Tipicidades de um regime
Vasco Pulido Valente in Público (29/05/2009)
Uma carreira
O dr. Dias Loureiro é, suponho, de Coimbra ou dali perto. Pelo menos, tirou o curso de Direito em Coimbra e foi, depois do "25 de Abril", governador civil de Coimbra. Com Cavaco, veio para Lisboa e para secretário-geral do partido: no PSD, uma posição pouco exaltada. A seguir, lá conseguiu ser duas vezes ministro (Assuntos Parlamentares, primeiro, e, a seguir, Administração Interna). Dali em diante, andou por aquela zona indefinida onde os "notáveis" costumam circular. Presidente do Congresso (se me lembro bem), conselheiro de Santana (quando Santana formou Governo) e amigo íntimo de Cavaco, durante o longo, e voluntário, exílio do chefe. E, em 2006, reapareceu como conselheiro de Estado, por designação pessoal do Presidente: uma recompensa merecida.
Como político, Dias Loureiro não fez mais do que uma carreira vulgar. Um pouco acima da média, mas vulgar. Não deixou para trás nada de notável: uma ideia, uma reforma, uma simples medida. Parece que a sua grande glória é a de ter "enfrentado" o "buzinão" de 1994 - um pequeno episódio. Trabalhou evidentemente com eficiência e fidelidade, como centenas de outros no PSD e no PS. E, como centenas de outros, chegou aos quarenta ou cinquenta anos sem um futuro claro. Resolveu então fazer negócios. Segundo dizem - e corria na altura -, ganhou uma quantidade razoável de dinheiro: o que, em si, só o recomenda, sobretudo se, como ele garante, e não há razão para duvidar, o ganhou legalmente. De qualquer maneira, não deixou de ser um advogado da província, agora rico, promovido pelo PSD.
Isto, com a sua vida pregressa, provavelmente não lhe chegava. O lugar no Conselho de Estado, na prática sem valor, tinha a vantagem de lhe dar uma importância oficial. Quando começou o escândalo do BPN, Dias Loureiro compreendeu com certeza que se devia demitir para não embaraçar e comprometer Cavaco. A inocência dele não era a questão, a questão era não envolver Belém numa história sórdida. Mas, se por acaso se demitisse, confirmava o pior que se dizia dele e perdia o estatuto, para ele honroso, que tanto tempo, tanto esforço e, se calhar, tanta paciência lhe custara. Não quis voltar ao anonimato, escorraçado e, fatalmente, diminuído. Preferiu resistir e resistiu mal. Anteontem, acabou por reconhecer a evidência. A carreira dele, uma patética carreira de funcionário político habilidoso e vácuo, não é exemplar. Excepto no sentido em que é uma carreira típica do regime.
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