QUANDO O DOCE E INEBRIANTE CHEIRO DO PODER LHE CHEGA AOS BOLBOS E RECEPTORES OLFACTIVOS
(actualizado)
1. A boa da esquerda – para quem a colocação de António Vitorino (um português) como Presidente da Comissão Europeia representaria “uma vitória” e “um prestigio” para Portugal – vê-se grega para aceitar, na mesma medida, a ida de Durão Barroso para Bruxelas. É certo que tenta disfarçar. Mas muito mal. Entusiasmada pelo resultado das eleições europeias (onde putativamente alcançou uma "estrondosa" vitória...), desperta, agora, para outros voos. A oportunidade parece ser de ouro. Os elementos agrupam-se, os argumentos – sólidos, obviamente seríssimos e sempre a pensar no interesse geral do país – já brotaram das mais iluminadas cabeças. Ontem, na SIC Notícias, os olhos de António José Teixeira brilhavam. Hoje, na blogosfera, há já quem esfregue as mãos perante a perspectiva de colocar, no olho da rua, o nefasto governo de direita. Tudo serve para justificar a dissolução da Assembleia da República (AR): ”É claro que, se Durão Barroso se demitir de primeiro-ministro, o país deve ir para eleições antecipadas. A Constituição permite que isso não acontece, mas a legitimidade política não se faz apenas da legitimidade que está na lei. Os portugueses votaram nele para primeiro-ministro - as eleições legislativas são altamente personalizadas. A pessoa e o projecto que foram escolhidos foram os de Durão Barroso, não do PSD.”. Mais: “Tendo em conta o trajecto presidencial de Jorge Sampaio, é de esperar que não haja eleições antecipadas. Sampaio fará mal e estará a contribuir decisivamente para a criação de uma situação política com todos os ingredientes para acabar mal, muito mal.”. Pelo meio, JMF fala, ainda, em boa-fé vs. má-fé.
Exacto. Só por má-fé alguém pode, agora, agarrar-se a essa coisa da “legitimidade política” separando-a da “legitimidade constitucional”, como se esta não passasse de “lei”, e como se a “lei” fosse uma coisa artificial, abstracta e formalista, uma espécie de «aberração» vazia de sentido.
Entre: a) dissolver a AR e marcar eleições antecipadas, conduzindo o país para mais um processo de lutas pré-eleitorais, interrompendo uma legislatura a meio numa altura em que o país precisa de estabilidade, contenção e alguma tranquilidade; e b) manter no activo o elenco da AR, sustentar um governo que está a meio da sua legislatura, emanado da mesma AR, a qual, por sua vez, resultou de um acto eleitoral que supostamente deverá ocorrer de quatro em quatro anos; um governo de muitos rostos e com uma estrutura real e funcional; um governo que tem um programa e uma estratégia no activo, e que tem tentado (bem, mal ou assim-assim) a prossecução dos mais diversos objectivos (gerais e particulares);
a esquerda prefere fazer tabula rasa de tudo - até porque, hey!, a oportunidade é uma boa oportunidade, não é? E o governo é um mau governo, não é? E general que sai, guerra que acaba, não é?
2. Durão Barroso pode sair sem que isso implique nova auscultação popular, vulgo eleições. Até porque, convém lembrar, Durão Barroso não era o governo. Era, sem dúvida, o chefe. Era, sem margem para dúvidas, quem dava a cara. Mas perante as actuais circunstâncias, ou seja, perante a iminência de um primeiro-ministro abandonar o seu cargo por razões não «internas», é para isto que existem vice-presidentes, é para isto que existem partidos, foi, também, para isto que votámos num partido e não apenas numa pessoa e é, sobretudo, para isto que existe um Parlamento.
3. Voltam ao de cima, uma vez mais, os dramas, as «indignações», os «problemas» que nos relembram quão jovem é a nossa democracia e quão recorrentes são os traços do nosso endémico provincianismo. Só por falta de maturidade e por um apego sem tréguas à «esperteza saloia», se pode tentar transformar este caso num drama shakespeariano - repleto de desmaios, indignações, «gravosas» consequências e ”ingredientes para tudo acabar mal, muito mal” – ou tentar retirar da situação dividendos políticos, com o poder no horizonte.
4. Coisa bem diferente é saber se concordei com a decisão de Durão Barroso de aceitar o cargo de Presidente da Comissão Europeia. Para quem se interessar: não concordei.
