesita entre forrar o maple lá de casa com rendinha ou pintar o cabelo com farandol arroxeado, enquanto entretém os netinhos (leia-se os ministros) com a história do capuchinho vermelho. A campanha do SIMplex – porque se trata, de facto, de uma descarada extensão da campanha eleitoral do Partido Socialista – vai tentar vender até à exaustão a ideia de que: a) o PSD não tem uma «ideia» para o país, um «rumo», um «desígnio», uma «estratégia» - daí o «atraso» na apresentação do programa; b) a sua intervenção política está alicerçada na negação mecânica e automática de tudo o que o PS fez (bem ou mal, não interessa); e, por arrastamento, c) a política do PSD é a do pessimismo desencorajador, desmobilizador, tacanho (alguns arriscarão o epíteto «salazarento»). Pelo meio, para não denunciar um seguidismo acéfalo face ao partido, irão dizer que «sim senhor, é verdade que Sócrates não fez metade do que se propôs fazer, que muita coisa ficou pelo caminho ou foi erradamente decidida» mas, ao contrário do PSD – que esteve quatro anos na oposição a um governo maioritário, ou seja, um governo que teve luz verde para fazer o que entendia ser certo para o país -, o PS revelou «efectiva e singular vontade» (nas palavras de Rogério da Costa Pereira) e, obviamente, uma aposta forte na política do optimismo e da imagem. Temos, por isso, blogue. Resta uma única dúvida: dando de barato o por agora razoável cepticismo relativamente ao PSD, esta gente esclarecida, sofisticada, estudiosa, conhecedora do país e das suas gentes, acredita piamente que houve resultados positivos na Justiça, na Educação, na Cultura, na Economia e nas Finanças que justifiquem o optimismo imbecil e a respectiva caução de uma política que colocou Portugal em sérias dificuldades para enfrentar a crise? Ou a pergunta será outra: era de esperar outra coisa de quem confunde um acordo com a Nissan, ainda não concretizado, para a produção de baterias lítio-ião, com a produção de automóveis eléctricos e histericamente anuncia o século XXII?
VPV
Para já, e até ver, a entrevista de Vasco Pulido Valente à LER (excelente revista, by the way), para além de um tour de force, é a melhor entrevista dada pelo historiador e cronista. Está lá tudo: o resultado psicodinâmico de falhanços, expectativas esfumadas ou concretizadas, sucessos conquistados mas não necessariamente definitivos (mainly abroad), desilusões mais ou menos previsíveis, certezas difusas e abundante cepticismo, corolário de cosmovisões emanadas de um ethos peculiar, fruto de uma educação igualmente peculiar e de uma sofisticada erudição (a possível tendo em conta o meio e o berço mas, ainda assim, a milhas da indigência que este país consegue produzir ou ensaiar hoje em dia). Justaposições de experiências de uma vida cheia.
Através de linhas e entrelinhas, Vasco Pulido Valente serve-nos o auto-retrato de um homem que, nascendo num país pobre, atrasado, cheio de problemas de personalidade e patranhas conceptuais, tentou ao longo da vida libertar-se das amarras metafísicas e epistemológicas da academia, da inércia social e económica que fatalmente o empurrava para uma espécie de mediocridade conformada e politicamente correcta, tecida ou encabeçada por uma galeria de eminências pardas, apoiadas e patrocinadas por um regime que, mesmo em tempo de boas intenções, elevou a mediocridade a desígnio nacional (por via, é certo, de uma democratização que era inevitável).
É óbvio que a visão de Vasco Pulido Valente, infelizmente mas não forçosa ou deliberadamente pessimista, parece a de um homem que já não pertence a este mundo ou que pediu há muito o divórcio. É, por tudo isso, óbvio que deplore ou menospreze Saramago e quejandos: eles representam o lado pacóvio e comezinho do unanimismo oficial que ele sempre detestou, das capelinhas intocáveis mas bafientas, repletas de amiguismos de conveniência e interesses carreiristas, o lado maniqueísta e ideologicamente engajado dos intelectuais, fruto de um lastro pútrido libertado durante e após o último ancient regime de que frequentemente nos ocorre falar, e da notável galeria de dilectos e estúpidos representantes da ditadura, e de «respeitáveis» e simbólicos combatentes anti-fascistas (alguns revelando equivalente ideário totalitário). É também óbvio que, no plano nacional, Vasco Pulido Valente destaque poucos: foram, de facto, muito poucos os que nos últimos duzentos anos merecem ser revisitados (diferente de serem esquecidos).
