O precedente
Não se trata de defender requentadamente o governo de Pedro Santana Lopes. Muito menos de lamentar o seu afastamento, ditado pelo resultado das eleições de 20 de Fevereiro. Parece-me, contudo, curiosa, para não dizer perturbante, a forma como muita gente diz, agora, que “Sampaio estava certo em ter dissolvido a AR porque, como prova o resultado eleitoral, o povo estava com ele”. O inefável José Magalhães já o repetiu até à náusea. Miguel Sousa Tavares também. Mas poucos foram os que, até à data, repararam no, ou quiseram aprofundar o precedente que se abriu (Rui Ramos foi, até agora, quem mais reflectiu sobre a questão). A decisão de Sampaio, baseada em pressupostos não inteiramente tangíveis e objectivos, não deixa de perigosamente evocar a tese segundo a qual a «verdadeira» soberania do povo está na «rua», e não propriamente (representada) no Parlamento, como se a composição deste tivesse resultado de um sufrágio simbólico ou truncado (ou, no limite, de um embuste), logo passível de ser desvalorizada ou menosprezado pela «realidade». Dito de outra forma, a decisão de Sampaio veio dar ênfase à ideia de que a opinião pública - corporativa ou unipessoal - e a opinião publicada devem ser levadas na exacta medida da de uma vontade expressa plebiscitária - informal mas a espaços vinculativa – que poderá, ou deverá, influir em decisões «maiores» sempre que a «rua», ou o «país eleitoral», deixe de coincidir com o espectro político-partidário presente na Assembleia da República, mesmo quando nesta subsista uma estável maioria parlamentar.
Agora, imaginemos que Sócrates resolve, como pretende, pôr mãos à obra, avançando com medidas reformistas «verdadeiramente» (advérbio recorrente no Sr. Eng.) austeras, incómodas, impopulares, sobretudo para o eleitorado de esquerda. Vamos supor que, revoltados com tamanha traição, o PC via sindicatos e o BE via «sociedade civil» (Fernando Rosas já o ameaçou), incendeiam a rua. Vamos, também, supor que os media (com a TVI como timoneira) e as sondagens dão conta de um país insatisfeito - miserável, carenciado, revoltado com a «crise» - e de um governo cuja imagem se vem deteriorando. A pergunta impõe-se: o próximo Presidente da República, cuja cor política pode, por exemplo, ser diferente da do governo, deixará de pensar no precedente?
Agora, imaginemos que Sócrates resolve, como pretende, pôr mãos à obra, avançando com medidas reformistas «verdadeiramente» (advérbio recorrente no Sr. Eng.) austeras, incómodas, impopulares, sobretudo para o eleitorado de esquerda. Vamos supor que, revoltados com tamanha traição, o PC via sindicatos e o BE via «sociedade civil» (Fernando Rosas já o ameaçou), incendeiam a rua. Vamos, também, supor que os media (com a TVI como timoneira) e as sondagens dão conta de um país insatisfeito - miserável, carenciado, revoltado com a «crise» - e de um governo cuja imagem se vem deteriorando. A pergunta impõe-se: o próximo Presidente da República, cuja cor política pode, por exemplo, ser diferente da do governo, deixará de pensar no precedente?
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