O MacGuffin: janeiro 2011

sábado, janeiro 22, 2011

Dia 24, sff

A corrida para as presidências terminou e, com ela, uma campanha que não ficará para a história do Portugal democrático. A ficar na memória, será por motivos pouco edificantes: quatro pseudocandidatos (Coelho, Alegre, Nobre, Moura) e um candidato «programático» para consumo do eleitorado de um partido (Lopes), apresentaram-se ao país com o nobilíssimo intuito de derrubar o ogre de Belém. Ou seja, cinco das seis candidaturas nasceram não a favor de ideias ou «programas» (seja lá o que isso for), mas contra o único candidato com estatuto e dignidade «profissional» para exercer o cargo. Reconheça-se, ao menos, o respeito por Cavaco Silva.

A apoiar a estratégia de combate (ou, se quiserem, a «campanha negativa») dos quatro pseudos e do palavroso aparelhista, esteve a mui nobre e eficaz máquina propagandista do Partido Socialista (e do governo) – que, para além de ter lançado na corrida o Dr. Defensor Moura como veículo da táctica de ataque revanchista à la Freeport (o não-caso BPN), imprimiu a temática e o rumo dos acontecimentos. Em bom rigor, ninguém, nem mesmo Cavaco Silva, se destacou por ter dito algo de convincente ou acima do banal, com a importante excepção de Cavaco Silva ter sido o único a revelar conhecimento dos poderes e consciência das limitações do exercício do cargo.

A bravata de Alegre, para além de ter ido a reboque, durante alguns dias, do não-caso BPN, limitou-se à retórica laudatória do «Estado Social», que Alegre, por várias vezes instigado a explicar no concreto o que queria dizer, demonstrou não ter do mesmo a mais pálida ideia (a não ser umas frases meio poéticas sobre os «desfavorecidos» e as «injustiças»). Fernando Nobre, por esta altura arrependidíssimo caso o seu altruísta encéfalo tenha resistido a tanta picada de mosquito por terras africanas, revelou total inépcia para o discurso político, facto perfeitamente consentâneo com a sua postura «a política à portuguesa é uma choldra e eu não tenho nada a ver com essa canalha, ok?». De resto, nada mais disse. José Manuel Coelho, de que Pacheco Pereira achou piada, adoptou a figura do maluquinho que lá vai dizendo umas verdades de forma castiça, para gáudio do povo revisteiro, mas em boa verdade não dizendo coisa com coisa (ver a entrevista do Rui Castro ao candidato). Defensor Moura foi o candidato instrumental na campanha Cavaco-BPN (levando à histeria e ao delírio anticavaquista a Dra. Ferreira Alves), aproveitando o tempo de antena para defender a perspectiva regionalista do país. Finalmente, Francisco Lopes pôs a cassete do Partido Comunista: o Estado tem que tirar aos capitalistas para dar aos trabalhadores. Um marxista será sempre um marxista.

Amanhã, se as coisas correrem de feição a Portugal, Cavaco Silva será eleito à primeira volta. É, no mínimo, tenebrosa a ideia de ver qualquer outro dos cinco candidatos sentado em Belém. E penosa a perspectiva de uma segunda volta, com mais do mesmo.

Dia 24, regressemos à realidade.

(publicado originalmente aqui)

terça-feira, janeiro 18, 2011

Don Draper's Guide to picking up women

sexta-feira, janeiro 07, 2011

E que tal falarmos um pouco do país, pode ser?