Há gente imbecil que, provavelmente, achará tudo isto um rol de contradições próprias de um militante maldizente que não entende o mundo (este equinoderme é um sério candidato), de um deslocado que recusa perceber a realidade e que, vai na volta, «mete os pés pelas mãos». Au contraire: o mundo está perigoso, estupidificante, cheio de trash e o suave odor a fim de regime que paira no ar não é sintoma: é um processo. Mas, claro: é o Vasco Pulido Valente que está a mais. Sorte a dele.
Através de linhas e entrelinhas, Vasco Pulido Valente serve-nos o auto-retrato de um homem que, nascendo num país pobre, atrasado, cheio de problemas de personalidade e patranhas conceptuais, tentou ao longo da vida libertar-se das amarras metafísicas e epistemológicas da academia, da inércia social e económica que fatalmente o empurrava para uma espécie de mediocridade conformada e politicamente correcta, tecida ou encabeçada por uma galeria de eminências pardas, apoiadas e patrocinadas por um regime que, mesmo em tempo de boas intenções, elevou a mediocridade a desígnio nacional (por via, é certo, de uma democratização que era inevitável).
É óbvio que a visão de Vasco Pulido Valente, infelizmente mas não forçosa ou deliberadamente pessimista, parece a de um homem que já não pertence a este mundo ou que pediu há muito o divórcio. É, por tudo isso, óbvio que deplore ou menospreze Saramago e quejandos: eles representam o lado pacóvio e comezinho do unanimismo oficial que ele sempre detestou, das capelinhas intocáveis mas bafientas, repletas de amiguismos de conveniência e interesses carreiristas, o lado maniqueísta e ideologicamente engajado dos intelectuais, fruto de um lastro pútrido libertado durante e após o último ancient regime de que frequentemente nos ocorre falar, e da notável galeria de dilectos e estúpidos representantes da ditadura, e de «respeitáveis» e simbólicos combatentes anti-fascistas (alguns revelando equivalente ideário totalitário). É também óbvio que, no plano nacional, Vasco Pulido Valente destaque poucos: foram, de facto, muito poucos os que nos últimos duzentos anos merecem ser revisitados (diferente de serem esquecidos).
Há gente imbecil que, provavelmente, achará tudo isto um rol de contradições próprias de um militante maldizente que não entende o mundo (este equinoderme é um sério candidato), de um deslocado que recusa perceber a realidade e que, vai na volta, «mete os pés pelas mãos». Au contraire: o mundo está perigoso, estupidificante, cheio de trash e o suave odor a fim de regime que paira no ar não é sintoma: é um processo. Mas, claro: é o Vasco Pulido Valente que está a mais. Sorte a dele.
Magalhães sucks
Vários leitores do i comentaram este artigo de Inês Teotónio Pereira. Regra geral, o conteúdo e o tom foram mais ou menos estes: não digam mal do Magalhães porque graças ao Magalhães milhares de crianças pobrezinhas têm hoje acesso à internet e podem finalmente dizer que têm um computador lá em casa.
A sério? Alguém já verdadeiramente «mexeu» num Magalhães? Lembram-se do primeiro-ministro ter dito, numa qualquer cimeira sul-americana, que o Magalhães era de estalo ao ponto de até os ministros o utilizarem numa base diária? Alguém que tenha utilizado um Magalhães acredita nisto? Vá lá, meus caros, agora em uníssono: o Magalhães é uma merda. Da mesma forma que o abaixamento do nível qualitativo do ensino e do grau de exigência prejudica sobretudo os pobres, distribuir Magalhães pelos pobres é ofensivo e traduz uma concepção miserabilista e misericordiosa do papel do Estado em relação aos mais desfavorecidos. O que o Estado tem feito é mais ou menos o que faz um português da classe alta/média-alta: dar aos pobres os restos lá de casa ou aquilo que já passou de moda ou já não serve. Como instrumento lúdico-didáctico, o Magalhães poderia entender-se no fim da pré-primária ou no primeiro ciclo do ensino básico. Agora, a seguir? O Magalhães sofre da síndrome 'Porsche 924': anunciava-se como made by Porsche, da mesma forma que o Magalhães se anuncia, agora, como powered by Intel, mas para quem já tinha umas luzes sobre automóveis e, sobretudo, para quem já sabia conduzir e era cada vez mais exigente com a máquina, aquilo era francamente decepcionante. Qualquer miúdo que esteja no segundo ciclo do ensino básico ou no início do terceiro - digamos em «plena expansão intelectual» - depressa se apercebe de que o Magalhães é pífio. Se o Estado, que o João Galamba ama, queria colocar computadores à séria nas casas dos mais desfavorecidos, deveria ter tido a coragem e a dignidade de produzir e distribuir um verdadeiro computador e não uma caixa manhosa, para gaúdio das elites bem pensantes e consumo das respectivas más consciências, sempre excitadas com a perspectiva de atribuir uma esmolinha ao pobrezinho. Ah, pois, já sei: estamos na presença do velhinho e nada salazarento «é melhor que nada», não é?
