O MacGuffin: Do neoliberalismo

sábado, dezembro 15, 2012

Do neoliberalismo

Vasco Pulido Valente, Público 15/12/2012

Neoliberalismo? 
"A esquerda usa hoje a palavra "neoliberalismo" como antigamente, quando se proclamava marxista, usava as palavras "mais-valia", "exploração" ou "luta de classes": ou seja, sem fazer a menor ideia do está a falar. Isto não admira numa facção que nunca se distinguiu pelo estudo, pela honestidade ou pela inteligência. Mas, para nosso mal, a populaça adoptou esta "língua de pau", primitiva e estúpida, e começa a detestar o "neoliberalismo" e os "neoliberais", sobretudo os do Governo e arredores. A situação lembra muito a teoria do PREC, segundo a qual o nosso pobre e martirizado país não tinha tido uma "revolução burguesa" e devia aproveitar a trapalhada estabelecida para subir rapidamente ao "nível superior" (era assim que eles diziam) da inefável "revolução do proletariado". 
Mas, fora de brincadeiras, se não houve em Portugal uma "revolução burguesa" em 1834, houve com certeza uma reforma drástica, que mudou para sempre a sociedade indígena. Acabaram para sempre os bens "extra-comércio" da Coroa, da Igreja regular e da Universidade, que se venderam aos maiorais da diplomacia e do exército por papéis sem valor. Acabaram as restrições ao comércio (os municípios, por exemplo, que extorquiam impostos de trabalho foram drasticamente reduzidos: de mais de 3000 para um pouco menos de 400). Acabaram os privilégios de pessoas, de vilas, de instituições. E também se extinguiu o dízimo (que se pagava à Igreja secular) e as milícias (de onde se recrutara o "miguelismo"). Não chegou? Claro que não chegou, um século depois Salazar reconstituía os monopólios de Estado e, com a lei do condicionamento industrial, os monopólios de facto; e, além disso, dominava a economia através do Orçamento e do Banco de Portugal e tentou instituir sem notável sucesso um sistema corporativo. 
Mas basta ler o que neste jornal se escreveu sobre a Grécia, para perceber que a falta de um programa como o do nosso "liberalismo" e a sujeição à Turquia deixaram à Grécia uma cultura política e um regime constitucional com que nenhuma economia moderna poderia sobreviver. Na Grécia existem ainda privilégios fiscais para os grandes magnates; 135 profissões "reservadas" (como existiam em França até 1789, em Portugal até 1834 e mesmo na Europa "bárbara" e germanizada do Centro até 1848); e 700 mil funcionários públicos. Perante uma tão espantosa aberração, a troika impôs, como lhe competia, uma dose drástica de liberalismo (que, de resto, os gregos se recusam a engolir). E em Portugal repetiu a terapêutica, para nos permitir viver num mundo em que já éramos, desgraçadamente, um anacronismo. Os fanáticos que por aí andam só pensam, como de costume, em voltar para trás."

1 Comentários:

Anonymous Anónimo disse...

Isto é uma visão de bode expiatório... a essência do problema não é este, pura e simplesmente! Que vergonha intelectual.

11:58 da tarde  

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