Por falar em «correia de transmissão»
Estive a ver a emissão de 4 de Abril do programa A Torto e a Direito (TVI24). Fascinam-me as opiniões de Fernanda Câncio sobre o caso Freeport. Para esta jornalista, existem acusações «infundadas» sobre o primeiro-ministro, «alegadas» pressões sobre os procuradores encarregados da investigação, «alegadas» testemunhas, «alegados» acusadores e «alegados» casos relativos ao processo de licenciamento do Freeport. Em contrapartida, a jornalista tem duas fundadas certezas: a) há jornais e jornalistas que estão a servir de «correia de transmissão» para «recados» (leia-se «ataques») contra o Partido Socialista e o Primeiro-Ministro; b) não há investigação jornalística sobre o caso Freeport, apenas o patrocínio da violação do segredo de justiça através da publicação das fugas de informação (deturpadas ou não).
Notaram a diferença? De um lado, há factos infundados e suposições. Do outro lado, certezas. Fernanda Câncio insurge-se, e bem, contra a violação do segredo e contra as acusações infundadas que pendem sobre o primeiro-ministro. Mas não se coíbe de fazer uso das mesmas conjecturas e do mesmo tipo de acusações (infundadas) relativamente aos jornalistas (Fernanda Câncio não concretiza uma só acusação contra os jornalistas e nem por uma vez refere o nome de um putativo «interesse»). Estamos, novamente, no campo da «campanha negra», sem o epíteto tétrico.
Fernanda Câncio acha gravíssimo que o Presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (PSMMP) tenha pedido uma audiência ao Presidente da República porque, segundo ela, este gesto põe em causa um dos pilares do Estado de Direito: o da separação de poderes. Repare-se: o PSMMP, que já por duas vezes se referiu à existência de pressões políticas sobre os magistrados encarregados do caso Freeport, pretende abordar a questão com o Presidente da República no sentido, provavelmente ou alegadamente, de este contribuir para repor o regular funcionamento das instituições do Estado de Direito que aquele julga estar em causa. A reacção de Fernanda Câncio é a de profunda preocupação pela possibilidade de haver pressões do poder político sobre o poder judicial? Não. A preocupação vai inteirinha para a posição do PSMMP. Não são as alegadas pressões que a preocupam. É a «alegada» interferência do poder político (Presidente da República) sobre o poder judicial por via do queixume (intolerável) do sindicalista. A primeira, é alegada. A segunda, é de certezinha.
A Fernanda Câncio acha patético, ou pateta, que um magistrado se sinta pressionado por um «colega» (neste caso Lopes da Mota, que não é apenas um «colega» mas o presidente do Eurojust) porque não vê como pode um magistrado sentir-se «pressionado» (invocando, en passant, a valente Dra. Morgado). Trocado por miúdos, o que ela quer dizer é mais ou menos isto: se um magistrado ou um outro agente qualquer, por influência ou a pedido de um membro do governo, tentar influenciar ou alterar o curso de uma investigação judicial, a «vítima» (o pressionado) tem duas saídas: desvalorizar a pressão ou emudecer (extinguindo, de uma forma ou de outra, o objecto e o móbil). Aplicada a outros campos, a tese da jornalista Fernanda Câncio resultaria no seguinte: se o potencial corrompido recusar ou ignorar a tentativa de corrupção, não há corrupção; se o ladrão, na tentativa de arrombar a caixa de esmolas, não conseguir sacar um cêntimo, não há roubo nem tentativa de roubo. O intrigante para uma pessoa portadora de um cartão de jornalista, é a incompreensão sobre o que está em causa: os exemplos do ladrão e do corruptor, para além de simplistas, são peanuts quando comparados com a possibilidade de violação do princípio da separação de poderes, que tanto preocupa a jornalista Fernanda Câncio.
