Da saloiice e da presunção
Editorial da revista Sábado de 13/12/2012
Ninguém quer o acordo ortográfico
"Notícia de última hora para todas as crianças que estão a aprender segundo o último acordo ortográfico, para todos os professores que estão a preparar aulas segundo o último acordo ortográfico, para todas as editoras que estão a lançar livros segundo o último acordo ortográfico, para todas as empresas que passaram a fazer a sua comunicação segundo o último acordo ortográfico e, de forma geral, para todos os portugueses que estão a tentar esforçadamente mudar a forma como sempre escreveram para obedecerem às regras do último acordo ortográfico: esqueçam o último acordo ortográfico.
Esta semana, a poucos dias do fim do prazo, o Brasil anunciou que pretende adiar a aplicação desse acordo de 2013 para 2016. Mas não anunciou apenas isso. O ministro da Educação brasileiro afirmou que esses três anos não vão servir para preparar a aplicação do acordo – vão servir para o contrário. Segundo ele, o acordo actual está “muito aquém do que se poderia” fazer.
O senador Cyro Miranda, que pertence às comissões de Educação e de Relações Exteriores, foi ainda mais claro: “Além de o novo acordo ter sido muito mal feito, os professores ficaram de fora. Precisamos de rever tudo. O novo acordo tem tantas excepções que os professores não sabem o que vão ensinar.” E não foi tudo: o senador deu a entender que o Governo brasileiro quer convencer os outros países, incluindo Portugal, a fazerem uma mudança total do acordo. Alguns desses países serão fáceis de convencer. Angola, por exemplo, já mostrou várias vezes que está contra o acordo.
Os governos portugueses acharam que a melhor estratégia para impor o acordo ortográfico aos críticos era avançar a 200 km/hora, contra todos os obstáculos, contra todas as dúvidas e contra todos os avisos. Agora, quando se olha para trás, percebe-se que ninguém o seguiu."
1 Comentários:
Bem, pode até ser, nalgumas almas, que impere saloiice e da presunção, mas concedamos que possa, mais globalmente, ser vontade de futuro, ânsia de modernidade avant la lettre, necessidade de se tornarem pioneiros, enfim, outros tópicos de razão, que não valores ou princípios, mas tão curiosos ou respeitáveis quanto o nosso conservadorismo enlaçado de tradição e afecto pelo hábito, que temos por bom.
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