A sério? Alguém já verdadeiramente «mexeu» num Magalhães? Lembram-se do primeiro-ministro ter dito, numa qualquer cimeira sul-americana, que o Magalhães era de estalo ao ponto de até os ministros o utilizarem numa base diária? Alguém que tenha utilizado um Magalhães acredita nisto? Vá lá, meus caros, agora em uníssono: o Magalhães é uma merda. Da mesma forma que o abaixamento do nível qualitativo do ensino e do grau de exigência prejudica sobretudo os pobres, distribuir Magalhães pelos pobres é ofensivo e traduz uma concepção miserabilista e misericordiosa do papel do Estado em relação aos mais desfavorecidos. O que o Estado tem feito é mais ou menos o que faz um português da classe alta/média-alta: dar aos pobres os restos lá de casa ou aquilo que já passou de moda ou já não serve. Como instrumento lúdico-didáctico, o Magalhães poderia entender-se no fim da pré-primária ou no primeiro ciclo do ensino básico. Agora, a seguir? O Magalhães sofre da síndrome 'Porsche 924': anunciava-se como made by Porsche, da mesma forma que o Magalhães se anuncia, agora, como powered by Intel, mas para quem já tinha umas luzes sobre automóveis e, sobretudo, para quem já sabia conduzir e era cada vez mais exigente com a máquina, aquilo era francamente decepcionante. Qualquer miúdo que esteja no segundo ciclo do ensino básico ou no início do terceiro - digamos em «plena expansão intelectual» - depressa se apercebe de que o Magalhães é pífio. Se o Estado, que o João Galamba ama, queria colocar computadores à séria nas casas dos mais desfavorecidos, deveria ter tido a coragem e a dignidade de produzir e distribuir um verdadeiro computador e não uma caixa manhosa, para gaúdio das elites bem pensantes e consumo das respectivas más consciências, sempre excitadas com a perspectiva de atribuir uma esmolinha ao pobrezinho. Ah, pois, já sei: estamos na presença do velhinho e nada salazarento «é melhor que nada», não é?
sábado, julho 18, 2009
No Sergi Arola ou no Santcelone?
O João Galamba - economista, blogger e a mais recente estrela na galáxia de opinion-makers televisionados - esteve há uns tempos na SIC Notícias onde disse coisas fantásticas. A propósito dos manifestos sobre as estratégias macroeconómicas (era esse o tema em apreço), o João Galamba afirmou que o Estado devia «liderar» no que toca a investimentos porque, logo a seguir, viria o investimento privado. (Estão a ver a coisa? O investimento privada vive, acabrunhado, numa tenda ou num pardieiro (ou será antes Quinta da Marinha?). De tempos a tempos, observa, nervosamente e de soslaio, mal escondendo uma inveja ainda assim mitigada por um eventual interesse na coisa, o comportamento exemplar e sacrossanto do investimento público. Sem este, não dá um passo, mantendo-se no interior do seu albergue, a pão e água.) Dito de outra forma, o Estado deve ser o pastor, os privados a carneirada. Melhor ainda: o Estado deve ser o motor, os privados o atrelado.
