(ordem das perguntas: aleatória)
- Como avalia, a esta distância, a sua governação a partir de 2008, nomeadamente o conjunto de medidas que pôs em prática em 2009?
a) Eram medidas fundamentais para que Portugal aguentasse a crise - em linha, aliás, com as indicações das instituições europeias e em linha com a nossa aposta no investimento público e no Estado Social. Foram medidas que tiveram um impacto muito positivo nesse ano e nos anos subsequentes. Keynes ensinou-nos isso: medidas em contraciclo. Se não tivessem sido postas em prática, teria sido pior. Além disso, ninguém sonhava com o que veio a acontecer em 2010 e 2011. Aconteceu o impensável. O mundo mudou. Tudo o que fiz, foi bem feito, na boa-fé e sempre apoiado pelas instituições europeias e pelos melhores economistas;
(1 ponto)
b) Foi a receita ditada pelas instituições europeias e defendida por alguns economistas, para fazer frente à crise internacional. Concordámos com essa opção, embora hoje perceba que deveríamos ter sido mais cautelosos, tendo em conta, aliás, a incerteza do impacto da crise do ‘subprime’, o crescente nível de endividamento do país e as consequências para as contas públicas;
(2 pontos)
c) Confesso que houve um misto de excesso de voluntarismo, de ingenuidade e de eleitoralismo na forma como conduzimos as coisas em 2009. Não nos podemos esquecer que era ano de eleições. Seria impensável deitar tudo a perder com um discurso mais realista, leia-se pessimista, e com medidas que poderiam arrefecer a economia. Estávamos a gerir expectativas e disseram-me que havia folga. Hoje, lamento não ter tido mais coragem para travar o caminho do desequilíbrio orçamental e do endividamento, mas há que reconhecer que considerações retrospectivas são sempre mais fáceis de fazer do que considerações prospectivas.
(3 pontos)
- Acha que o PEC IV teria salvado Portugal do pedido de resgaste?
a) Claro que sim. O PEC IV era a solução. Era a única saída para evitar um pedido de resgate. Com ele, a confiança dos mercados seria restabelecida paulatinamente e o financiamento da economia estaria assegurado, a taxas de juro sustentadamente baixas. O governo foi traído. Portugal foi traído pelos partidos da oposição. Hoje estaríamos numa situação confortável;
(1 ponto)
b) Não posso ter a certeza, como é óbvio, mas acredito que teria sido possível. Teria sido difícil, é certo. E teria de ter passado por uma estratégia de aproximação ao PSD, forjando uma espécie de pacto de regime com o beneplácito do PR. Mas as condições políticas eram péssimas. O ambiente não era de consensos, em parte por culpa nossa, em parte por culpa da oposição e do PR. As posições extremaram-se. O ambiente era de cortar à faca. Basta lembrar o discurso de posse do PR. Ninguém teve a necessária clarividência para pôr termo à escalada de antagonismos. Tive pena que não se tivesse aprovado o PEC IV. Quem sabe como estaríamos hoje?
(2 pontos)
c) Naquela altura, estava convencido que sim. Hoje, estou mais inclinado para dizer que não. Teríamos adiado a coisa, por uns meses, mas tendo em conta a convulsão nos mercados, o comportamento dos nossos principais indicadores económicos, o clima político que se vivia, ao PEC IV seguir-se-ia o V, o VI, o VII… Mais tarde ou mais cedo, deixaria de haver condições para insistir nos paliativos, sem acudir seriamente às doenças – a súbita e a crónica. O problema português era e é um problema estrutural, que a crise internacional agudizou e escancarou. Um problema estrutural que nunca foi atacado convenientemente pelos governos, incluído o meu e, já agora, incluindo o presente. O dinamismo, a vitalidade e a capacidade produtiva de uma economia, não se reinventam num ano ou em poucos meses. Os credores não se convencem com retórica e com medidas pontuais, desgarradas ou meramente contabilísticas. Seria uma questão de tempo até ao pedido de resgaste.
