Indignação n.º 137/2012
Como é típico e comovente em Portugal, mais uma indignação: Ana de Macedo, artista plástica, foi (largamente) subsidiada pelo Instituto de Investigação Cientifica Tropical. O Instituto de Investigação Cientifica Tropical tem por hábito apoiar «artistas» quando estes procuram aquela entidade munidos de um «projecto artístico». O apoio é feito através de «residência artística» e/ou patrocínio directo de «exposições».
Razões da indignação? Observemos o silogismo oficial: Ana de Macedo é filha de Jorge Braga de Macedo; Jorge Braga de Macedo é figura grave do PSD; o governo em funções é do PSD, logo o Instituto de Investigação Científica Tropical (nem me atrevo a perguntar de que trata este instituto), subsidiou por amiguismo a filha de um ex-ministro do PSD.
Daniel Oliveira – um homem eternamente indignado e zangado com o mundo – viu claramente no arranjinho mais uma oportunidade para denunciar o compadrio e, en passant, vestir com a pompa que o caso exige, a fatiota de porta-voz do povo agrilhoado e enfastiado com tanto logro e trapaça. Caso se tratasse de «artista» caucionado pelos amigos do Daniel, ou pelo próprio, estamos certos de que resultaria no mesmo: a denúncia sem tréguas da choldra clientelar.
Não pondo em causa mais um serviço à pátria e à Verdade, prestado por este homem justo e equilibrado, convinha explicar duas ou três coisas que, não subestimando ou escamoteando a patifaria de Ana de Macedo e do respectivo paizinho, alargam o âmbito da prelecção. A forma como, em Portugal, se atribuem subsídios a artistas e respectivas obras, está longe de obedecer a normas e critérios de grande rigor e objectividade. Se a objectividade e o rigor são, já por si, relativos em matérias que pertencem ao grande caldeirão da «cultura», sem métricas científicas clarificadoras para uma aferição estritamente técnica das virtudes da obra (regra geral, são sempre obras-primas), a coisa agudiza-se na hora da escolher a quem atribuir o pilim: a horda de «artistas», agentes, amigalhaços e consagrados arrasta-se ruidosamente, embora em surdina, na direcção dos «centros de decisão». O «artista» português pode não saber mais nada, mas qualquer tentativa de vingar no meio artístico-cultural português impele-o compulsivamente a assimilar esta máxima: mais do que uma comadre mística nas alturas, o «artista» precisa de um compadre tutelar no milieu.
Seria interessante que Daniel Oliveira retirasse (no dia de São Nunca à tarde, eu sei) as lunetas que só lhe permitem observar os seus ódios de estimação (familiares incluídos). Chegaria, certamente, a duas prodigiosas conclusões. A primeira: nenhum «artista» com paizinho proeminente na sociedade portuguesa, deveria ser alvo da mesquinha assumpção de que «só foi escolhido por ser filho de quem é». A segunda: o suposto favorecimento de que gozou Ana de Macedo, não difere mais do que uns milímetros das centenas de favorecimentos que bafejam muito «artista» português. Nem que seja por via da mais cândida, honesta e objectiva simpatia.
1 Comentários:
Excelente, como de costume...
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