O MacGuffin: janeiro 2010

domingo, janeiro 31, 2010

Rui Ramos em entrevista ao Público

A nova "História de Portugal" coordenada por Rui Ramos recapitula os 900 anos do país, propondo releituras heterodoxas de acontecimentos tão fundadores como a crise de sucessão de 1383-85, a expansão ultramarina ou a Revolução Liberal de 1820. Em entrevista, Rui Ramos analisa a grande construção desses 900 anos: a "inerradicável" pluralidade do país.

Entrevista de José Manuel Fernandes, publicada na edição de 31/01/2010 do jornal Público
Porque decidiram começar logo com o Condado Portucalense, e não com os romanos ou os lusitanos?

Porque esta é uma História de Portugal, não uma história dos acontecimentos, das culturas e dos processos que existiram no território português antes da origem de um poder político determinado - o que existe desde D. Afonso Henriques -, poder esse que daria origem ao que hoje chamamos Portugal. Não quisemos fazer uma história deste território desde os tempos primordiais, mas de Portugal enquanto identidade colectiva criada por um processo político que começou com a fundação do Estado. Claro que a nação se construiu sobre uma base pré-existente, só que não existia qualquer elemento que pudesse determinar o que viria a ser o Reino de Portugal. Nesta obra não projectamos na história portuguesa o tipo de modelo oitocentista e novecentista de nação que antecede e exige a formação dos Estados.

Refere-se ao modelo inspirador dos movimentos nacionalistas pós-Revolução Francesa?

Sim. Foram movimentos culturais e políticos que visavam criar Estados que correspondessem a nações. Ora não foi esse o processo de criação do país que somos.

Foi até quase o contrário...

Com os contornos que tem na Península, Portugal é um Estado-Nação perfeito mas que foi criado pelo poder político ao longo de séculos. A nossa identidade nacional foi sendo criada em articulação com o poder político. O poder político antecede a Nação ao ponto de a passagem do Condado Portucalense a Reino de Portugal ter sido protagonizada por uma família vinda da Borgonha, que nem raízes tinha no território.

Mesmo assim estamos perante uma situação única: há quase 700 anos que as nossas fronteiras não sofrem alterações e, ao mesmo tempo, o país tem uma só língua e a esmagadora maioria da população assume pertencer a uma só religião. Essa não era a situação de partida...

Não, de todo. A única divisão política imediatamente anterior era o Condado Portucalense. E ao rectângulo que se formou no século XIII nunca tinha correspondido antes, nem no tempo dos romanos nem no dos reinos visigóticos, qualquer área que se lhe sobrepusesse. Por outro lado, não encontramos nenhuma uniformidade de paisagens...

...ou mesmo de tipo de ocupação do solo, de cultura. Há uma grande diferença entre o Portugal Atlântico e o Portugal Mediterrânico...

O Orlando Ribeiro definiu isso com muita clareza e o José Mattoso, na "Identificação de um País", tornou isso central na caracterização de Portugal. Esses estudos impedem-nos de considerar que o país é um todo homogéneo e hoje até sabemos mais: sabemos, por exemplo, que há uma variação genética importante entre as populações do Norte e as do Sul. Ou seja, temos um território que é produto da acção de um poder político, que o define e nele incorpora as populações muçulmanas e judaicas que viviam no Sul, por exemplo.

Nesta obra, no período referente à I Dinastia, escreve-se que as relações entre os nobres e o Rei foram muito mais conflituosas do que estávamos habituados a pensar, até porque em Portugal não se chegaram a criar estruturas do tipo feudal.

De facto os nobres viam o Rei como uma espécie de "primus inter pares" e o clero via-o como alguém que lhe estava submetido, pelo que o Rei tem, desde o início, de afirmar um poder público para além dessas duas referências mais tradicionais. O que os nossos reis medievais fazem são sucessivas combinações políticas, com maior ou menor sucesso, chegando a produzir nobreza e a instalar bispos, tudo para afirmar a sua soberania. Nunca temos o Rei contra os nobres, mas o Rei com uns nobres contra outros nobres, quase sempre com o apoio dos concelhos, a que iam dando cartas de Foral. É preciso notar que a afirmação deste poder segue a par com a recuperação do Direito Romano, com a concepção de um poder público que é distinto do poder feudal e das relações de vassalagem. É um poder público que se instala para servir o bem comum e não para servir nenhum grupo, nem sequer a nobreza de Entre-Douro e Minho, que sempre considerou que tinha sido ela a fazer o Rei.

Continua válida a interpretação da crise dinástica de 1383-85 segundo a qual foi o povo que se colocou ao lado do Mestre de Avis contra os nobres aliados a Castela? A revolta dos artesãos e comerciantes de Lisboa pode ser vista, como a viu Álvaro Cunhal, como uma proto-revolução burguesa?