(3 pontos)
- Há a suspeição de que viveu em Paris acima das suas possibilidades, ou seja, que terá adoptado um padrão de vida incompatível com o nível de riqueza que um ordenado de primeiro-ministro supostamente deixa acumular, ao fim de seis anos. Quer comentar isto?
a) É uma tentativa de assassinato de carácter, de achincalhamento. Trata-se de um exercício de maledicência inaceitável. Só revela o quanto as pessoas são vis e a forma como alguns elementos da oposição insistem nas campanhas negras. Irei apresentar queixa contra toda e qualquer pessoa que levante publicamente esse tipo de insinuações. Entendo que o meu bom nome foi posto em causa;
(1 ponto)
b) São insinuações sem qualquer fundamento. Vivi com base em algumas economias pessoais e com a ajuda da minha família. Eu não nasci para o mundo em 2005. Fui secretário de Estado e ministro, prestei serviços de engenharia. Por outro lado, em Paris fiz uma vida simples, sem luxos, tentando controlar os gastos. Aceitei, recentemente, um cargo numa empresa farmacêutica porque preciso de ter um meio de subsistência, como qualquer mortal;
(2 pontos)
c) Vivo como posso, com base nos meus recursos e nos recursos da minha família. Não tenho mais nada a acrescentar.
(3 pontos)
- Acha que a sua ida para Paris contribuiu para que a sua imagem, aos olhos dos portugueses, saísse prejudicada?
a) De maneira nenhuma. Os portugueses conhecem-me e sabem o quão triste e amargurado fiquei após o acto eleitoral. Os portugueses perceberam o quão traído me senti, e compreenderam a necessidade de recato e de introspecção. E os portugueses sabem que existe, de há uns anos a esta parte, uma campanha orquestrada para denegrir a minha imagem. Tenho sido, invariavelmente, vítima de uma trama infame. Estivesse eu em Lisboa, Paris ou Vilar de Maçada;
(1 ponto)
b) Penso que não. Não há razões para isso. A sua pergunta não faz sentido, até porque as pessoas são livres de circular. Sou um cidadão como outro qualquer;
(2 pontos)
c) Retirando da equação os casos de má-fé ou de ódio puro à minha pessoa, sou capaz de compreender a posição dos que acharam estranho a minha ausência, ou observaram a minha ida para Paris como uma espécie de fuga. Não sou, nem era, na altura, um cidadão qualquer. Estando de consciência tranquila, devia ter explicado e defendido as minhas opções políticas após as eleições, de forma firme mas igualmente de forma serena, fossem quais fossem as vozes. Devia ter tido mais em conta o princípio da mulher de César. Não se tratava de «ficar por aí», mas de ponderar e perceber que fui primeiro-ministro de Portugal e, para todos os efeitos, o país acabou por pedir um resgate no meu mandato. Reconheço, hoje, que o meu silêncio não favoreceu a minha imagem.
(3 pontos)
- De 0% a 100%, que grau de responsabilidade atribuiria à sua governação para o estado a que chegou o país, ao ponto de ter de pedir um resgaste?
a) 0%. Não tivemos, obviamente, culpa. Fomos apanhados por uma crise internacional que não pedimos e para a qual nada contribuímos. Foi um problema sistémico. As coisas estavam controladas. O investimento público estava a dar os seus frutos. Portugal estava no bom caminho. Um caminho só interrompido por uma mentira e por um desejo cego de poder por parte da oposição. O PEC IV teria sido o instrumento ideal para atravessar esta crise, até que a Europa e as suas instituições adoptassem um sistema de mutualização das dívidas soberanas e um mecanismo de solidariedade pro-activo entre Estados, para salvar o Euro e as economias da especulação dos mercados e das agências de rating. Fiz o meu melhor, sendo que o meu melhor era o melhor para o país;
(1 ponto)
b) Não gostaria de abordar o tema dessa forma. Não há aqui culpados. Foram as circunstâncias. Melhor: foi a confluência de uma série de factores, grande parte deles alheios à nossa vontade. O que aconteceu em Portugal, aconteceu um pouco por todo o lado. Interessa, agora, olhar para o futuro e debater o que fazer;
(2 pontos)