O que se tem dito e redito sobre o suposto «caso» Cavaco Silva/BPN revela bem a forma leviana, superficial e amnésica como a classe jornalística pegou no assunto, e a maneira insidiosa e cínica como certos opinadores aproveitaram o caso para revelar o seu eterno asco ao «tosco de Boliqueime» (*). Não falo, por questões higiénicas, dos que engendraram este plano de ataque (nada disto foi feito por acaso) e dos que o lançaram em prime-time (o Sr. Defensor Moura chegou a dizer numa rádio “bom, não é tão grave como tráfico de armas, prostituição ou tráfico de droga”). Falo dos que cavalgaram a onda sem o mínimo de prudência, produzindo asneiras e distorções a um ritmo frenético. Exemplo: Inês Pedrosa esteve, há minutos, a criticar «esta forma de vender acções à margem da bolsa». Não havia outra forma de as vender, cara Inês. A SLN não estava cotada em bolsa. Tanta ignorância mete dó. “Ah, mas foi Oliveira e Costa quem comprou as acções!” Não, foi a SLN Valor. “Ah, mas foi uma negociata directa, por escrito, entre um (Cavaco Silva) e outro (Oliveira e Costa)”. Era o procedimento obrigatório para os accionistas da SLN (q-u-a-l-q-u-e-r accionista). Mais: o Presidente (Oliveira e Costa) tinha estatutariamente o direito de preferência. [Quem recorre, hoje em dia, a um banco para concretizar uma aplicação financeira (por exemplo, um pacote diversificado de acções), sabe que, no dia em que quiser vender essas acções, comunica ao banco essa intenção, e é o banco que promove a venda, nunca se sabendo quem compra]. “Ah, mas foram vendidas por 2,4 quando tinham sido compradas por 1!” Era o preço a que se negociavam à época. Sete dias depois da ordem de venda de Cavaco Silva, foram vendidas acções a 2,6. Um mês depois, a 2,8. Resta dizer que Cavaco Silva declarou a mais-valia e pagou os seus impostos.

Este caso é um não-caso. Quem insistir no mesmo – de jornalistas a opinadores, de políticos a aspirantes – estará apenas a chafurdar na lama. Com o país ali ao lado.


(*) Clara Ferreira Alves, no Expresso da Meia-Noite, voltou a babar raiva sobre aquela personagem «hedionda» que exerce o cargo de PR. O ódio que esta senhora tem a Cavaco Silva é quase patológico. Terminou a dizer qualquer coisa do género “se o país eleger Cavaco Silva, significa que o país está perdido.” Recorrendo a Marcelo Rebelo de Sousa: lélé da cuca.

Canalhice ou desespero?

No programa Corredor do Poder – uma espécie de recreio político para os mais novos – a criancinha que representa o BE, exigia, ontem, esclarecimentos sobre a compra e venda de acções da SLN por parte de Cavaco Silva. O tom era “o candidato Cavaco Silva tem que esclarecer o país!”. É bom que se perceba que o BE não quer, em bom rigor, esclarecimentos nenhuns (aliás, a questão está mais que esclarecida e só por má-fé, ignorância ou debilidade mental, se pode criar um caso à volta disto). Sob a capa de um caso nado-morto, o BE vocifera, como sempre vociferou, contra o mesmo de sempre: o «lucro», as «mais-valias», os «ricos» e, en passant, a ímpia «direita». Para o BE, qualquer ser vivo que realize uma mais-valia ou obtenha um lucro «financeiro» (vocábulo que, para o BE, deve sempre fazer-se acompanhar de «especulativo»), não proveniente do trabalho (vulgo categoria A, em sede de IRS), é automaticamente um potencial salafrário. Perdoem-me, estou a condescender: é um vigarista encartado ou, cumulativamente, uma besta rectangular que explorou um menino no Benim, uma galinha no Ruanda e milhares de criaturas indefesas (incluindo linces da Malcata) um pouco por todo o lado. Juntemos a este picaresco preconceito o facto de a criatura em causa – automaticamente réu e culpado - estar conotada com o centro direita ou simplesmente com a direita, et voilà: o circo está montado, a marcação será cerrada, o venerável selo da verdade que se ponha a milhas porque, meus amigos (agora pareço o Henrique Raposo), valores mais altos se levantam. Os «pulhas» da alta finança e/ou do poder não passarão!

No mesmo programa, o jovem representante do Partido Comunista, João Oliveira, constatando que a cartada das acções da SLN e do «lucro de 140%» é propriedade do BE, aliviou-se de mais uma brilhante elucubração: Cavaco Silva teve pressa, e patrocinou ao mais alto nível, a nacionalização do BPN para, depreende-se, «tapar» qualquer coisa. Não interessa agora relembrar que Cavaco Silva não morreu de amores pela operação de nacionalização do banco e que só por insistência do Governo e do BdP, que garantiram tratar-se de operação «essencial» para evitar o armagedão, lá promulgou a lei.

Estas atitudes não são apenas tristes: representam a bota que empurra paulatinamente a política portuguesa para o atoleiro onde se encontra metida. Bem pode o ex-deputado Miguel Vale de Almeida espantar-se (mesmo que seja um espanto «retórico») com o facto de haver gente que, ainda que navegando nas mesmíssimas águas políticas, tenta não se misturar com a pirataria vigente. Estavam à espera do quê?
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