O nosso João Galamba defende, por isso, e de forma pungente, a tese da estratégia «integrada», «global» e «a longo prazo» (é esta a profundidade temporal que ele, aliás, impõe) em sede de investimento público. Com base numa profissão de fé que cauciona a putativa e inexpugnável santidade e utilidade do papel do Estado na economia, o opinion maker economista (ou o contrário, não sei) quer em Portugal o TGV (várias linhas se possível), o aeroporto, a terceira ponte sobre o Tejo, a terceira auto-estrada Lisboa-Porto, viadutos, obras e empreitadas estatais que puxem o atrelado dos privados - um bando, supõe-se, de atadinhos amorfos.
No meio deste comovente entusiasmo, o João Galamba recusou falar de projectos ou de opções concretas: as suas circunvalações cerebrais posicionam-no num plano dialéctico superior que esmaga a mania pateta e escusada das continhas (que lhe faz lembrar o Sr. Anacleto, da mercearia de infância, sempre de lápis na orelha a fazer contas à vidinha) e, horror dos horrores, a chata da análise custo-benefício, exercício próprio de avarentos e de gente pouco progressista (Manuela Ferreira Leite e afins). A conclusão é óbvia para o nosso João Galamba: tudo o que vier do Estado e no âmbito de uma estratégia «integrada», «global» e «a longo prazo» (repetir isto até à exaustão) é uma bênção, uma panaceia, um seguro de vida colectivo. Mais: é a única saída para a crise. O filão é inesgotável e há-de sempre haver quem pague.
En passant, o João Galamba teve ainda tempo para denunciar aquilo que toda a gente sabe e eu, um vegetal, não sabia: os privados – tipo «as empresas» - não investem porque estão com medo e/ou na expectativa. Os malandros!
Dando de barato o facto de certos investimentos só serem possíveis via iniciativa do Estado – como dono de obra – a conversa do João Galamba é de uma vacuidade atroz e de uma arrogância típica de quem domina conceitos vagos, impregnados, por sua vez, por ignorância a mais diversa. O que não é de estranhar: o João Galamba parece ser o típico menino que raramente saiu da academia quando deveria ter saído (há alturas mais certas para levar com o bafo quente e petrificado da realidade terrena) ou que ocupa, agora, um qualquer cargo no Estado onde, de quando em vez, lhe caem no colo as estatísticas do INE ou os boletins do BdP, tão úteis para a sua personalidade de economista perceber o país. O país? Bem, o país é uma coisa demasiado complexa e distante: empresas, empresários, trabalhadores, clientes, fornecedores, o fisco, a segurança social, as direcções regionais? Entidades abstractas que o João Galamba acredita existirem mas que, na realidade, ele desconfia que talvez não existam, pelo menos para além dos clichézinhos e das ideias feitas com que espargiram as suas meninges, e às quais ele se agarra que nem uma lapa.
Quantas vezes o João Galamba visitou empresas (grandes, pequenas, assim-assim)? Já trabalhou nalguma empresa? Onde é que o João Galamba se baseia para dizer que os empresários não investem porque estão com medo ou na expectativa? Numa bola de cristal, lá de casa, ou através dos jornais económicos? Nunca lhe terá ocorrido a ideia de que, na sua generalidade, os empresários estão sem meios para se movimentar? Que o «receio» ou a «expectativa» são uma capa para uma (outra) dura realidade: a de não haver dinheiro e saco para continuar a trabalhar num país burocrático, servido por uma lei laboral repleta de contradições, por uma carga fiscal pesadíssima que trata as boas e más empresas de igual modo, um país repleto de programas cretinos e mal direccionados pelo bom do Estado?
O João Galamba já alguma vez tentou elaborar uma candidatura a um programa de investimento co-financiado? Saberá ele o que é aquilo? O João Galamba tem a mínima noção de quais são os apertadíssimos critérios que habilitam uma empresa a tornar-se elegível para sonhar com uma provável mas remota aprovação de uma candidatura a um qualquer programa de incentivo da UE (e que, na prática, leva a que os apoios só estejam ao alcance das empresas que, na realidade, até passavam mais ou menos bem sem o dito apoio)?
O João Galamba já alguma vez tentou recrutar pessoal? Chegou a inteirar-se do nível qualitativo do que lhe surgiu pela frente? O João Galamba tem a mínima noção do que são os programas de estágios profissionais (InovJovens e Ca.) lançados pelos Centros de Emprego: a burocracia da coisa, a total ineficácia da fiscalização, o alcance duvidoso e restritivo dos programas?
