Sem partido (ou com partido momentaneamente ocupado?)
Vasco Pulido Valente, in Público (14/03/2008)
A direita sem partido
Em 1979 e 1980, fiz duas campanhas pelo PSD, ou, para ser exacto, uma pelo PSD, interna, e outra pela AD. Nessa altura o PSD era ainda em substância o partido do país rural, católico e conservador e, geograficamente, o partido do centro, do Norte e do Nordeste. Ou, por outras palavras, do Portugal em que a oposição à ditadura fora rara e disseminada e mais tarde o PREC mal tocara. Em Lisboa e no Porto, mas sobretudo no Porto, ainda duas cidades do passado que mal começavam a mudar, parte da velha classe média e da pequena burguesia tradicional também votavam PSD, por horror à "revolução" e medo de qualquer espécie de socialismo. O PSD parecia o único partido "nacional", coisa de que ele próprio se gabava (falsamente porque pouco penetrava no Sul) e o único partido, como se dizia, "interclassista".
De qualquer maneira, logo do princípio houve uma claríssima divisão entre o PSD rural, católico e do Norte e o PSD urbano e secular, que aspirava à modernidade; entre PSD da "Marinha" (de Cascais, claro) e o PSD das "bases", como já à época ele gostava de se descrever. Várias cisões (nenhum partido teve tantas) provaram, de resto, a natureza heterogénea e volátil dessa aliança, que não podia durar. Em 1980, Sá Carneiro uniu o PSD (e a direita) contra a esquerda e, a seguir, em 1987, Cavaco conseguiu formar um grande "bloco" contra a herança do PREC. Estes dois triunfos deram uma falsa impressão da força e da vitalidade do PSD. De facto, Sá Carneiro e Cavaco ganharam, apesar do partido e não por causa do partido. Quando um morreu e o outro saiu, o partido voltou ao caos.
E, desta última vez, voltou ao caos num Portugal diferente. Num Portugal até certo ponto "modernizado", em que a influência da Igreja deixara de pesar decisivamente, o interior rural se "desertificava" e aparecera uma nova classe média, produto do regime, com uma intensa vontade de ascensão social e sem vestígio de respeito pelo precário equilíbrio antigo PSD. O partido de Menezes, que só por acaso usa o mesmo nome, é o partido dessa nova classe média e não representa mais do que 20 a 30 por cento do eleitorado. Talvez suba ocasionalmente nas sondagens por impopularidade de Sócrates, mas, salvo desastre, a maioria do país nunca lhe confiará o governo; a ambição nua e crua, a brutalidade táctica e um populismo meio louco valem o que valem. Entretanto, dividida e desorientada, a direita responsável do PSD está sem partido. E precisa de um.
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