AINDA O CASO QUE "ABALOU OS ALICERCES DA DEMOCRACIA PORTUGUESA" *
O elaboradíssimo Pula Pula Pulga afirma ter ficado surpreendido com o que escrevi, a propósito do caso Marcelo. Fico, obviamente, estarrecido. Surpreender alguém - pela negativa, entenda-se – tira-me o sono. Mais ainda no caso do Pula Pulga, um portento de rigor e sofisticação, onde se praticam, paternalmente, exercícios de apreciação de outros blogues.
Cometi, de facto, um erro, quando arrisquei parafrasear Daniel Oliveira. Não posso exigir que elaborados como o Pulga percebam que, no embalo da paráfrase, tenha escrito “no Parlamento” e não “na AACS”. Lapso, erro, distracção, gafe, deslize, whatever: perturbei o mundo, e quiçá o sono, do aprimorado Pulga. É grave e peço, desde já, clemência.
Marcelo não foi, de facto, ao Parlamento. Nem vai precisar, aliás. O show que deu na AACS foi definitivo, pungente, «uma lição». Sobre a questão, e se o esmerado Pulga me der licença (desde já lhe peço que corrija o eventual lapso ou a acidental saloiice), acrescento alguns pontos:
1. A conversa entre Marcelo e Paes do Amaral foi uma conversa de amigos, de fim de dia, no “bar de um hotel” (como disse Paes do Amaral). Isso faz toda a diferença. É óbvio que os idiotas da objectividade dirão que não faz diferença nenhuma. Faz, e muita. Numa conversa de amigos - informal, despretensiosa, ligeira, na qual o à-vontade é a nota dominante – a latitude do tom e o conteúdo não podem ser extrapolados gratuitamente para outro contexto. No espaço de uma conversa de amigos, Paes do Amaral pode ter dito mil e uma coisas que, retiradas desse contexto, torcidas e distorcidas aqui e acolá, podem resultar num sentido erróneo e desvirtuado. Dou de barato que Paes do Amaral tenha dito “Épá, vê lá se te moderas, Marcelo” ou “Acho que estás a ser excessivamente acutilante” ou “Não sei se me agrada a ideia de ver a minha estação colado à imagem de estação bandeira da oposição ao governo”. Por esta altura já todos deviam estar lembrados do “’tou-me cagando para o segredo de justiça” de Ferro Rodrigues. Retirada do seu contexto e tornado publico o que era do foro privado, a frase caiu mal. Daí a dizer-se que Ferro Rodrigues é contra o segredo de justiça, vai uma enorme distância. É para mim claro que, no caso Marcelo vs Paes do Amaral, estamos na presença de um inqualificável e desleal aproveitamento por parte de Marcelo de uma conversa coloquial, intima, tentando transformá-la em «lei», não sem antes distorcer aqui, amplificar acolá, omitir ali.
2. Dito isto, Paes do Amaral tem, ou não tem, o direito de fazer aquele tipo de observações sobre os comentários de Marcelo? Será legitimo que o faça? É óbvio que sim. Para além de amigo, Paes do Amaral é o presidente de uma estação de televisão privada. Paes do Amaral tem o direito de achar que determinada actuação ou comportamento de um contratado seu se está a revelar contrário à orientação preconizada para a sua empresa de comunicação. Por exemplo, Paes do Amaral tem o direito de achar que a opinião de Marcelo - e é bom lembrar que estamos a falar de uma opinião pessoal (passe o pleonasmo), subjectiva, circunstancial, e não da Verdade por um Deus ex machina - beliscava a imagem de contenção ou reserva idealizada em relação ao poder político ou, se quiserem, contrariava uma eventual estratégia de não-afrontamento continuado e deliberado do governo. O «patrão» da TVI é livre de pensar e de julgar que a sua estação, como estação generalista, não pode pecar por excesso de abespinhamento contra o poder executivo – pelo menos não daquela forma. Paes do Amaral tinha, certamente, o à-vontade suficiente para tocar no assunto com Marcelo (afinal de contas, era seu amigo), sem que isso significasse «censura», «condicionamento», um «convite à sua saída».
3. Marcelo disse que Paes do Amaral lhe terá dito que as televisões estão condicionadas no exercício das suas actividades por dependerem da concessão de licenças atribuídas pelo Estado. Juntemos a isso o facto de haver muita publicidade do Estado e do para-Estado que tem o seu peso na estrutura de receitas de qualquer estação de televisão. São elementos importantes que podem explicar a conversa de Paes do Amaral com o seu amigo Marcelo Rebelo de Sousa. E são, certamente, elementos que não podem ser ignorados na apreciação que qualquer gestor/patrão faz do contexto onde a sua organização está inserida, bem como dos factores exógenos que condicionam a sua actividade.
4. Questão de fundo, e mais interessante, é a de se saber até que ponto, em Portugal, certas actividades privadas dependem, em excesso, do condicionamento (in)directo do Estado. Infelizmente sim. Mas mesmo assim, não devemos ser ingénuos e definitivos na forma como abordamos estas questões. Mesmo em sociedades caracterizadas aberta e indiscutivelmente pela liberdade de expressão (como é o caso da nossa), os «interesses» e as «estratégias de coabitação» com o «poder» fazem parte do jogo. Fizeram no passado e continuarão a fazer, no futuro. É assim em todo o lado. O que interessa assegurar está assegurado: os espaços de opinião não se esgotam na TVI. Nem na SIC. Nem na RTP. E por aí fora. Marcelo foi, é e continuará a ser livre de dizer o que bem entender. Escusava era de se armar em vitima.