No limite, o que Fernanda Câncio defende, ou preconiza, é tão só isto: todo e qualquer assunto que esteja a ser objecto de investigação judicial, e logo em segredo de justiça, não deve ser investigado jornalisticamente. Ou, como ela refere, deve-o ser por jornalistas «independentes». Convinha que a jornalista Fernanda Câncio explicasse o que é, neste caso, um jornalista «independente» (presume-se que ela se considere um), sob pena de suspeitarmos que, para a Fernanda Câncio, um jornalista «independente» é aquela que investiga não investigando, porque o objecto da sua investigação está, lá está, em segredo de justiça. Escusado será dizer que esta ideia, não sendo peregrina, é perigosa e poria em causa um dos pilares de qualquer democracia: o do escrutínio público servido pela liberdade de imprensa.
Notaram a diferença? De um lado, há factos infundados e suposições. Do outro lado, certezas. Fernanda Câncio insurge-se, e bem, contra a violação do segredo e contra as acusações infundadas que pendem sobre o primeiro-ministro. Mas não se coíbe de fazer uso das mesmas conjecturas e do mesmo tipo de acusações (infundadas) relativamente aos jornalistas (Fernanda Câncio não concretiza uma só acusação contra os jornalistas e nem por uma vez refere o nome de um putativo «interesse»). Estamos, novamente, no campo da «campanha negra», sem o epíteto tétrico.
Fernanda Câncio acha gravíssimo que o Presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (PSMMP) tenha pedido uma audiência ao Presidente da República porque, segundo ela, este gesto põe em causa um dos pilares do Estado de Direito: o da separação de poderes. Repare-se: o PSMMP, que já por duas vezes se referiu à existência de pressões políticas sobre os magistrados encarregados do caso Freeport, pretende abordar a questão com o Presidente da República no sentido, provavelmente ou alegadamente, de este contribuir para repor o regular funcionamento das instituições do Estado de Direito que aquele julga estar em causa. A reacção de Fernanda Câncio é a de profunda preocupação pela possibilidade de haver pressões do poder político sobre o poder judicial? Não. A preocupação vai inteirinha para a posição do PSMMP. Não são as alegadas pressões que a preocupam. É a «alegada» interferência do poder político (Presidente da República) sobre o poder judicial por via do queixume (intolerável) do sindicalista. A primeira, é alegada. A segunda, é de certezinha.
A Fernanda Câncio acha patético, ou pateta, que um magistrado se sinta pressionado por um «colega» (neste caso Lopes da Mota, que não é apenas um «colega» mas o presidente do Eurojust) porque não vê como pode um magistrado sentir-se «pressionado» (invocando, en passant, a valente Dra. Morgado). Trocado por miúdos, o que ela quer dizer é mais ou menos isto: se um magistrado ou um outro agente qualquer, por influência ou a pedido de um membro do governo, tentar influenciar ou alterar o curso de uma investigação judicial, a «vítima» (o pressionado) tem duas saídas: desvalorizar a pressão ou emudecer (extinguindo, de uma forma ou de outra, o objecto e o móbil). Aplicada a outros campos, a tese da jornalista Fernanda Câncio resultaria no seguinte: se o potencial corrompido recusar ou ignorar a tentativa de corrupção, não há corrupção; se o ladrão, na tentativa de arrombar a caixa de esmolas, não conseguir sacar um cêntimo, não há roubo nem tentativa de roubo. O intrigante para uma pessoa portadora de um cartão de jornalista, é a incompreensão sobre o que está em causa: os exemplos do ladrão e do corruptor, para além de simplistas, são peanuts quando comparados com a possibilidade de violação do princípio da separação de poderes, que tanto preocupa a jornalista Fernanda Câncio.
No limite, o que Fernanda Câncio defende, ou preconiza, é tão só isto: todo e qualquer assunto que esteja a ser objecto de investigação judicial, e logo em segredo de justiça, não deve ser investigado jornalisticamente. Ou, como ela refere, deve-o ser por jornalistas «independentes». Convinha que a jornalista Fernanda Câncio explicasse o que é, neste caso, um jornalista «independente» (presume-se que ela se considere um), sob pena de suspeitarmos que, para a Fernanda Câncio, um jornalista «independente» é aquela que investiga não investigando, porque o objecto da sua investigação está, lá está, em segredo de justiça. Escusado será dizer que esta ideia, não sendo peregrina, é perigosa e poria em causa um dos pilares de qualquer democracia: o do escrutínio público servido pela liberdade de imprensa.
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