ASSIM, SEM MAIS NEM MENOS: EU AMO ESTE HOMEM
"Se Há Alguma Coisa de Que Nós Precisamos É de Menos Auto-estima"
Por NUNO SÁ LOURENÇO, in Público 21 de Maio de 2004
"A campanha "Portugal Positivo", apresentada como "independente, movida pela sociedade civil" - apesar de ter na sua primeira conferência uma deputada do PSD, Graça Proença de Carvalho - não arrancou ontem da forma que os organizadores pretendiam. A razão para tal foi o historiador Vasco Pulido Valente, convidado para apresentar uma perspectiva histórica e sociológica sobre o tema. O colunista acabou por concluir, precisamente, no sentido oposto do pretendido: os portugueses têm auto-estima a mais. Isto porque apesar de se verem como atrasados, embora andem há 200 anos a tentar imitar outros países europeus, nunca se consideraram culpados do atraso português. Começou por ser dos jesuítas, passou para os absolutistas, chegou aos comunistas, sobrou para os fascistas e acabou nos políticos.
O historiador recuou duzentos anos na história portuguesa para lembrar que desde o século dezoito que o discurso de todos os governos era "modernizar Portugal", ou seja, "imitar" o que se via "lá fora". A primeira conclusão a que chegou foi que os objectivos da elite governativa não ajudavam à auto-estima. "Se uma pessoa define o seu programa político como imitação o que está a dizer é que a sua identidade é ser atrasado".
Acrescentou depois que o problema de Portugal era o "fracasso da imitação". Como as tentativas de modernização não funcionavam, surgia a "obsessão com o recomeço". Lembrou que cada governo e cada regime tentava sempre começar do zero. Daí as "Regenerações", o "Estado Novo" e o "homem novo português" de Cavaco Silva.
Foi então que chegou a vez de analisar a iniciativa para onde tinha sido convidado. Catalogou-a como "muito típica" e explicou porquê. A expressão "Portugal Positivo" era um "coloquialismo americano", ou seja, mais um modelo encontrado "lá fora".
Rematou a caracterização "típica" da iniciativa, comparando-a a outras posições "anti-regime", por se colocarem à margem dos canais normais: "Começam por rejeitar os instrumentos políticos quando se dizem provir da sociedade civil, afastam-se dos instrumentos económicos porque senão estavam a criar empresas e também não acreditam nos instrumentos sociais porque senão estavam num ONG qualquer. Não é assim que a gente vai lá."
A análise de Vasco Pulido Valente incomodou tanto que houve até quem, a partir da audiência, não conseguisse evitar um desabafo do tipo "o senhor, peço desculpa, mas está na conferência errada" [ah ah ah ah]. A mesma pessoa estava contra o historiador porque considerava que tinham existido "políticas positivas" no passado e "pessoas capazes de pensar em termos reformistas". Existia, portanto, "um Portugal positivo". Outro interveniente apontou como causas para o atraso português a"falta de pontualidade" e a "falta de rigor". Outra defendeu que não havia mal nenhum em "modernizar" se tal representasse "adaptar a Portugal o que funciona lá fora".
Vasco Pulido Valente respondeu a estas reacções acusando os intervenientes de mais uma atitude típica: a de atribuir a "culpa" a uma minoria e nunca ao "grosso da maioria dos portugueses". A culpa era sempre dos outros. Mais uma atitude "típica", com séculos de história. Lembrou que Portugal já tinha uma longa lista de bodes expiatórios. Começou por ser dos jesuítas, passou para os absolutistas, chegou aos comunistas, sobrou para os fascistas e acabou nos políticos. Foi por isso que em Portugal se instalou a sensação de "completa impunidade": "Portugal está cheio de nulidades nas mais altas instâncias em que ninguém toca". Na televisão todos eram tratados como "senhor professor ou excelso camarada", e nunca uma crítica era directamente apontada a um nome em concreto. Em suma, estimamo-nos demais. "Se há alguma coisa de que nós precisamos é de menos auto-estima", rematou.
Quando o debate se aproximava do fim, a assistência cedeu e perguntou então como é que se poderia ultrapassar o problema. O historiador deu a estocada final: "Como é que se ultrapassa a depressão? Com um novo ciclo de prosperidade. Se houver mais dinheiro as pessoas começam logo a sentir-se melhor, nem precisam deste tipo de conferências."
LINNNNNNNNNNNDÓ (estavam mesmo a pedi-las, não estavam?)