Já nenhum medievalista sustenta essa tese. Não só não podemos aplicar as categorias sociológicas do século XX ao século XIV, como havia nobres dos dois lados. O que se passou foi que a nobreza mais estabelecida, a que estava nos lugares de topo, seguiu as regras de sucessão e apoiou as pretensões de Castela, ao mesmo tempo que outros nobres, como Nuno Álvares Pereira, que tinham menos a perder, tomam o partido do Mestre de Avis. Os argumentos que se utilizam para tentar convencer os partidários de D. Beatriz são muito variados e não apenas os referidos no século XIX, sob a influência dos nacionalismos europeus, quando se sublinhou muito o facto de o Mestre de Avis ser natural do Reino. Na época esse foi apenas um entre muitos argumentos trocados. Por exemplo: a facção do Mestre também criticava os adversários por, na época, os reis de Castela terem ficado do lado dos "hereges" no cisma que então abalou a Igreja de Roma... Também não podemos falar de nenhuma revolução, antes da utilização do povo de Lisboa, como voltaria a ocorrer em 1580, em 1640, ou mesmo em 1910. Nem foi essa movimentação popular que, depois, nas Cortes de Coimbra, sustentou a argumentação de João das Regras. O que ele defendeu foi que o trono estava vago, que todos os pretendentes eram ilegítimos, e que por isso as Cortes podiam escolher o melhor - e o melhor era o Mestre de Avis.

A II Dinastia é marcada por uma sucessão de casamentos cruzados entre as coroas de Portugal e de Castela que, mais tarde ou mais cedo, poderia dar origem à unificação dos reinos. Isso acaba por suceder com Filipe II e este, através do Pacto de Tomar, outorga a Portugal algo que definem como uma "quase Constituição". Esta visão não contraria a ideia de "usurpação" que associamos à III Dinastia?

Esse ponto é muito importante pois a verdade é que, nessa época, os reis - e não só os reis de Portugal - tinham de si próprios uma visão providencialista, para além de procurarem a sua grandeza e glória pessoais. O poder político foi produzindo a nação mas durante muito tempo não se identificou com ela. Na época havia patriotismo - basta ler "Os Lusíadas" -, mas não é o mesmo patriotismo dos séculos XIX e XX, quando este passou a estar associado à noção de soberania nacional. O que Nuno Monteiro [o historiador que escreveu esta parte do livro] faz nesses capítulos é ler as relações entre a Casa de Avis e a Casa de Habsburgo tal como eram lidas na época e não como foram lidas nos séculos XIX e XX, em que foram interpretadas à luz do nacionalismo da época e o período passou a ser visto como o do "cativeiro espanhol". Ora o que os contemporâneos discutiam era a legitimidade dos reis, e Filipe II impõe-se não apenas porque era mais forte, mas porque era legítimo por via da linha de sucessão, e porque reconheceu a especificidade de Portugal. Na monarquia dos Habsburgos foi sempre claro que Portugal era um reino herdado, não era um reino conquistado. Os próprios portugueses, na época, estavam sempre a recordá-lo e a sublinhar que o estatuto reconhecia a vida autónoma do Reino de Portugal. O que é que mudou em 1640? Filipe IV, III de Portugal, e o Conde-Duque de Olivares passaram a centralizar o poder em Madrid, quiseram "castelhanizar" toda a Península, e assim violaram o pacto constitucional consagrado em Tomar. Quando o rei se torna tirano, a "Restauração" surge como uma revolta constitucional. A leitura nacionalista veio muito mais tarde...

Na apresentação que fez do livro, António Barreto referiu que, ao longo dos séculos, as elites, progressistas ou reaccionárias, esbarravam "numa sociedade de valores e comportamentos atávicos". Sente o mesmo?

Essa percepção surge sobretudo nos séculos XIX e XX, se bem que já tivesse sido esboçada com o governo pombalino, um governo que não se via limitado pelas tradições e tinha como única fonte de direito o poder do Rei. A partir desse primeiro momento, sempre em nome do "bem comum", o poder político pôde permitir-se "transformar a sociedade". No século XIX, com os liberais, essa ambição afirma-se em toda a sua extensão: quer-se mudar a sociedade, os comportamentos, os valores dos portugueses. Surgem elites mais ou menos iluminadas que, à frente de uma máquina burocrática cada vez maior - a do Estado -, têm um programa de transformação. Só que, de forma repetida, começam a queixar-se de que não o conseguem fazer.

O período da expansão, a era dos Descobrimentos, não foi muito desenvolvido no livro. Porquê?

É verdade que não desenvolvemos a história dos Descobrimentos, mas a expansão ultramarina está bem presente. Tivemos de fazer muitas opções, de deixar de parte muitos relatos, pelo que a preocupação foi enquadrar os acontecimentos no fio da história portuguesa e sublinhar a importância que o Ultramar, o Império, teve nela. Penso, por exemplo, que esta é a primeira História de Portugal onde se sublinha a dimensão intercontinental da monarquia no tempo dos Braganças, e ainda muito antes da ida da Corte para o Brasil. Mais: ao abordarmos a Revolução Liberal, abordamos não apenas aquilo que é tradicional abordar - as ideias dos seus protagonistas -, mas também o facto de esta ter de lidar com a realidade e os problemas de um Estado intercontinental. Nesta História não se esquece que, desde a conquista de Ceuta até à saída de Macau, a nossa história não é a história deste rectângulo europeu. Até porque, como dizia Rodrigo de Sousa Coutinho, o Brasil era a maior e a melhor parte do Reino e isso é central no nosso relato.