O João Galamba alguma vez tentou dar início a um projecto agrícola em Portugal, daqueles que lá fora (em Espanha, por exemplo) têm futuro, mas que cá dentro escapam ao directório instituído pela UE para efeitos de «elegibilidade»?
O João Galamba alguma vez foi a um banco pedir, em nome de uma empresa que está em dificuldade, dinheiro para um projecto de remodelação ou de reestruturação? O João Galamba tem a noção do aperto em que vivem actualmente milhares e milhares de empresas e empresários neste país, que viram as vendas e a procura sucumbirem no espaço de um ano e as instituições financeiras bater-lhes com a porta na cara?
O Estado? Alguém devia avisar o João Galamba do seguinte: o Estado somos nós. O Estado é constituído por pessoas – falíveis, competentes, incompetentes, assim-assim, capazes de boas escolhas ou péssimas opções, excelentes iniciativas ou decisões desastrosas e abstraídas da realidade. O João Galamba devia perceber, tão bem quanto percebe o papel fundamental do Estado, que as pessoas que fazem parte desse mesmo Estado têm interesses: pessoais, corporativos, partidários, privados, whatever.
O Estado é, mais para o bem que para o mal mas muito naturalmente, uma coisa falível. É por isso que importa falar de coisas concretas quando estão em causa decisões públicas sobre investimentos públicos, e não apenas discutir o plano da filosofia política (mais Estado, menos Estado, que papel, etc.). É preciso saber se o investimento A é melhor que o B ou se, inclusivamente, valerá a pena fazê-lo agora, depois ou nunca. É preciso perceber as implicações de cada investimento, quem vai beneficiar com ele no curto, médio e longo prazo, comparar alternativas, fazer escolhas perante meios e recursos escassos. E-s-c-a-s-s-o-s. O tal lapinhos atrás da orelha.
Do que este país precisa não é de um Estado paternalista ou «timoneiro». Muito menos «controleiro». Do que este país precisa é de um tecido produtivo à séria: de novos projectos privados na agricultura, na floresta e na industria. Mark my words, Johnny-o: p-r-i-v-a-d-o-s. Daqueles que criam postos de trabalho sustentáveis, com criação liquida de riqueza, porque não sobrecarregam o Estado. Portugal precisa de produzir, ou de continuar a produzir, carros, bicicletas, calçado, roupa, fruta, cereais, moldes, computadores e componentes, programas informáticos, painéis fotovoltaicos, gado, lacticínios, mobiliário, estruturas metálicas, máquinas, ferramentas, compotas, fibras ópticas, vinho, azeite, cortiça, etc. etc. Portugal precisa de marcas, patentes, inovação, novas industrias. Não de betão e macadame. Auto-estradas, TGVs, terceiras travessias, aeroportos faraónicos: são estas as prioridades? Para levar o quê, para onde? O João Galamba a Madrid para almoçar no Santcelone, fazer compras na Calle Serrano e depois, quem sabe, visitar o Prado?
O nosso João Galamba defende, por isso, e de forma pungente, a tese da estratégia «integrada», «global» e «a longo prazo» (é esta a profundidade temporal que ele, aliás, impõe) em sede de investimento público. Com base numa profissão de fé que cauciona a putativa e inexpugnável santidade e utilidade do papel do Estado na economia, o opinion maker economista (ou o contrário, não sei) quer em Portugal o TGV (várias linhas se possível), o aeroporto, a terceira ponte sobre o Tejo, a terceira auto-estrada Lisboa-Porto, viadutos, obras e empreitadas estatais que puxem o atrelado dos privados - um bando, supõe-se, de atadinhos amorfos.
No meio deste comovente entusiasmo, o João Galamba recusou falar de projectos ou de opções concretas: as suas circunvalações cerebrais posicionam-no num plano dialéctico superior que esmaga a mania pateta e escusada das continhas (que lhe faz lembrar o Sr. Anacleto, da mercearia de infância, sempre de lápis na orelha a fazer contas à vidinha) e, horror dos horrores, a chata da análise custo-benefício, exercício próprio de avarentos e de gente pouco progressista (Manuela Ferreira Leite e afins). A conclusão é óbvia para o nosso João Galamba: tudo o que vier do Estado e no âmbito de uma estratégia «integrada», «global» e «a longo prazo» (repetir isto até à exaustão) é uma bênção, uma panaceia, um seguro de vida colectivo. Mais: é a única saída para a crise. O filão é inesgotável e há-de sempre haver quem pague.
