O MacGuffin

segunda-feira, setembro 06, 2004

MUITO BEM, MAS…
Excelente artigo de Manuel Graça Dias, no Expresso desta semana. Arrasa, fundamentada e criteriosamente, o mito da “casa portuguesa”.

”A ideia de «casa portuguesa» foi combatida pelos arquitectos modernos que tentaram demonstrar o absurdo da tese – a impossibilidade de um modelo único, «português», na maneira de resolver a arquitectura, e o absurdo de que esse modelo, rural, fosse exportável para outras tipologias e programas bem como materiais e sistemas construtivos -, elaborando, a propósito, o magnífico inquérito A Arquitectura Popular em Portugal (Sidicato Nacional dos Arquitectos, 1961), escreve Graça Dias.

Totalmente de acordo. De norte a sul, do interior ao litoral, é farta a proliferação de casarios, vivendas e prédios absolutamente grotescos onde se tentou reinventar o espírito de Raul Lino, conferindo à "alegre casinha" um aspecto «antigo» e, ao mesmo tempo, «tradicional». Género «neo-clássico». Sinais característicos: arcos e arquinhos; cores garridas (o amarelo torrado e o rosa são um must); pérgulas inconsequentes; colunas pré-esforçadas que sustentam ridículos alpendres; janelas de alumínio a imitar madeira, com quadrícula falsa a seccionar as chapas de vidro duplo, resguardadas por portadas com ripinhas verde-garrafa; portas exteriores em PVC com aldrabas microscópicas e frisos «tipo» almofada; janelas debruadas com massa, a insinuar a presença de grossas, e «antigas», cantarias; etc. etc. Já no interior, encontramos uma impressionante quantidade de pavimentos cerâmicos que imitam convenientemente o mármore, o granito ou a já por si famosa «tijoleira»; cozinha lacada a branco hospitalar com um metro de largura; a suite com jaccuzzi e retrete privativa; as sancas (duplas, triplas, etc.) no tecto (a actual fixação dos arquitectos, desenhadores e empreiteiros por sancas ainda vai dar em case study); os parquets, folheados e derivados; a pré-instalação de ar condicionado (a fazer adivinhar o abafo graças a pés-direitos tipo "portugal dos pequeninos"); etc. etc. É impossível ficar indiferente a estes atentados, cuja origem, em muitas casos, remonta à doutrina 'anti-casa-de-emigrante' das décadas de 70 e 80, só que igualmente trágica. Existem, depois, as variações do tema, como é o caso, no Alentejo, do monte à «monte alentejano».



Uma pequena observação final: não foi Manuel Graça Dias o co-autor do horrendo e saloiamente pós-modernista pavilhão português na Expo 92, em Sevilha? Foi, não foi? Bem me parecia.

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