O discurso sobre Portugal é, há muito, marcado pela ideia de declínio, de decadência. É um discurso com fundamento histórico?

O discurso do declínio surgiu ainda antes de Pombal, até por na época, sob a influência de uma visão protestante ou "iluminada", se atribuir o atraso ao catolicismo, o que levará o Marquês a expulsar os Jesuítas.

Isso era o discurso. E a realidade?

Arriscaria que nenhum dos autores desta "História de Portugal" acredita na tese da decadência tal como tem sido formulada. Até porque temos de perceber o que foi realmente o nosso período áureo. O Vasconcelos e Sousa, por exemplo, quando aborda a Expansão, deixa muito claro que um dos factores que a determinam é a pobreza e a pequenez do país. Era o caminho que podíamos tomar depois de terminada a reconquista. Por outro lado não é verdade, como escreve Nuno Monteiro, que mesmo no seu apogeu Portugal fosse uma grande potência. Tivemos sempre de jogar com os diferentes poderes e aproveitámos apenas uma janela de oportunidade. Mal apareceram concorrentes mais fortes deixámos de ser uma potência determinante no Oriente. Pensar que podíamos manter o domínio do Índico para lá do século XVI é pensar que tínhamos uma força que nunca tivemos.

Mas passou por cá uma enorme quantidade de riqueza que não criou raízes. Porquê?

Esse período não é a minha especialidade, mas muito provavelmente não criou raízes porque Portugal já era um país pobre, e já então quando se atirava dinheiro para cima de um país pobre ele desaparecia. E éramos um país pobre no sentido em que não possuíamos estruturas para produzir riqueza de forma auto-sustentada. O dinheiro que por cá passava era utilizado pelas elites para comprarem luxos onde eles eram manufacturados: no Norte de Itália, no Norte da Alemanha e nos Países Baixos. Regiões que são ricas hoje como o eram no século passado ou no século XVI. Ou mesmo no século XII. Basta olharmos para as nossas igrejas medievais e para as nossas obras do Renascimento e ver o que se fazia nesses países.

Então porquê os discursos sobre a decadência?

Têm muito a ver, por um lado, com discursos de redenção que foram importados da Europa continental e que atribuíam a decadência ou à Monarquia ou à Igreja - ou depois à República. Por outro lado, resultam da comparação dos níveis de vida.

Como explicar a capacidade de outros países europeus que eram pobres, marginais e muito atrasados mas saltaram para o pelotão da frente?

O que a investigação de história económica mais recente nos mostra é que houve quase sempre limitações de recursos e de oportunidades em Portugal. Quando existiam oportunidades, os portugueses sabiam agarrá-las - quanto mais não fosse emigrando. Por outro lado, no momento decisivo do salto em frente no século XIX, Portugal não tinha um conjunto de recursos naturais muito importantes, a começar pela impossibilidade de produzir, a preços competitivos, os alimentos mais procurados. Só tínhamos o vinho, mais nada. Há também outras razões, algumas delas culturais: também não tínhamos gente preparada, gente letrada em quantidade suficiente.

Porquê? Porque nos países protestantes se aprendia a ler para ler a Bíblia e isso não sucedia nos países católicos?

Essa explicação não chega, porque os muçulmanos lêem o Corão e não é por isso que se tornam mais letrados. Há é uma outra explicação, que nunca é referida: nenhum desses países que conseguiram uma alfabetização de massas durante o século XIX o fez contra a Igreja; foi sempre em articulação com ela. Ora em Portugal, primeiro com os liberais, a partir de 1820, e depois com os republicanos, o Estado não só tentou alfabetizar a população contra a Igreja, como entendia que a alfabetização era um veículo para substituir a educação religiosa por uma educação cívica formatada em Lisboa. As ordens religiosas, que em muitos países foram fundamentais para criar uma rede de escolas, em Portugal não podiam sequer ensinar a ler durante a Monarquia constitucional. Ou seja, tínhamos na Igreja uma instituição que podia ter sido fundamental para a alfabetização da população e preferimos chamar tudo para a alçada do Estado, que não tinha recursos e, portanto, falhou.
Foi por um excesso de Iluminismo que se produziu o obscurantismo.

Portugal foi um país que nunca estimulou os homens livres. Pelo contrário, sempre houve uma tendência para ricos e pobres se encostarem ao Estado. Porquê?