En passant, o João Galamba teve ainda tempo para denunciar aquilo que toda a gente sabe e eu, um vegetal, não sabia: os privados – tipo «as empresas» - não investem porque estão com medo e/ou na expectativa. Os malandros!
Dando de barato o facto de certos investimentos só serem possíveis via iniciativa do Estado – como dono de obra – a conversa do João Galamba é de uma vacuidade atroz e de uma arrogância típica de quem domina conceitos vagos, impregnados, por sua vez, por ignorância a mais diversa. O que não é de estranhar: o João Galamba parece ser o típico menino que raramente saiu da academia quando deveria ter saído (há alturas mais certas para levar com o bafo quente e petrificado da realidade terrena) ou que ocupa, agora, um qualquer cargo no Estado onde, de quando em vez, lhe caem no colo as estatísticas do INE ou os boletins do BdP, tão úteis para a sua personalidade de economista perceber o país. O país? Bem, o país é uma coisa demasiado complexa e distante: empresas, empresários, trabalhadores, clientes, fornecedores, o fisco, a segurança social, as direcções regionais? Entidades abstractas que o João Galamba acredita existirem mas que, na realidade, ele desconfia que talvez não existam, pelo menos para além dos clichézinhos e das ideias feitas com que espargiram as suas meninges, e às quais ele se agarra que nem uma lapa.
Quantas vezes o João Galamba visitou empresas (grandes, pequenas, assim-assim)? Já trabalhou nalguma empresa? Onde é que o João Galamba se baseia para dizer que os empresários não investem porque estão com medo ou na expectativa? Numa bola de cristal, lá de casa, ou através dos jornais económicos? Nunca lhe terá ocorrido a ideia de que, na sua generalidade, os empresários estão sem meios para se movimentar? Que o «receio» ou a «expectativa» são uma capa para uma (outra) dura realidade: a de não haver dinheiro e saco para continuar a trabalhar num país burocrático, servido por uma lei laboral repleta de contradições, por uma carga fiscal pesadíssima que trata as boas e más empresas de igual modo, um país repleto de programas cretinos e mal direccionados pelo bom do Estado?
O João Galamba já alguma vez tentou elaborar uma candidatura a um programa de investimento co-financiado? Saberá ele o que é aquilo? O João Galamba tem a mínima noção de quais são os apertadíssimos critérios que habilitam uma empresa a tornar-se elegível para sonhar com uma provável mas remota aprovação de uma candidatura a um qualquer programa de incentivo da UE (e que, na prática, leva a que os apoios só estejam ao alcance das empresas que, na realidade, até passavam mais ou menos bem sem o dito apoio)?
O João Galamba já alguma vez tentou recrutar pessoal? Chegou a inteirar-se do nível qualitativo do que lhe surgiu pela frente? O João Galamba tem a mínima noção do que são os programas de estágios profissionais (InovJovens e Ca.) lançados pelos Centros de Emprego: a burocracia da coisa, a total ineficácia da fiscalização, o alcance duvidoso e restritivo dos programas?
O João Galamba alguma vez tentou dar início a um projecto agrícola em Portugal, daqueles que lá fora (em Espanha, por exemplo) têm futuro, mas que cá dentro escapam ao directório instituído pela UE para efeitos de «elegibilidade»?
O João Galamba alguma vez foi a um banco pedir, em nome de uma empresa que está em dificuldade, dinheiro para um projecto de remodelação ou de reestruturação? O João Galamba tem a noção do aperto em que vivem actualmente milhares e milhares de empresas e empresários neste país, que viram as vendas e a procura sucumbirem no espaço de um ano e as instituições financeiras bater-lhes com a porta na cara?
O Estado? Alguém devia avisar o João Galamba do seguinte: o Estado somos nós. O Estado é constituído por pessoas – falíveis, competentes, incompetentes, assim-assim, capazes de boas escolhas ou péssimas opções, excelentes iniciativas ou decisões desastrosas e abstraídas da realidade. O João Galamba devia perceber, tão bem quanto percebe o papel fundamental do Estado, que as pessoas que fazem parte desse mesmo Estado têm interesses: pessoais, corporativos, partidários, privados, whatever.
