O MacGuffin

quarta-feira, agosto 11, 2004

INTERROMPENDO OS “TRABALHOS INERENTES”…
Interrompo, novamente, os trabalhos “inerentes à mudança de poiso” para responder à excelsa blogger Inês.

Anteontem, a doce Inês alinhavou quatro alíneas para um comentário rápido sobre quatro blogues: três elogios e uma farpa. Um 3+1. Calhou-me, na rifa, a farpa. Presumi das palavras da Inês que me terei armado em presunçoso (vulgo «mete nojo») ao elevar à categoria de pecado, ou fraqueza intelectual, o ter-se gostado, um dia, das musiquinhas do George Michael.

Começo por dizer que a observação da Inês surgiu na pior altura: tinha saído, no Público, mais uma crónica do Fernando Iharco (FI). Para quem passou um dia inteirinho em trabalhos forçados "inerentes à mudança de poiso" (na figura de caixas e caixotes na sua grande maioria repletos de bugigangas que, vá Deus Nosso Senhor saber porquê, se guardaram), entremeados com a leitura horizontal, diagonal e vertical da crónica do Fernando Ilharco, convenhamos que é muito. Entendam-me: quem passa um dia inteiro a tentar perceber o que se esconde por detrás de verdades de La Palisse como ”Enquanto isso, na televisão o Iraque transformou-se numa escola de terrorismo e daqui até Novembro, até às eleições presidenciais norte-americanas, muito do que se espera e do que se não espera pode vir a acontecer.”; o que terá pretendido dizer FI com ”Numa tradição como a nossa, assente na diferença entre nós e os outros e entre isto e aquilo, o outro, o outro homem que não eu, é a um tempo o desafio do significado e a ameaça mais final. Numa tradição como a nossa que se construiu sobre os opostos, sobre os muitos dualismos - o pensamento-acção, a mente-corpo, a matéria-forma, os dados-informação, etc. -, todos eles catapultados pelo "penso, logo existo" de Descartes, não é de estranhar que meio mundo e outro tanto se sinta confuso ao experimentar um tempo, este Verão de 2004, que não é de guerra nem é de paz.”; por que razão FI ainda está na fase do ” Mais do que o despenhar dos aviões, a queda das torres gémeas no coração de Manhattan nunca vai poder ser explicada ou compreendida.”; por que razão insiste FI em fazer-se passar por Jack D. Ripper, ao ponto de escrever ”As coisas, em si mesmas, são o significado que tem no caudal imenso de tudo o que flui no presente, no passado e no futuro. Esse caudal é hoje a ordem global da informação, uma rede imensa de histórias e de eventos, assente numa dúzia de nós: a CNN, uma mão de impérios dos media globais, a finança e as Bolsas mundiais, as redes de telecomunicações, a Microsoft e os centros políticos do planeta, Washington, Londres, Nova Iorque, Pequim, de vez em quando, e pouco mais. (repararam no “de vez um quando”?)” ou, já a caminho do jackpot, “Nos jornais, nas rádios e na televisão, onde as noticias se misturam com a análise, os comentadores queixam-se: como fazer face, como dar um sentido ao imenso e constante caudal de informação gerado pela máquina planetária dos media?”; por que razão FI atribui «estranheza» à guerra (”Esta guerra que corre, a do terrorismo global, não é a primeira guerra estranha. Estranhas são todas as guerras, e são-no de duas formas diversas. A mais estranha dessas formas, impossível de aceitar pelo projecto da dignidade humana e do amor, da eternidade e da nossa união atemporal com Deus, é aquilo que é comum a todas as guerras: a legitimação da violência, o ceifar das vidas, a destruição num instante do que demorou vidas ou séculos a erguer”) e emudece relativamente à estranheza da «banalização» do terror e da morte levada à cena, diariamente, pelos mais diversos ditadores, milícias e grupos armados; quem passa, dizia, o dia em tão frenética actividade mental e física, a mais singela e inócua pergunta (“algum problema nisto, MacGuffin?”) acaba necessariamente elevada à categoria de uppercut com direito a projecção de pivot.

Afirmou a Inês que ”em tempos, deliciei-me com o Georgios Kyriacos Panayiotou” (o. m. q. George Michael), para, logo de seguida (e aí vem o punch) me perguntar: ”algum problema nisto, MacGuffin?”. Nenhum, cara Inês. Nenhum. Desde logo porque o “em tempos” é uma fortíssima atenuante. Depois, porque eu próprio carrego inúmeros esqueletos no meu guarda-fato. Basta lembrar, naquela que é uma confissão inédita neste espaço, que também "em tempos" me deliciei com a Kim Wilde. Por último, é tão problemático ter gostado "em tempos" do George Michael como ter sido acometido, enquanto teenager, por um surto de acne.

Agora, se me dão licença, volto aos “trabalhos inerentes…”.

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