c) Não sei responder a isso, de forma totalmente objectiva. Tivemos a nossa parte de culpa, como é óbvio. Ninguém, ao fim de seis anos de governação, pode chegar ao fim e dizer “não tive nada que ver com isto”. Uma parte da crise portuguesa veio de fora, foi importada. Esta é a parte que diz respeito ao problema do financiamento da economia portuguesa. Mas o comportamento dos mercados (e das agências de ‘rating’), não foi gratuito. Em bom rigor e em consciência, não posso deixar de reconhecer que trilhámos uma trajectória de endividamento que nos foi fatal, do ponto de vista da credibilidade e da confiança dos mercados. Fomos teimosos e tentámos, a certa altura, fazer omeletes sem ovos. O stock da dívida do Estado em função do PIB cresceu para níveis perigosos e o défice disparou a partir de 2009. Durante os anos da minha governação, a dívida pública aumentou em mais de 90%. Em 2004, o Estado devia, por português, qualquer coisa como 8.500 euros. Em 2011, já estávamos em 16.500 euros, fora PPPs. Economias mais fortes, mais dinâmicas, aguentam melhor esses desequilíbrios, sejam eles propositados (para fazer frente a crises) ou de natureza exógena. Não era o caso de Portugal. Como referi, a crise portuguesa foi agudizada por essa falta de resiliência, fruto de deficiências de ordem estrutural. Se me perguntar se ajudei a reformar o país, digo-lhe que sim, que ajudei. Tenho muito orgulho, por exemplo, no que fiz entre 2005 e 2007. Mas podia ter feito mais e melhor. Devia ter corrido menos riscos, já que estes pagam-se. Por exemplo: acho que perdi muito tempo e energia com o fogo fátuo de alguns programas e projectos públicos marcadamente propagandistas. Relaxei na contenção de gastos a partir de 2008. Não me desviei um milimetro do comportamento dos governos portugueses, de proteger algumas posições monopolistas de certas empresas-bandeira. E chutei para a frente encargos para o Estado, através das PPPs. Mas não é menos verdade que falar depois, é sempre fácil. Assim como foi fácil falar em «menos sacrifícios» e em «cortar as gorduras do Estado», como o fez Pedro Passos Coelho em 2011, para justificar o chumbo do PEC IV.
(3 pontos)
- Como avalia a prestação do secretário-geral do PS, António José Seguro?
a) Está a fazer um excelente trabalho, dou-lhe os meus parabéns e faço votos para que continue pleno de combatividade, como até agora. Parabéns!
(1 ponto)
b) Qualquer que fosse o secretário-geral do PS após as eleições de 2011, não teria pela frente uma tarefa fácil. António José Seguro tem feito o possível, embora reconheça que tem andado um pouco apagado. Hoje tem a vida mais facilitada, tendo em conta o nível de insatisfação da população portuguesa. Talvez pudesse ter ido mais além no que respeita a propostas alternativas concretas;
(2 pontos)
c) Só quem está no exercício do cargo sabe o que tem pela frente. É uma gestão que lhe pertence. Não me cabe, por isso, avaliar a prestação de António José Seguro, tendo estado, ainda por cima, longe do país. António José Seguro é o secretário-geral do meu partido. Ou seja, é também o meu secretário-geral. Nada tenho mais nada a acrescentar.
(3 pontos)
- Porque decidiu voltar ao espaço mediático?
a) Porque está na hora de limpar o meu nome e de evidenciar o que já todos perceberam: eu tinha razão. Se ninguém o faz por mim, serei eu a fazê-lo. Chega de mentira e de farsa. Além disso, está na hora de arregimentar as minhas tropas, tomar conta do partido e reganhar o poder. Portugal precisa de mim;
(1 ponto)
b) Agora que terminei o curso, tive condições para aceitar o convite que me foi endereçado, com a condição de não ser remunerado. Entendo que tenho algo a dizer sobre o que se está a passar no meu país. Julgo que devo explicar o que fiz e o que faria agora, se estivesse no governo;
(2 pontos)
c) Como sabe, fiz comentário político durante vários anos. Agora que me afastei da política activa, embora com base na experiência adquirida no exercício de cargos governativos, entendo que posso dar algum contributo para a análise da realidade política portuguesa e europeia, de forma desassombrada, sem qualquer outra ambição.