O Estado é, mais para o bem que para o mal mas muito naturalmente, uma coisa falível. É por isso que importa falar de coisas concretas quando estão em causa decisões públicas sobre investimentos públicos, e não apenas discutir o plano da filosofia política (mais Estado, menos Estado, que papel, etc.). É preciso saber se o investimento A é melhor que o B ou se, inclusivamente, valerá a pena fazê-lo agora, depois ou nunca. É preciso perceber as implicações de cada investimento, quem vai beneficiar com ele no curto, médio e longo prazo, comparar alternativas, fazer escolhas perante meios e recursos escassos. E-s-c-a-s-s-o-s. O tal lapinhos atrás da orelha.
Do que este país precisa não é de um Estado paternalista ou «timoneiro». Muito menos «controleiro». Do que este país precisa é de um tecido produtivo à séria: de novos projectos privados na agricultura, na floresta e na industria. Mark my words, Johnny-o: p-r-i-v-a-d-o-s. Daqueles que criam postos de trabalho sustentáveis, com criação liquida de riqueza, porque não sobrecarregam o Estado. Portugal precisa de produzir, ou de continuar a produzir, carros, bicicletas, calçado, roupa, fruta, cereais, moldes, computadores e componentes, programas informáticos, painéis fotovoltaicos, gado, lacticínios, mobiliário, estruturas metálicas, máquinas, ferramentas, compotas, fibras ópticas, vinho, azeite, cortiça, etc. etc. Portugal precisa de marcas, patentes, inovação, novas industrias. Não de betão e macadame. Auto-estradas, TGVs, terceiras travessias, aeroportos faraónicos: são estas as prioridades? Para levar o quê, para onde? O João Galamba a Madrid para almoçar no Santcelone, fazer compras na Calle Serrano e depois, quem sabe, visitar o Prado?
quinta-feira, julho 16, 2009
terça-feira, julho 14, 2009
sexta-feira, julho 10, 2009
domingo, julho 05, 2009
sábado, julho 04, 2009
Um simbolo
Quando um ministro da Economia anuncia, de forma picaresca e orgulhosa, que andou a «safar empregos» e que passou «noites em claro» para ajudar uma empresa a não fechar portas, há várias coisas que me ocorrem dizer de erradas e que ninguém, pelos vistos, pareceu reparar (caso esteja errado, perdoar-me-ão a distracção). Em primeiro lugar, um ministro não pode, por uma questão de pudor, bom senso e, até, educação, chamar à colação questões comezinhas ou pormenores particulares do seu trabalho no sentido da heroicidade ou da galhardia. You do what you gotta do. Imaginemos o que seria cada ministro fazer uso da mesma fanfarronice emocional, anunciando, com olhos de carneiro mal morto, que “durante uma semana, vejam bem!, não pude acompanhar a minha filha à praia e os habituais cafezinhos pela manhã com as minhas amigas, népias". Rídiculo. Há milhares de portugueses que ocasional e extraordinariamente passam noites em claro no exercício das suas funções. O meu peixeiro, por exemplo, passa, de quando em vez, noites em claro ao volante, ao som de Tony Carreira ou Sigur Rós, enquanto carrega, lá, e decarrega, cá, o aristocrático cherne e a alarve da sardinha. Nunca o ouvi, na manhã seguinte, alardear aos clientes esse facto, à espera de reconhecimento ou compreensão pela acidental rabujice e o majestático odor corporal. Muito menos de uma vaga de fundo.
Por outro lado, um ministro não é um justiceiro solitário que ande pelo país em collants a distribuir empregos aqui, a suprir vagas ali e a eliminar excrescências acolá. O papel do Estado não é o de dar emprego aos trabalhadores da fábrica x ou criar condições particulares para a empresa y se «safar». A obrigação de um ministro da economia é de assegurar condições justas e adequadas na economia do seu país que concorram para a igualdade de oportunidades de todas as empresas e para a livre e leal concorrência entre elas, tentando diminuir, paralelamente, os entraves à criação e distribuição de riqueza. O mercado – sim, o mercado meus pseudo-liberais ou sucialistas keynesianos da treta! – tratará do resto.