Uma explicação para isso tem a ver com a dimensão ultramarina de Portugal, que permitiu que o Estado se soltasse da sociedade. O Estado não necessitava de cobrar impostos nem de estimular o desenvolvimento, pois os proventos não lhe vinham da metrópole mas da pimenta das Índias ou do ouro do Brasil. Isso criou um poder político centrado em Lisboa, transformada quase em cidade-estado onde tudo se passava, à margem de um interior rural e pobre com que ninguém se preocupava. E quem queria pertencer à elite tinha de vir para a Corte. A nossa aristocracia, ao contrário da aristocracia inglesa ou da aristocracia prussiana, não era terratenente, vivia de rendimentos públicos. Houve sempre um Estado maior do que o país e do que a sociedade devido à realidade ultramarina. Quando se perde o Brasil, passamos a ter um Estado que desconfia da sociedade, que acha que ela não se sabe governar. Encontramos essa mentalidade nos liberais, nos republicanos e nos salazaristas. Todos entendem que têm a missão histórica de arrastar a sociedade para o que entendem por bem comum. Lutam os liberais e os republicanos contra uma sociedade que vêem como tradicionalista e reaccionária, lutam os salazaristas contra uma sociedade que vêem como individualista e anárquica.

Todo esse discurso aponta para um momento de corte, como se houvesse um Portugal do Antigo Regime e um Portugal pós-Revolução Liberal. É isso?

Sim, e esta é porventura uma das novidades desta "História de Portugal" para alguns leitores: a grande revolução em Portugal nos últimos 200 anos foi a Revolução Liberal, foi aquela que mudou realmente o mundo político e cortou todas as pontes com o passado.

Mais importante do que o 5 de Outubro?

A implantação da República é um detalhe quando a comparamos com o que significou a Revolução Liberal. Há um país antes de 1820, ou mais exactamente antes de 1832-34, e outro depois. Na República não mudam os paradigmas, com o triunfo da Revolução Liberal mudou tudo na relação dos portugueses com o Estado. Como disse Almeida Garret, foi nessa altura que um Portugal Velho acabou e começou um Portugal Novo. Todas as instituições, algumas delas seculares, desapareceram. Até acabou a velha relação das pessoas com a terra, que não correspondia à ideia de propriedade individual e absoluta dos dias de hoje. O mapa dos concelhos é todo alterado, na prática destruiu-se um poder municipal que vinha desde o nascimento do país. É também então que começa realmente a separação de poderes. Mas a "maior revolução social da história portuguesa", como se lhe referiu Alexandre Herculano, também destruiu as condições para um equilíbrio entre o Estado e a sociedade que permitisse a modernização, no contexto de uma sociedade tradicional que vai evoluindo sem destruir.

1832-34 é o nosso 1789, a nossa "revolução francesa"?

Oliveira Martins foi o primeiro a dizê-lo. O Portugal Velho acabou de uma maneira abrupta, violenta, com uma guerra civil, tornando inviáveis todos os arranjos que estavam implícitos na Carta Constitucional. A possibilidade de uma evolução à inglesa, em que houvesse sempre os pólos de poder alternativos e concorrentes ao Estado de que falava Tocqueville, desapareceu também nessa altura. Outro aspecto que sublinhamos, e que muitas vezes foi desvalorizado, é a importância da questão religiosa, que não teve a ver com poderes ou determinismos económicos mas derivou de haver muita gente que estava disposta a matar ou a morrer em defesa da Igreja, tal como outros estavam dispostos a matar ou a morrer em defesa do anti-clericalismo.

O Estado, além de criar a nação, também a homogeneizou. Isso passou pela integração de um Sul que era sobretudo muçulmano e tinha uma forte presença judaica. Ora se os judeus são bem acolhidos em Portugal na Idade Média, depois acabam por ter de fugir ou de se converter. Nesse momento a homogeneização não funcionou contra uma das possibilidades que o país tinha de ser menos pobre?

Uma coisa é a violência da expulsão, a violência da Inquisição contra os cristãos-novos, outra coisa é pretendermos encontrar factos que, só por si, expliquem a nossa história toda, e todas as nossas dores, desde D. Afonso Henriques até José Sócrates. Sem dúvida que o país perde na altura parte da sua elite, mas a Inglaterra também a tinha perdido quando dois séculos antes expulsara os judeus e nunca ouvi nenhum historiador inglês queixar-se disso. Penso que para analisarmos certas situações contemporâneas é melhor não nos socorrermos de factores demasiado ancestrais. No nosso passado há de tudo, quer esses momentos de intolerância, quer uma época mais pluralista. E mesmo a tolerante Inglaterra conheceu períodos de uma intolerância gigantesca no século XVI, com terríveis perseguições religiosas.

Ou seja, não temos de ir buscar à História ou à Economia razões para defender a tolerância religiosa e o pluralismo - devemos defendê-la porque é a atitude correcta. A história não deve ser um arsenal ideológico para justiçar esta ou aquela opção actual. E esta é uma "História de Portugal" feita por historiadores que procuram explicações limitadas ao contexto das diferentes épocas e integrando a perspectiva dos contemporâneos.

