O MacGuffin

sexta-feira, janeiro 30, 2004

AVASSALADOR?
O André Figueiredo ironiza, apelidando o meu estilo de “avassalador”. Para quem me apelida – sem paralelo - de “reaccionário”, “demagogo” e insinua que eu sou indiferente (desprezarei?) em relação aos que decidem fazer greve, não está nada mal. Diz, ainda, que as minhas perguntas (V. post É a greve, segunda parte) são retóricas. O André ainda não percebeu que não se trata de uma questão de aceitar, ou não, a greve. Eu aceito tudo. Greves, petições, etc. Respeito o principio. Aceito a liberdade de reivindicação. Acho que os Sindicatos fazem parte do «jogo». Desempenham uma função de informação, formação, aconselhamento que importa preservar. Recuso-me, contudo, a aceitar, ou a concordar, de forma cega e comformista, com todas as razões e com todas as greves. Este ponto nada tem de retórico: até o Winnie The Pooh o percebe. Não se trata de relativizar os motivos ou os fins de uma greve. Trata-se, tão só, de perceber que nem tudo se justifica. É verdade: nem tudo se justifica. Até um grevista ou um Sindicato tem de saber respeitar as proporções e medir até que ponto podem ser ridículas as suas opções. O que é que um sindicato, pela mão dos grevistas no local, pretende provar quando afixa, dois dias antes, um cartaz numa escola primária incitando à adesão e, ao mesmo tempo, pretende deliberadamente baralhar os pais das crianças (de 6 anos), sonegando informação para que, no dia seguinte, estes batam com o nariz na porta da escola às 8h, em dias de intempérie? O André achará isso razoável? Eficaz? Uma forma de luta? Justificar-se-á? Em que é que isso ajuda a perceber os motivos da greve? Não perceberá que estas jogadas tipo «chico-esperto» provocam o efeito contrário ao pretendido? É assim que pretendem «compreensão»?
Por outro lado, assiste-me o direito de não compreender ou aceitar certos protestos. Ou não? Repito: há sindicalistas que continuam a fazer uso de um discurso anacrónico, demagógico, irrealista, repleto de invectivas contra o «patronato» ou o «capital», de «jornadas de luta», etc., por vezes exigindo o que não é exequível. Aos sindicalistas também se exige seriedade e responsabilidade – tal como ao patrão ou à administração. A posição dos sindicatos pode facilmente ser contaminada pela demagogia e por um apelo fácil a uma cumplicidade barata (é essa a diferença entre um homem chamado João Proença e outro chamado Carvalho da Silva). Qual é o trabalhador que aceita, de bom grado, uma diminuição de regalias ou um aumento que fica aquém das suas expectativas? Qual é o trabalhador que não se sente compelido a concordar e a apoiar quem, em seu nome, reivindica mais e mais e mais? Os sindicatos cumprem o seu papel, mas o seu papel tem de ser razoável, credível, realista. Depois, existe uma questão concreta que não pode ser escamoteada: existe uma diferença de estatuto entre os que trabalham na função pública (o palco privilegiado das movimentações sindicais) e os que trabalham no sector privado, com desvantagem para estes. Só uma pessoa insensível ou desconhecedora do mercado de trabalho não percebe isso. O que os Sindicatos muitas vezes reclamam é a perpetuação de uma descriminação positiva sobre os funcionários públicos, que passa por situações de privilégio insustentáveis (passando, inclusivamente, por uma sensação de perenidade no vínculo sem paralelo). Existe uma imensa massa anónima de trabalhadores que não se ouvem. Que aceitam, muitas vezes contra a sua vontade mas compreendendo os condicionalismos de uma conjuntura económica desfavorável, aumentos inferiores aos do sector público. Porque sabem o que custa a perda de um emprego, porque conhecem a fragilidade das organizações onde trabalham, porque aceitam negociar com o empregador contrapartidas doutro tipo, diferidas no tempo, e porque cada vez mais observam a relação empregador/empregado como uma relação de equipa e não de força. Não, não estou a defender um nivelamento por baixo. Estou antes a falar de situações de privilégio que precisam de ser limadas. Em suma: se fui avassalador, demagógico ou reaccionário, desculpe lá, caro André.

PS: só mais uma coisa: os professores não são os bons da fita. O pessoal auxiliar não é o mau da fita. Não sou adepto de maniqueísmos. Por vezes discordo com os professores, por vezes concordo com o pessoal auxiliar. Por vezes discordo das opções do Eng. Santos no Sporting. Outras vezes não. Por vezes divirto-me com os "não é" do Ruben de Carvalho. Outras vezes detesto-os. Por vezes desiludo-me com o que escrevo. Outras vezes não. E por aí fora.

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