O MacGuffin

segunda-feira, agosto 09, 2004

ESTÁ MAL, ABELHA
Interrompo os trabalhos inerentes à mudança de poiso para dar uma resposta à altura do maradona (um metro e setenta), sobre o papel e peso das letras na música pop. Devo, contudo, realçar que me dirijo a um (apesar de excelente) ser humano que, ainda não há muito tempo (seis, oito, dez aninhos), era fã de Bryan Adams e, pasme-se, George Michael – facto, aliás, que explica em grande parte a pouco importância por ele dada ao assunto (letras das canções).

Para defender a sua dama, o meu amigo maradona (com minúscula) recorreu a alguns argumentos de peso. Diz, por exemplo, que a letra do I Will Always Love You da Whitney Houston (um clássico otoverme) passava o teste caso levasse a roupagem de um qualquer tema dos Stereolab. Parvo é que ele não é: as canções dos Stereolab são musicalmente riquíssimas, por vezes, até, complexas. O exemplo é forte e o argumento parece sólido.

Afirma, a seguir, que “«indissociável» não significa que não exista predominância; mais: não significa que um dos termos não seja 'condição necessária mas não suficiente' (letra) e o outro condição estritamente necessária (música)”(sic), parecendo, desta forma, arrumar a questão.

Começo pelo fim. É absolutamente redundante dizer que a música é condição estritamente necessária. É mais ou menos o mesmo que dizer: se não houver música não há… música. Até porque há música dita «instrumental». Já canções sem música, não estou a ver (ou, neste caso, a ouvir). Risca-se, assim, este primeiro argumento.

Quando aqui escrevi que, nalguns casos (e dei alguns exemplos), a «letra é indissociável da música», não estava a insinuar que aquela predominava sobre esta. É isso mesmo: «indissociável» não significa que haja predominância. Nunca disse o contrário. Risca-se mais um.

Finalmente, faço minha a retórica do maradona. Imaginemos o Ian Curtis a cantar o Love Will Tear Us Apart com a letra do Brother Louie dos Modern Talking (enquanto lêem, tentem imaginar a linha melódica das músicas):

Dear, love is a burning fire
Stay, cause then the flames grow higher
Babe, don't let him steel your heart
It's easy, it's easy
Girl, this game can't last forever
Why ? Why can not live together
Try, don't let him take your love from me

You're not good, can't you see brother Louie, Louie, Louie
I'm in love set you free
Oh, she's only looking to me
Only love breaks her heart brother Louie, Louie, Louie
Only love's paradise
Oh, she's only looking to me


Lembram-se do There Is a Light That Never Goes Out dos Smiths? Agora a mesma música, a mesma voz, mas com a letra do (I Surrender) To The Spirit Of The Night de Samantha Fox:

I've got a secret I can't keep
That burns inside when I'm in my sleep
I try to hide from your memory
But you come back & it's haunting me
What will I find in this fantasy
If I go with me now will you set me free
And I surrender to the spirit of the night
I surrender (I surrender)
The darkness is my lover
And nights of pleasure
So I surrender (I surrender) to the spirit of the night


Estão familiarizados com a «linha melódica» do Suzanne de Leonard Cohen? A letra original começava assim:

Suzanne takes you down to her place near the river
You can hear the boats go by
You can spend the night beside her
And you know that she's half crazy
But that's why you want to be there
And she feeds you tea and oranges
That come all the way from China
And just when you mean to tell her
That you have no love to give her
Then she gets you on her wavelength
And she lets the river answer
That you've always been her lover
And you want to travel with her
And you want to travel blind
And you know that she will trust you
For you've touched her perfect body with your mind.


Substituam-na, se fizerem favor, com a letra de Do You Wanna Touch Me de uma tal de Joan Jett, mantendo a mesma «linha melódica»:

We've been here too long
Tryin' to get along
Pretendin' that you're oh so shy
I'm a natural ma'am
Doin' all I can
My temperature is runnin' high
Cry at night
No one in sight
An' we got so much to share
Talking's fine
If you got the time
But I ain't got the time to spare
Yeah
Do you wanna touch (Yeah)
Do you wanna touch (Yeah)
Do you wanna touch me there, where
Do you wanna touch (Yeah)
Do you wanna touch (Yeah)
Do you wanna touch me there, where
There, yeah
Yeah, oh yeah, oh yeah


Oh Yeah o caraças! Ou seja, nada do que o maradona escreveu contraria o meu ponto: depende. Ou seja: depende. Isto é: depende.

Agora, se me dão licença, estão ali umas caixas cheias de livros, cd’s, vhs’s e dvd’s a chamar por mim (e as minhas costas a implorar para que eu reconsidere).

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