Lemos esta "História de Portugal" e, no fim, podemos ficar com uma ideia do que é a identidade nacional? Há uma identidade nacional?

Há uma identidade portuguesa a que os portugueses são sensíveis.

Uma identidade pela positiva ou uma identidade contra: "contra Castela", "contra os reinos mouros"?

Todas as identidades são construídas contra: somos alguma coisa porque não somos outra coisa que existe ao lado. Quando falamos, a propósito de história, sobre o que é a nossa identidade, não é a identidade negativa - somos portugueses porque não somos espanhóis - que perturba: o que perturba é interrogarmo-nos sobre o nosso destino. Houve muitas tentativas de criar uma identidade providencialista, sebastianista, houve um discurso sobre os portugueses estarem destinados a criar o Quinto Império. Com o salazarismo, éramos o povo capaz de criar sociedades luso-tropicalistas, na Expo-98 fomos os pioneiros da globalização... É por não encontrarmos hoje uma "missão" que também surge, muitas vezes, o discurso da decadência. Ora o que esta "História de Portugal" nos mostra é que os portugueses foram portugueses de várias maneiras. Temos uma longa história comum e expressamo-nos na mesma língua, o que é muito importante pois uma língua é também uma visão do mundo.

O que quer dizer que...

Portugal nunca teve um problema de identidade como outros. Nunca houve alternativas diferentes da que foi sendo gerada pelo poder político. Nunca existiram, por exemplo, identidades regionais fortes e houve uma homogeneização religiosa - os muçulmanos desapareceram, os judeus foram obrigados a converter-se -, sendo que a religião nunca foi um factor de separação face aos nossos vizinhos. Mesmo hoje não temos grandes comunidades de outras religiões ou de outras etnias para que possamos, verdadeiramente, testar aquele lugar-comum de que os portugueses não são racistas.

O que é que alguém que queira pensar Portugal hoje pode retirar desta História?

Pode perceber que Portugal não começou ontem, que existem condicionantes que vêm do passado, pode até verificar que algumas soluções já foram tentadas no passado, como os programas desenvolvimentistas de obras públicas, e que não deram resultado. Mas a história também é importante para percebermos a nossa inerradicável pluralidade. Não permite um discurso uniformizador sobre "o português"...

Então livros como "O Medo de Existir", de José Gil, não fazem sentido...

Tenho sempre uma enorme dificuldade em compreender as obras que passam por uma antropomorfização de Portugal, como se Portugal estivesse ali ao lado sentado a tomar café. Há dez milhões de portugueses, logo há dez milhões de maneiras diferentes de se ser português. A alternativa a esse discurso é uma História de Portugal que não procura uma explicação filosófica geral. Temos muitas coisas comuns, mas o fado é de Lisboa e o vinho verde tinto é do Norte Litoral. Não tentemos esconder a pluralidade nem substituí-la por uma qualquer leitura secular do velho providencialismo divino.

sexta-feira, janeiro 29, 2010

Com o patrocínio de Ambrose Bierce

O Sr. Marinho Pinto deve ter algures, no quarto, um quadro com a inscrição "Magistrado: funcionário judicial com uma jurisdição limitada e uma incapacidade desmedida". Mas devia pendurar outra: "Advogado: indivíduo com jeito para contornar a lei". E, já agora, que se faz tarde, esta: "Pateta: uma pessoa pouco elegante e com uma tendência excessiva para tropeçar nos próprios pés".

segunda-feira, janeiro 25, 2010

Damn you all

Eu quero ver quem é que se vai atrever a não incluir este espantoso disco na lista dos melhores de 2010.


Eu quero ver quem é que se vai atrever a não incluir este espantoso disco na lista dos melhores de 2010.

quinta-feira, janeiro 21, 2010

Mon coeur

Encontrei

Quando escrevi isto, julgava ter perdido isto:


Hoje, encontrei-o. I will cherish it till I die.

O bom, o mau e o melhor

O subvalorizado:




O sobrevalorizado:




O melhor:

A ver vamos...

quinta-feira, janeiro 14, 2010

The Taming of the Shrew

domingo, janeiro 10, 2010

Mais nada a acrescentar

Alberto Gonçalves in Diário de Notícias 10/01/2010

"O casamento entre pessoas do mesmo sexo é banal no mundo civilizado? É, se entendermos por "mundo civilizado" sete países e um pedacinho dos EUA. O casamento entre pessoas do mesmo sexo veio eliminar uma discriminação brutal? Sim, se admitirmos que uma restrição socialmente imperceptível equivale à escravatura ou às câmaras de gás. O casamento entre pessoas do mesmo sexo é a conquista de um direito fundamental? Claro, se hoje um "direito fundamental" for o "papel" desprezível a que a esquerda sempre reduziu o casamento tradicional. O casamento entre pessoas do mesmo sexo beneficia muitos necessitados? Com certeza: políticos com necessidade de desviar atenções, políticos com necessidade de parecer "modernos", anónimos com necessidade de erguer carreiras à custa de "causas", etc.