"Se Há Alguma Coisa de Que Nós Precisamos É de Menos Auto-estima"
Por NUNO SÁ LOURENÇO, in Público 21 de Maio de 2004
"A campanha "Portugal Positivo", apresentada como "independente, movida pela sociedade civil" - apesar de ter na sua primeira conferência uma deputada do PSD, Graça Proença de Carvalho - não arrancou ontem da forma que os organizadores pretendiam. A razão para tal foi o historiador Vasco Pulido Valente, convidado para apresentar uma perspectiva histórica e sociológica sobre o tema. O colunista acabou por concluir, precisamente, no sentido oposto do pretendido: os portugueses têm auto-estima a mais. Isto porque apesar de se verem como atrasados, embora andem há 200 anos a tentar imitar outros países europeus, nunca se consideraram culpados do atraso português. Começou por ser dos jesuítas, passou para os absolutistas, chegou aos comunistas, sobrou para os fascistas e acabou nos políticos.
O historiador recuou duzentos anos na história portuguesa para lembrar que desde o século dezoito que o discurso de todos os governos era "modernizar Portugal", ou seja, "imitar" o que se via "lá fora". A primeira conclusão a que chegou foi que os objectivos da elite governativa não ajudavam à auto-estima. "Se uma pessoa define o seu programa político como imitação o que está a dizer é que a sua identidade é ser atrasado".
Acrescentou depois que o problema de Portugal era o "fracasso da imitação". Como as tentativas de modernização não funcionavam, surgia a "obsessão com o recomeço". Lembrou que cada governo e cada regime tentava sempre começar do zero. Daí as "Regenerações", o "Estado Novo" e o "homem novo português" de Cavaco Silva.
Foi então que chegou a vez de analisar a iniciativa para onde tinha sido convidado. Catalogou-a como "muito típica" e explicou porquê. A expressão "Portugal Positivo" era um "coloquialismo americano", ou seja, mais um modelo encontrado "lá fora".
Rematou a caracterização "típica" da iniciativa, comparando-a a outras posições "anti-regime", por se colocarem à margem dos canais normais: "Começam por rejeitar os instrumentos políticos quando se dizem provir da sociedade civil, afastam-se dos instrumentos económicos porque senão estavam a criar empresas e também não acreditam nos instrumentos sociais porque senão estavam num ONG qualquer. Não é assim que a gente vai lá."
A análise de Vasco Pulido Valente incomodou tanto que houve até quem, a partir da audiência, não conseguisse evitar um desabafo do tipo "o senhor, peço desculpa, mas está na conferência errada" [ah ah ah ah]. A mesma pessoa estava contra o historiador porque considerava que tinham existido "políticas positivas" no passado e "pessoas capazes de pensar em termos reformistas". Existia, portanto, "um Portugal positivo". Outro interveniente apontou como causas para o atraso português a"falta de pontualidade" e a "falta de rigor". Outra defendeu que não havia mal nenhum em "modernizar" se tal representasse "adaptar a Portugal o que funciona lá fora".
Vasco Pulido Valente respondeu a estas reacções acusando os intervenientes de mais uma atitude típica: a de atribuir a "culpa" a uma minoria e nunca ao "grosso da maioria dos portugueses". A culpa era sempre dos outros. Mais uma atitude "típica", com séculos de história. Lembrou que Portugal já tinha uma longa lista de bodes expiatórios. Começou por ser dos jesuítas, passou para os absolutistas, chegou aos comunistas, sobrou para os fascistas e acabou nos políticos. Foi por isso que em Portugal se instalou a sensação de "completa impunidade": "Portugal está cheio de nulidades nas mais altas instâncias em que ninguém toca". Na televisão todos eram tratados como "senhor professor ou excelso camarada", e nunca uma crítica era directamente apontada a um nome em concreto. Em suma, estimamo-nos demais. "Se há alguma coisa de que nós precisamos é de menos auto-estima", rematou.
Quando o debate se aproximava do fim, a assistência cedeu e perguntou então como é que se poderia ultrapassar o problema. O historiador deu a estocada final: "Como é que se ultrapassa a depressão? Com um novo ciclo de prosperidade. Se houver mais dinheiro as pessoas começam logo a sentir-se melhor, nem precisam deste tipo de conferências."
LINNNNNNNNNNNDÓ (estavam mesmo a pedi-las, não estavam?)
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