Coisas que a Fernanda Câncio jamais perceberá
Vasco Pulido Valente in Público 04/04/2009
Fora o gordo (ou a gorda)
O Governo, como bom pai, mãe, tia, vigilante e polícia, anda preocupado com o nosso peso. Parece que mais de metade dos portugueses tem excesso de peso e que, pelo menos, 14 por cento são francamente obesos. Perante esta desgraça, o ministério respectivo (de certo animado pelo espírito inquieto do eng. e maratonista Sócrates) resolveu congeminar um "plano" contra a gordura. Dizem que dentro de um homem gordo há sempre um homem magro que sonha nascer. Pois respondendo a esse justo sonho, o Estado vai finalmente ajudar o parto da magreza indígena. Já este ano, cada um dos 68 agrupamentos de Centros de Saúde poderá contar com o seu nutricionista privado e próprio. Há hoje apenas 75 em exercício, não tardará, esperemos, que haja mais 500.
Se até agora o senhor, ou a senhora, por ignorância ou vício, passeava por aí a sua repugnante corpulência (ou, pior ainda, a mostrava na praia), daqui em diante assim que penetrar num Centro de Saúde será imediatamente conduzido a um nutricionista, que o porá numa dieta rigorosa e, em menos de nada, lhe arrancará a casca de adiposidade que preocupa a Pátria e o seu chefe. Pense que, depois de uma vida de erro e masoquismo, irá para o futuro comer e beber bem, por não mais - segundo juram especialistas do Porto - de quatro euros por dia; uma santa e simpática disciplina, aliás, muito apropriada à presente crise. Pense e rejubile. Imagine a sua pessoa elegante e bela e sobretudo esqueça que a mesa é uma prazer. A mesa não é um prazer, é, como oportunamente lhe explicarão, um puro suicídio.
Claro que o Estado não se dá a tanto trabalho só por altruísmo. O excesso de peso e a obesidade estão na origem de várias doenças, com que o Estado gasta dinheiro, e o Estado não deseja gastar dinheiro consigo. Por isso o Estado desejaria que o senhor, ou a senhora, não fumasse (e o persegue quando fuma) e não ingerisse muito sal (e lhe tirou o sal do pão) e se prepara pouco a pouco para o reduzir a um perfeito exemplar da espécie, destinado a morrer impecável e robusto numa extrema e acéfala velhice. Onde fica no meio disto a sua liberdade é melhor não perguntar. O Estado, que o trata e o educa, não se interessa pela sua liberdade. Uma liberdade que o senhor, ou senhora, se o deixarem à solta, usa com certeza mal. É preferível que o eng. Sócrates, que de resto o conhece bem, o meta na ordem. Ou julgava que a beneficência do Governo era de graça?
2 Comentários:
A "beneficiência" do Estado Português é como aquelas mães muito "preocupadas" mas sem práticas de pedagogia educativa:
quanto mais se preocupam com os meninos mais têm a sua vidinha facilitada ....
Sobre o título - ela perceber, percebe. Não pode é admiti-lo.
Por enquanto.
Já se viram espantos maiores.
Desusados e estrambólicos.
Aguardemos...
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