* ouvido no Fórum TSF
Cometi, de facto, um erro, quando arrisquei parafrasear Daniel Oliveira. Não posso exigir que elaborados como o Pulga percebam que, no embalo da paráfrase, tenha escrito “no Parlamento” e não “na AACS”. Lapso, erro, distracção, gafe, deslize, whatever: perturbei o mundo, e quiçá o sono, do aprimorado Pulga. É grave e peço, desde já, clemência.
Marcelo não foi, de facto, ao Parlamento. Nem vai precisar, aliás. O show que deu na AACS foi definitivo, pungente, «uma lição». Sobre a questão, e se o esmerado Pulga me der licença (desde já lhe peço que corrija o eventual lapso ou a acidental saloiice), acrescento alguns pontos:
1. A conversa entre Marcelo e Paes do Amaral foi uma conversa de amigos, de fim de dia, no “bar de um hotel” (como disse Paes do Amaral). Isso faz toda a diferença. É óbvio que os idiotas da objectividade dirão que não faz diferença nenhuma. Faz, e muita. Numa conversa de amigos - informal, despretensiosa, ligeira, na qual o à-vontade é a nota dominante – a latitude do tom e o conteúdo não podem ser extrapolados gratuitamente para outro contexto. No espaço de uma conversa de amigos, Paes do Amaral pode ter dito mil e uma coisas que, retiradas desse contexto, torcidas e distorcidas aqui e acolá, podem resultar num sentido erróneo e desvirtuado. Dou de barato que Paes do Amaral tenha dito “Épá, vê lá se te moderas, Marcelo” ou “Acho que estás a ser excessivamente acutilante” ou “Não sei se me agrada a ideia de ver a minha estação colado à imagem de estação bandeira da oposição ao governo”. Por esta altura já todos deviam estar lembrados do “’tou-me cagando para o segredo de justiça” de Ferro Rodrigues. Retirada do seu contexto e tornado publico o que era do foro privado, a frase caiu mal. Daí a dizer-se que Ferro Rodrigues é contra o segredo de justiça, vai uma enorme distância. É para mim claro que, no caso Marcelo vs Paes do Amaral, estamos na presença de um inqualificável e desleal aproveitamento por parte de Marcelo de uma conversa coloquial, intima, tentando transformá-la em «lei», não sem antes distorcer aqui, amplificar acolá, omitir ali.
2. Dito isto, Paes do Amaral tem, ou não tem, o direito de fazer aquele tipo de observações sobre os comentários de Marcelo? Será legitimo que o faça? É óbvio que sim. Para além de amigo, Paes do Amaral é o presidente de uma estação de televisão privada. Paes do Amaral tem o direito de achar que determinada actuação ou comportamento de um contratado seu se está a revelar contrário à orientação preconizada para a sua empresa de comunicação. Por exemplo, Paes do Amaral tem o direito de achar que a opinião de Marcelo - e é bom lembrar que estamos a falar de uma opinião pessoal (passe o pleonasmo), subjectiva, circunstancial, e não da Verdade por um Deus ex machina - beliscava a imagem de contenção ou reserva idealizada em relação ao poder político ou, se quiserem, contrariava uma eventual estratégia de não-afrontamento continuado e deliberado do governo. O «patrão» da TVI é livre de pensar e de julgar que a sua estação, como estação generalista, não pode pecar por excesso de abespinhamento contra o poder executivo – pelo menos não daquela forma. Paes do Amaral tinha, certamente, o à-vontade suficiente para tocar no assunto com Marcelo (afinal de contas, era seu amigo), sem que isso significasse «censura», «condicionamento», um «convite à sua saída».
3. Marcelo disse que Paes do Amaral lhe terá dito que as televisões estão condicionadas no exercício das suas actividades por dependerem da concessão de licenças atribuídas pelo Estado. Juntemos a isso o facto de haver muita publicidade do Estado e do para-Estado que tem o seu peso na estrutura de receitas de qualquer estação de televisão. São elementos importantes que podem explicar a conversa de Paes do Amaral com o seu amigo Marcelo Rebelo de Sousa. E são, certamente, elementos que não podem ser ignorados na apreciação que qualquer gestor/patrão faz do contexto onde a sua organização está inserida, bem como dos factores exógenos que condicionam a sua actividade.
4. Questão de fundo, e mais interessante, é a de se saber até que ponto, em Portugal, certas actividades privadas dependem, em excesso, do condicionamento (in)directo do Estado. Infelizmente sim. Mas mesmo assim, não devemos ser ingénuos e definitivos na forma como abordamos estas questões. Mesmo em sociedades caracterizadas aberta e indiscutivelmente pela liberdade de expressão (como é o caso da nossa), os «interesses» e as «estratégias de coabitação» com o «poder» fazem parte do jogo. Fizeram no passado e continuarão a fazer, no futuro. É assim em todo o lado. O que interessa assegurar está assegurado: os espaços de opinião não se esgotam na TVI. Nem na SIC. Nem na RTP. E por aí fora. Marcelo foi, é e continuará a ser livre de dizer o que bem entender. Escusava era de se armar em vitima.
* ouvido no Fórum TSF
0 Comentários:
Enviar um comentário
Subscrever Enviar feedback [Atom]
<< Página inicial