Dito isto, não acho que o casamento entre pessoas do mesmo sexo justifique o frenesim indignado de alguns. O medo de que o alargamento a homossexuais anule a alegada relevância do casamento heterossexual deriva do exacto equívoco em que os activistas gay incorrem: o de que o peso simbólico do matrimónio é definido pelo reconhecimento estatal, ou seja, por lei. Obviamente, não é, e não será um "papel" a convencer a sociedade de que um tipo de união é rigorosamente igual ao outro. Embora a formação ideológica da maioria dos integrantes dos movimentos gay os faça sonhar com um Estado absoluto e "padronizador", há quem viva no mundo real e compreenda que os costumes resistem a decretos. Os gays propriamente ditos, por exemplo.

Em Espanha, meia década após a legalização, realizaram-se menos de 20 mil enlaces homossexuais, e com tendência para diminuir a cada ano. Ou uns 99% dos gays locais não entendem que o casamento os proteja da discriminação ou não se sentem discriminados de todo. Por cá, teremos talvez mil ou duas mil bodas por geração, alvo de interesse decrescente dos media e, a prazo, da indiferença geral. Alheias a delírios publicitários, as restantes centenas de milhares de homossexuais prosseguirão as suas vidas. E nós faríamos melhor em prosseguir as nossas."

Mitos

Vasco Pulido Valente in Público 10/01/2010
A França, a Europa e as Pátrias

"É uma velha convicção dos políticos que um país só prospera e só se afirma com uma boa dose de nacionalismo. Esta ideia romântica (no sentido técnico da palavra) ainda não desapareceu, apesar do uso que Hitler, Mussolini e outros beneméritos fi zeram dela. A gente da minha idade ainda com certeza se lembra da obsessão com a ilusória “identidade portuguesa” depois do 25 de Abril e da perda das colónias de África. A esquerda até inventou que Portugal se tinha tornado numa “placa giratória” entre o Ocidente e o Terceiro Mundo. Os disparates não paravam. E continuam. Manuel Alegre, por exemplo, falou ontem no Expresso de um “Quinto Império cultural e da língua” e acha, muito seriamente, que os problemas da economia “não se resolvem, sem orgulho ou confiança no país”. Nada disto é extraordinário.

Extraordinário é que a doença se tenha pegado à França e que Sarkozy ande agora oficialmente à procura da “identidade francesa”. Verdade que desde o Grand Siècle (o século XVII), de uma maneira ou de outra, a França dominou a Europa. As “Luzes” foram, sobretudo, as “Luzes” da Enciclopédia e Voltaire, não as da Inglaterra ou da Alemanha, bem mais decisivas para o futuro. E a Revolução convenceu erradamente os franceses de que encarnavam e transportavam consigo os valores da humanidade. Nem a empresa napoleónica, uma empresa de conquista e rapina, os fez pensar duas vezes. Mesmo no século XIX, a França, regularmente vencida (ou com a vitória pírrica e partilhada da I Guerra), não deixou de se considerar, como dizia o outro, o “farol” do mundo. Nem sequer a humilhação de 1940 a desanimou. Em 1945, a “inteligência” indígena persistia em arengar a América, a África e a Ásia, com a autoridade espúria de mãe da liberdade. E era ouvida.

O Mercado Comum e a “Europa” que dele saiu acabaram pouco a pouco com este delírio. Mitterrand teve passageiramente um ou outro acesso de grandeur. Dali em diante, a França entrou na mediocridade que lhe competia. Já ninguém a levava a sério como consciência de serviço. Em certo sentido, a França fi cou no desemprego da História. A campanha de Sarkozy para redescobrir e reinventar a “identidade francesa” é um sintoma e o reconhecimento dessa definitiva queda. Mas, na prática,como é que se redescobre ou reinventa uma “identidade”? Até hoje há duas sugestões radicais: cantar A Marselhesa no princípio dos jogos de futebol e meter Camus (um semi-reformista e um semiliberal) no Panthéon (tirar e pôr pseudo-heróis no Panthéon sempre foi, de resto, um grande divertimento revolucionário). A União Europeia, para desgosto do dr. Soares, não passa de mito. Em compensação, para descanso do dr. Soares, a Europa das Pátrias não renascerá."

Não esquecendo a Viana do Alentejo

Miguel Esteves Cardoso in Público 10/01/2010
"O FUGAS é um potente aperitivo. O de ontem aliciava quem tenha a sorte de estar no Porto entre hoje e sábado, a instalar-se nas alturas do restaurante da Casa da Música, a apreciar os picos da cozinha vienense, preparados por um dos melhores chefes austríacos, Florian Ortner.