Finalmente, o gesto de Manuel Pinho, mais do que ofensivo ou pateta, é revelador e simbólico. É o retrato milimétrico de uma «nova» forma de parlamentarismo, em vigor de há alguns anos a esta parte. Os «debates da nação» transformaram-se num concurso de bocas, dichotes e zombaria, cada um a tentar superar o outro no nível de chico-espertismo brejeiro (“com esta é que eu o vou arrumar!”) e ousadia estrondosa para consumo mediático. Há muito que não se discutem ideias, rumos, opções estratégicas e ideológicas ou políticas concretas em torno do país real (sem aspas). A demagogia – outrora uma coisa benigna e, até certo ponto, suportável – atingiu, em Portugal, níveis obscenos. A retórica baixou ao nível mais rasteiro de que há memória. Pode sempre dizer-se que já no tempo dos Afonsinhos havia picardia forte, disputas acesas e palavras duras. Mas também havia inteligência argumentativa e uma certa classe e graça que conferiam à coisa alguma dignidade. Hoje em dia, não. Ontem mesmo, no parlamento, José Sócrates – um dos precursores de um estilo truculento e estridente, desleal e paupérrimo do ponto de vista argumentativo (quantos vezes vai ele desculpar os seus erros com os erros do PSD de há seis, dez ou quinze anos atrás?) e quase sempre propenso à quase desqualificação do adversário - tratou Paulo Portas de forma indecente. Até Paulo Rangel esteve uma sombra de si mesmo, já embevecido pelo saturado odor a Chanel Peixeirada n.º 5. Manuel Pinho perdeu a cabeça? Não. Saltou apenas um pouco da fina camada de verniz que alguns aplicam à pressa antes de entrar no hemiciclo.
Por outro lado, um ministro não é um justiceiro solitário que ande pelo país em collants a distribuir empregos aqui, a suprir vagas ali e a eliminar excrescências acolá. O papel do Estado não é o de dar emprego aos trabalhadores da fábrica x ou criar condições particulares para a empresa y se «safar». A obrigação de um ministro da economia é de assegurar condições justas e adequadas na economia do seu país que concorram para a igualdade de oportunidades de todas as empresas e para a livre e leal concorrência entre elas, tentando diminuir, paralelamente, os entraves à criação e distribuição de riqueza. O mercado – sim, o mercado meus pseudo-liberais ou sucialistas keynesianos da treta! – tratará do resto.
Finalmente, o gesto de Manuel Pinho, mais do que ofensivo ou pateta, é revelador e simbólico. É o retrato milimétrico de uma «nova» forma de parlamentarismo, em vigor de há alguns anos a esta parte. Os «debates da nação» transformaram-se num concurso de bocas, dichotes e zombaria, cada um a tentar superar o outro no nível de chico-espertismo brejeiro (“com esta é que eu o vou arrumar!”) e ousadia estrondosa para consumo mediático. Há muito que não se discutem ideias, rumos, opções estratégicas e ideológicas ou políticas concretas em torno do país real (sem aspas). A demagogia – outrora uma coisa benigna e, até certo ponto, suportável – atingiu, em Portugal, níveis obscenos. A retórica baixou ao nível mais rasteiro de que há memória. Pode sempre dizer-se que já no tempo dos Afonsinhos havia picardia forte, disputas acesas e palavras duras. Mas também havia inteligência argumentativa e uma certa classe e graça que conferiam à coisa alguma dignidade. Hoje em dia, não. Ontem mesmo, no parlamento, José Sócrates – um dos precursores de um estilo truculento e estridente, desleal e paupérrimo do ponto de vista argumentativo (quantos vezes vai ele desculpar os seus erros com os erros do PSD de há seis, dez ou quinze anos atrás?) e quase sempre propenso à quase desqualificação do adversário - tratou Paulo Portas de forma indecente. Até Paulo Rangel esteve uma sombra de si mesmo, já embevecido pelo saturado odor a Chanel Peixeirada n.º 5. Manuel Pinho perdeu a cabeça? Não. Saltou apenas um pouco da fina camada de verniz que alguns aplicam à pressa antes de entrar no hemiciclo.
sexta-feira, julho 03, 2009
Não é por nada
Mas ainda um dia gostaria de ler qualquer coisa escrita pelo Rui Ramos aqui. Diz que é, também, autor do blogue.