(3 pontos)
- Na altura da negociação do Memorando de Entendimento, afirmou, perante as câmaras, que tinha alcançado um bom acordo. Ainda pensa assim?
a) Sim. Graças à nossa capacidade de negociação, alcançámos um bom acordo. Repare que o Memorando é o PEC IV. O problema é que, o actual governou, desvirtuou o Memorando. Quis ir para além do Memorando. Quis ir para além do PEC IV;
(1 ponto)
b) Dadas as circunstâncias, foi um bom acordo. Foi uma espécie de PEC V, ou seja, o Memorando continha o PEC IV, mais um conjunto de medidas de carácter mais estrutural e com um alcance mais duradouro;
(2 pontos)
c) Foi o acordo possível. Esperava condições mais gravosas, pelo que acabei por dizer que tinha sido um bom acordo. Provavelmente, não o devia ter dito, daquela forma, até porque o impacto do acordo era, à data, imprevisível. Foi, como disse, o acordo possível. Um pedido de resgaste não se faz sem contrapartidas, sem medidas de ajustamento, invariavelmente dolorosas.
(3 pontos)
- Que leitura faz da governação de Pedro Passos Coelho?
a) Um desastre. Motiva-o a ideologia. Tanto o primeiro-ministro, como o ministro das Finanças, olham as pessoas como números: descartáveis, dispensáveis, elimináveis. Foram, aliás, muito para além do Memorando. E insistem em ser os bons alunos, quando deviam ter logo, em 2011, renegociado algumas condições, e adiado outras, para ganhar tempo. Ganhar tempo teria sido a chave, enquanto íamos recebendo as tranches do empréstimo. Mas não, o programa deles é outro: acabar com o Estado Social, privatizar as áreas da educação, da saúde e da segurança social. São extremistas, gente perigosa que se recusa a ver o sofrimento que está a infligir com o seu neoliberalismo radical;
(1 ponto)
b) Negativa. Com o desemprego a este nível, pouco mais há a dizer. Este governo enfiou Portugal numa espiral recessiva. Hoje estamos pior que há dois anos. Estamos a insistir nos erros que nos conduziram até aqui;
(2 pontos)
c) Percebo que as metas impostas no memorando impunham medidas cegas, de natureza contabilística, na busca da décima ou do ponto percentual. Cortar salários ou pensões, é cortar despesa pelo lado mais fácil, atacando indiscriminadamente tudo e todos. Mas dificilmente poderia ser de outra forma. Provavelmente faria o mesmo. O memorando estabelecia prazos quase inexequíveis. O tempo era escasso e, sendo escasso, implicava medidas desta natureza. Para além de outros erros que possamos apontar, o que é imperdoável nesta governação é a incapacidade de perceber que as medidas fiscais preconizadas para 2013, iriam empurrar o país para uma profunda recessão. Uma coisa é tentar ir ao encontro das metas do Memorando, outra é insistir num caminho que, está provado, nos afasta dessas metas.
(3 pontos)
- O que acha das petições que foram lançadas contra a sua presença na televisão, e a manifestação que foi montada lá fora, para o impedir de participar nesta entrevista? Acha que está a ser julgado?
a) Um nojo e uma vergonha. O senhor já se pôs no meu lugar?! É gente sem escrúpulos, sem princípios, que não sabe viver em democracia;
(1 ponto)
b) Confesso que não gostei. São atitudes que reflectem uma visão deturpada e perigosa da vida em democracia. Quem não se sente, não é filho de boa gente;
(2 pontos)
c) As pessoas são livres de se manifestar. Estamos em democracia. E é aquela frase “os actos ficam com quem os pratica”. Para além disso, quem ocupa cargos de poder, tem de ter estofo para este tipo de coisas. São os ossos do ofício. Respondendo à sua segunda pergunta, não acho que esteja a ser julgado. Fui julgado, em 2011, pelos portugueses, nas eleições. Não tenho mais nada a acrescentar.
(3 pontos)
AVALIAÇÃO
- Até 10 pontos: não aprendeu rigorosamente nada;
- Entre 11 e 15 pontos: há alguma esperança;
- Entre 16 e 25 pontos: Paris fez-lhe bem;
- Entre 26 e 30 pontos: temos homem!