Dizem que esconde grandes segredos. Nenhum, porém, será tão difícil de explicar o hábito português de nos referirmos à capital austríaca como Viana de Àustria. É o meu primo que está a estudar piano em Viana de Áustria. É este bolo de chocolate feito com uma receita de um café em Viana de Áustria.

Esta semana estava a falar com um médico e quando me referi a um estudo publicado em Viena, ele procurou logo esclarecer: "Viena de Áustria?" Apetece logo responder "Não, Viena do Castelo" mas não se pode, porque o vício está enraizado. Não é só o facto de haver poucas Vienas à parte a de Áustria. Há uma Viena na Virgínia, nos Estados Unidos da América, mas é raro ouvir falar-se dela. Nem sequer o maestro Victorino d"Almeida a menciona.

É a força do nome da cidade. Alguém fala em Viena e nós, por magia, pensamos logo em Viena de Áustria. Não nos ocorre mais nenhuma. O refrão da canção de 1981 dos Ultravox "(It means nothing to me, oh)Vienna" perderia dramatismo se tivesse de acrescentar of Austria.

Só nos resta agradecer que a precisão não se alastre a outras grandes cidades: "Comprei este lenço em Londres da Inglaterra mas ele foi feito em Roma de Itália".

Obrigados!"

sábado, janeiro 09, 2010

Os putos voltaram

domingo, janeiro 03, 2010

Estado

José Manuel Fernandes, in Público 03/01/2010

Salvar o país deste Estado, e o Estado deste governo

"Ontem de manhã fui ao Portal do Governo, abri um por um os perfis profissionais de todos os membros do Governo, e confirmei uma suspeita: nenhum deles trabalhou a maior parte da vida no sector privado. A maioria nunca o fez. Alguns, poucos, exerceram vagamente a advocacia, mas há muito que não têm "escritório". Duas ministras terão ganho mais em direitos de autor do que com os proventos dos lugares que mantêm na administração pública. E até a "sindicalista" nunca trabalhou numa empresa, começou logo como funcionária da UGT. Considerando o conjunto dos ministros, o número total de anos passados no Parlamento ou em gabinetes ministeriais não deve ser muito diferente do acumulado a dar aulas em universidades públicas.

Perguntar-se-á: mas porquê a minha suspeita? E será que podemos tirar alguma ilação desta constatação? Na verdade não há mal intrínseco em se ter feito toda a carreira no sector público. Nem de tal se pode tirar qualquer ilação, sobretudo se pensarmos nos que dão aulas nas universidades. Contudo...

Contudo estamos perante um sinal dos tempos: o melhor (?) que o país foi capaz de produzir para depois lhe entregar a responsabilidade de o governar foi um grupo de quadros que nunca correu os riscos associados à actividade privada e sempre cresceu no ambiente protegido - mesmo que nem sempre glorioso - da administração pública. Sucede com este Governo, como poderia suceder com um governo liderado pelo PSD, talvez com pequenas nuances, e não deve surpreender ninguém: o sonho da maioria dos portugueses é, há décadas, há séculos, acolher-se no regaço protector do Estado. De preferência como seu servidor, se necessário como seu subsidiado.

Acontece que isto tem causas e consequências. As raízes desta maneira de ser mergulham na nossa muito particular história como povo e uma delas resulta bem evidente quando lemos a nova História de Portugal, coordenada por Rui Ramos. No texto que escreveu para a apresentação da obra, António Barreto não deixou de a destacar: "A omnipresença de um Estado que desempenhou todos os papéis, o de inovador e o de conservador, o de revolucionário e o de reaccionário, o de motor e o de obstáculo ao desenvolvimento, o de abertura e o de fecho ao mundo exterior, o de déspota e o de liberal. Parece que quase tudo começou e acabou no Estado. Conquista e reconquista, expansão e retracção, instrução e obscurantismo foram obra de um Estado que pouco espaço deixava para a sociedade de classes, grupos e homens livres e independentes."

Se assim foi desde a fundação da nacionalidade - "foi o Estado, isto é, o poder político organizado ou em vias de organização, que criou a nação, o que durou séculos", notou também António Barreto - dificilmente poderia deixar de ser hoje. Dificilmente poderia de ter hoje um peso ainda maior do que no passado, e nem devemos começar por falar da economia para o sublinhar. É verdade que, como ainda na sua mensagem de Ano Novo recordou o Presidente da República (que, como ex-primeiro-ministro, é um dos responsáveis pela situação), "Portugal tem já um nível de despesa pública e de impostos que é desproporcionado face ao seu nível de desenvolvimento", mas isso também sucede com outros países. O nosso problema é mais grave e mais fundo.

O nosso problema é que temos cada vez mais governo no Estado - e quando falo de governo, também incluo as autarquias regionais e locais - e cada vez menos sentido de Estado no Estado. A omnipresença da mão que tudo condiciona, ou mesmo tudo controla, agravou-se muito nos últimos anos, sob a batuta dos executivos de Sócrates, mas é um mal que vem detrás.

