O MacGuffin

segunda-feira, outubro 06, 2003

WMD: WASHINGTON MANOUVERS IN THE DARK?
O meu amigo e eterno antagonista da questão Iraquiana no Pastilhas, Luis Rocha (um brilhante cientista português a trabalhar no Los Alamos National Laboratory) escreveu-me. Apesar das nossas divergências nesta matéria, é sempre um prazer discutir com o Luis. Aqui vai o texto:

”Olá Carlos,
Volta e meia volto aqui ao teu contra-corrente para ver como continuas a defender a Guerra do Iraque e Administração Bush. Devo dizer que estou um pouco desapontado, uma vez que continuas a falar de Esquerda e Direita, etc. Uma coisa que eu sempre critiquei nesta administração e na motivação desta guerra em conversas contigo foi o facto dos Bush e Co serem uns vigaristas. Tu aqui há alguns meses ficaste muito ofendido quando eu lhes chamei Gangsters. Mais ou menos apelidaste-me de esquerda radical, etc, etc. Como sabes, nunca fui de esquerda, mas parece-me que qualquer pessoa de direita ou esquerda que aprecie factos e uma avaliação objectiva, tem agora que aceitar que esta administração é de facto Vigarista (com V grande).
Já se falou muito de não se ter encontrado as Armas de Destruição Maciça, de não haver nenhuma ligação credível a terrorismo, etc. Estes são factos que atestam uma incontestável vigarice, mas ainda por cima há agora dados também incontestáveis de um amiguismo empresarial inaceitável. O que tens a dizer sobre isso? Lê o artigo do Krugman "Whos's Sordid Now?" no NY Times: http://www.nytimes.com/2003/09/30/opinion/30KRUG.html?th para uma comparação entre a dignidade moral do Marshall Plan, comparada com a falta de ética completa desta administração na administração do Iraque. Se estes tipos não são gangsters, quem o será?
Um abraço,
Luis
P.S. Muito me tenho rido com o livro do Al Franken: http://www.ohthethingsiknow.com/


Meu caro Luis, duas coisas:
1.ª) Ao contrário do que para aí se apregoa, a dicotomia esquerda vs direita está viva. E recomenda-se. A minha referência à dita no seio das discussões sobre a intervenção no Iraque não foram gratuitas. Partiram do óbvio ululante: foi a malta da esquerda que, na sua grande maioria, foi contra a intervenção. Mas, repara: eu não creio que, ideológica e filosoficamente, a bota tivesse jogado com a perdigota. Desta vez as coisas estiveram um pouco à avessas. Como eu tive oportunidade de escrever, encontrei mais cinismo, calculismo, frieza e tiques de real politik do lado da esquerda – epítetos que a esquerda tradicionalmente associa à direita. O discurso dos esquerdistas pareceu oscilar entre “o problema não é nosso, mas sim dos iraquianos” e um ódio puro e cego (o tal anti-americanismo) contra uma administração rotulada de “extrema-direita” e, em geral, contra um país, que chegava a ofuscar a natureza brutal do regime de Saddam Hussein (nunca disse ser o teu caso).
Agora, é a esquerda que continua obcecada com a questão das WMD – questão que eu não desvalorizo mas nunca entendi como o grande e único casus belli. Há, inclusivamente, algo de absurdo neste comportamento: no meio do cenário desolador de centenas de valas comuns, contendo milhares de corpos; por entre imagens esclarecedoras quanto ao despotismo e demência de Saddam e seus filhos, a malta da esquerda continua a desviar o olhar, insistindo na sua obsessão: “Onde estão as armas de destruição massiva?” (como se nada mais importasse provar ou observar). Tenho, inclusivamente, vislumbrado uma espécie de nostalgia pelo regime de Saddam (só porque as coisas não ficaram resolvidas em três meses) ou, até, uma tentativa mais ou menos tímida de ilibar ou amnistiar Saddam apenas e só porque, até à data, não foi encontrado o putativo móbil da intervenção: as malditas ADM’s.
Eu não sei se Bush mentiu deliberadamente (como elemento de uma intricada estratégia de interesses obscuros), se foi levado a mentir ou se foi enganado pelo trabalho dos seus serviços secretos. Seja como for, ele será julgado nas urnas. Uma coisa, no entanto, aconteceu: Saddam e o seu staff de gangsters foi derrubado. Apesar de tudo – isto é, apesar da (falsa) ideia que se tentado vender à opinião pública, de que o Iraque pós-Saddam é só caos e miséria - creio que o abanão que importava fazer na região, foi levado a cabo.
2.ª) Não entendo a comparação com o Plano Marshall. Os tempos são outros, as condições completamente diferentes. Tão absurdo é usar o Plano Marshall para defender a intervenção norte-americana como o contrário.
Por último, um esclarecimento: eu nunca me senti ofendido com as tuas posições. E jamais te acusei de esquerdismo radical.
Deixo-te um editorial do Daily Telegraph, sobre este assunto. Um grande abraço Luis.

The case for war
(Filed: 03/10/2003)
Opponents of the war on Saddam Hussein are cock-a-hoop that, in the months since liberation, the inter-allied Iraq Survey Group (ISG) has not yet discovered weapons of mass destruction. As far as they are concerned, this invalidates the main reason for sending troops into harm's way. But are the ISG's findings the last word on the matter?
After all, the search for WMD was very slow off the mark and was not a high military priority in the days following liberation. Key documentation appears to have been destroyed by American troops as conventional hostilities came to a close. The allies were also not of the quickest in rounding up suspected Iraq nuclear scientists and other technicians. Even now, but especially in the chaos that obtained after the overthrow of Saddam, the borders of the country were highly porous.
As John Bolton, the US Under-Secretary of State, noted in his recent congressional testimony, there is a serious case for the contention that WMD were secreted by the Ba'athists into the neighbouring rogue state of Syria (just as they did during the Gulf war of 1990-91, when they sent some of their best aircraft into the "safe-keeping" of their deadly foes in Islamist Iran). Above all, Iraq is a large country and the Ba'athists - trained by the Soviets and possessed of much native cunning - were masters of deception. We know for sure that Saddam himself existed, but that has not made locating him any easier.
The survey confirms that Iraq was in violation of UN resolutions on its WMD programmes. Are the opponents of the war seriously suggesting that Saddam should have been allowed to fulfil what was, at minimum, a desire to acquire such weapons? The answer is obviously not. But what can be said is that possession of WMD alone was a dangerously narrow basis on which to advocate the case for war.
The better argument for overthrowing Saddam was that put forward by figures such as Paul Wolfowitz, the US Deputy Defence Secretary: that the radical regimes of the Middle East that had given a haven to terrorists over the years had to be fatally weakened after September 11, so that more pluralistic forces could emerge in the region.
The weapons that such regimes possessed, and that they might have passed to suicidal sub-state forces, were mere symptoms of their totalitarian nature. WMD added much to their subversive muscle, but were not the be-all and end-all of the threat posed. Had Tony Blair couched the matter in broader terms than those set by the UN, he might be in less political difficulty now."

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