(actualizado)
1. A boa da esquerda – para quem a colocação de António Vitorino (um português) como Presidente da Comissão Europeia representaria “uma vitória” e “um prestigio” para Portugal – vê-se grega para aceitar, na mesma medida, a ida de Durão Barroso para Bruxelas. É certo que tenta disfarçar. Mas muito mal. Entusiasmada pelo resultado das eleições europeias (onde putativamente alcançou uma "estrondosa" vitória...), desperta, agora, para outros voos. A oportunidade parece ser de ouro. Os elementos agrupam-se, os argumentos – sólidos, obviamente seríssimos e sempre a pensar no interesse geral do país – já brotaram das mais iluminadas cabeças. Ontem, na SIC Notícias, os olhos de António José Teixeira brilhavam. Hoje, na blogosfera, há já quem esfregue as mãos perante a perspectiva de colocar, no olho da rua, o nefasto governo de direita. Tudo serve para justificar a dissolução da Assembleia da República (AR): ”É claro que, se Durão Barroso se demitir de primeiro-ministro, o país deve ir para eleições antecipadas. A Constituição permite que isso não acontece, mas a legitimidade política não se faz apenas da legitimidade que está na lei. Os portugueses votaram nele para primeiro-ministro - as eleições legislativas são altamente personalizadas. A pessoa e o projecto que foram escolhidos foram os de Durão Barroso, não do PSD.”. Mais: “Tendo em conta o trajecto presidencial de Jorge Sampaio, é de esperar que não haja eleições antecipadas. Sampaio fará mal e estará a contribuir decisivamente para a criação de uma situação política com todos os ingredientes para acabar mal, muito mal.”. Pelo meio, JMF fala, ainda, em boa-fé vs. má-fé.
Exacto. Só por má-fé alguém pode, agora, agarrar-se a essa coisa da “legitimidade política” separando-a da “legitimidade constitucional”, como se esta não passasse de “lei”, e como se a “lei” fosse uma coisa artificial, abstracta e formalista, uma espécie de «aberração» vazia de sentido.
Entre: a) dissolver a AR e marcar eleições antecipadas, conduzindo o país para mais um processo de lutas pré-eleitorais, interrompendo uma legislatura a meio numa altura em que o país precisa de estabilidade, contenção e alguma tranquilidade; e b) manter no activo o elenco da AR, sustentar um governo que está a meio da sua legislatura, emanado da mesma AR, a qual, por sua vez, resultou de um acto eleitoral que supostamente deverá ocorrer de quatro em quatro anos; um governo de muitos rostos e com uma estrutura real e funcional; um governo que tem um programa e uma estratégia no activo, e que tem tentado (bem, mal ou assim-assim) a prossecução dos mais diversos objectivos (gerais e particulares);
a esquerda prefere fazer tabula rasa de tudo - até porque, hey!, a oportunidade é uma boa oportunidade, não é? E o governo é um mau governo, não é? E general que sai, guerra que acaba, não é?
2. Durão Barroso pode sair sem que isso implique nova auscultação popular, vulgo eleições. Até porque, convém lembrar, Durão Barroso não era o governo. Era, sem dúvida, o chefe. Era, sem margem para dúvidas, quem dava a cara. Mas perante as actuais circunstâncias, ou seja, perante a iminência de um primeiro-ministro abandonar o seu cargo por razões não «internas», é para isto que existem vice-presidentes, é para isto que existem partidos, foi, também, para isto que votámos num partido e não apenas numa pessoa e é, sobretudo, para isto que existe um Parlamento.
3. Voltam ao de cima, uma vez mais, os dramas, as «indignações», os «problemas» que nos relembram quão jovem é a nossa democracia e quão recorrentes são os traços do nosso endémico provincianismo. Só por falta de maturidade e por um apego sem tréguas à «esperteza saloia», se pode tentar transformar este caso num drama shakespeariano - repleto de desmaios, indignações, «gravosas» consequências e ”ingredientes para tudo acabar mal, muito mal” – ou tentar retirar da situação dividendos políticos, com o poder no horizonte.
4. Coisa bem diferente é saber se concordei com a decisão de Durão Barroso de aceitar o cargo de Presidente da Comissão Europeia. Para quem se interessar: não concordei.
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