Vinte anos depois de termos iniciado o processo de privatizações, o número de empresas públicas - e dos gestores que por elas circulam - é muito maior. Dos hospitais EPE às empresas municipais. Trinta e cinco anos depois do 25 de Abril não se concebe que um alto quadro da administração pública não seja de "confiança política", tendo desaparecido por completo o espírito de lealdade independente e competente nos altos lugares da administração. Catorze anos depois de Guterres se ter entusiasmado com a reacção positiva dos mercados à sua vitória eleitoral, os dedos de uma só mão chegam para contar as empresas cotadas no PSI20 cujo destino (e até cuja cotação) não dependa, em maior ou menor grau, das suas relações com o Governo.

Por fim, cinco anos depois de Sócrates ter chegado ao poder graças a um acidente da história, são cada vez mais raros os concursos públicos e cada vez mais comum a negociação directa entre o poder e os empresários para "ajustarem", na ausência de um ambiente competitivo, negócios de todas as dimensões - a arbitrariedade começou com os PIN (Projectos de Potencial Interesse Nacional), que permitiam contornar a lei por decisão discricionária de um ministro, é hoje moeda comum quer se trate da adjudicação do Magalhães, da do Terminal de Alcântara, das concessões das barragens ou das obras de recuperação do parque escolar.

É triste, é trágico, escrevê-lo, mas o nível de discricionariedade - a nível central, a nível regional e a nível local -, associado à correspondente subserviência (e também à corrupção) não tem paralelo na história recente de Portugal, pois até antes do 25 de Abril havia mais respeito por certas regras. Quanto mais não seja porque havia mais pudor - agora qualquer vestígio de pudor é rapidamente sacudido em nome da "legitimidade democrática".

Podemos ter mil conversas tecnocráticas sobre o "programa" para tirar Portugal de crise e nos reaproximar da Europa, que serão inúteis. O nosso problema, como tantas vezes no passado, é de liberdade e de responsabilidade. Em nome da liberdade derrubámos o anterior regime, em nome da liberdade acabámos coma tutela militar sobre o poder político, em nome da liberdade reprivatizámos a economia. Entretanto, esquecemos demasiadas vezes a responsabilidade e agora, em nome da democracia, do "voto do povo", querem limitar-nos a liberdade. É tempo de dizer "basta".

E será que não há aí ninguém capaz de assumir as consequências políticas deste diagnóstico? Talvez não, pois bem sei o que custaria fazê-lo: Portugal é o que é há muitos séculos."

sábado, janeiro 02, 2010

É

Vasco Pulido Valente, Público 02/01/2010

2010
"A primeira grande crise económica mundial - que começou em 1929 e foi durando até à II Guerra Mundial - trouxe consigo um terramoto político na Europa, na América e na URSS (a Rússia é outra coisa). Em França, houve uma Frente Popular; em Espanha uma Frente Popular e uma guerra civil; em Inglaterra um governo do Partido Trabalhista pela primeira vez chegou ao poder; na Alemanha caiu a República de Weimar e veio o nazismo; na URSS Estaline liquidou os kulaks e, para grande admiração da "inteligência" ocidental, espremeu da fome e do terror a industrialização forçada; e até na América Roosevelt se atreveu a tomar algumas medidas pretensamente "socialistas", que puseram em transe o "liberalismo" indígena. Pelo mundo inteiro - ou pelo que naquela altura se julgava "o mundo inteiro" - pareceu soprar um vento (irresistível?) de mudança.Era o tempo da "esquerda" ou, mais precisamente, da "esquerda revolucionária", uma sopa turva com que a minha geração ainda cresceu e mesmo, por causa do "25 de Abril", uma ou duas camadas de gente mais nova. Como é óbvio, o colapso do "socialismo real", o descrédito do marxismo enquanto doutrina e teoria e a "normalização" do Estado-Providência acabaram com tudo isso. Agora alguns patetas, que devem ter dificuldade em encontrar a cabeça com as duas mãos, protestam inteligentemente contra os "tremendistas". O dr. Mário Soares (sempre uma alegria) chora dia a dia a "Europa" perdida (ou desencaminhada) e reza aos santinhos da sua desesperada devoção como Lula e Obama. E, segundo consta, uma facção lírica à fado de Coimbra continua ao vento à procura do pensamento.

Mas, de qualquer maneira, um facto é certo: a crise de 2008 não produziu uma ideia. Basta ver Portugal. O Estado apodrece, como sempre historicamente apodreceu, com o défice do orçamento e a dívida externa. O regime político está paralisado e desliza pouco a pouco para o grotesco. O PSD não passa de um grupinho de coscuvilheiras, sem vergonha ou emenda. E o PS serve um optimismo lorpa a uma populaça céptica. Nem um arrepio perturbou a inanidade da nossa vida pública. A reorganização da direita? Qual quê? A reforma da esquerda? Nem pensar. Afinal, a julgar pela placidez da populaça e a resignação da classe média, a crise não existe. Como, de resto, se constatará em 2010. Não é?"
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