O MacGuffin

quarta-feira, agosto 27, 2003

NOTAS SOLTAS E BREVES SOBRE O CONSERVADORISMO

”It is a general popular error to imagine the loudest complainers for the public to be the most anxious for its welfare.” Edmund Burke

”To complain of the age we live in, to murmur at the present possessors of power, to lament the past, to conceive extravagant hopes of the future, are the common dispositions of the greatest part of mankind”. Edmund Burke

1. Por definição, uma tradição comporta uma série de elementos que foram alvo de um teste: o do tempo. Consequentemente, foram sendo transmitidos, de geração em geração. Em princípio, esses elementos são elementos que importa preservar. Mas nem todos. Olhadas uma a uma, nem todas as tradições são boas. E há tradições que nem sequer o são (cf. “The Invention of Tradition”, edição de Eric Hobsbawm e Terence Ranger).
A filosofia do tradicionalismo é uma filosofia selectiva. Qualquer injustiça social que derive da tradição, qualquer perigo potencial associado à tradição, é - com o tempo, raramente por decreto - abandonado ou ultrapassado.
Em termos de princípio, há, de facto, um atributo na veneração dos conservadores pelo que é «antigo» e tradicional: a crença de que, por muito obsoleta que uma dada estrutura ou modus vivendi possa ser, pode existir nela uma função progressiva e ainda vital, de que o homem tira proveito psicológica e sociologicamente. O factor tempo - aliado ao «preconceito» no comportamento humano, onde se joga o tipo de conhecimento de que William James e Oakeshott falavam (um «conhecimento de» e não um «conhecimento acerca») – é seminal no conservadismo.

2. O que muitas vezes está por detrás da tradição, e que é querido ao conservador, é uma forma de conhecimento adquirido através da experiência e da revelação da vida prática, incapaz de ser transmitido by the book. É esse aspecto prático - esse sentido de oportunidade - que é próximo do ideário conservador, e que colide com a maneira como o utopista e o reformista exercem uma devoção por regras, princípios e abstracções que levam a uma voragem e a uma vertigem para, por exemplo, lidar com as «massas», em vez de lidar com pessoas heterogéneas: pais, trabalhadores, consumidores, eleitores, clientes, munícipes, etc. Todas elas com diferentes aspirações, capacidades, motivações e objectivos.

3. O conservador recusa veementemente o denominado “espírito da inovação” quando alicerçado no culto da mudança pela mudança. O conservador é incapaz de dar ênfase a essa necessidade superficial de excitação e motivação por meio de incessantes novidades; a fraqueza idiota de pensar que só na «reforma» e na «mudança» o homem se realiza. Da mesma forma que Disraeli declarou guerra aos estadistas que procuraram formar instituições políticas com base em princípios abstractos de ciência teórica (em vez de lhes permitir que brotassem da evolução natural), o conservador percebe que o conhecimento e a organização de uma sociedade deve ser fruto de um processo lento e aturado, onde estão envolvidas pessoas e não teorias ou modelos abstractos. E que esse processo é muitas vezes inter-geracional. Uma espécie de contrato de continuidade. ”Society is indeed a contract. It becomes a partnership not only between those who are living, but between those who are living, those who are dead, and those who are to be born”, escreveu Burke. O espírito subjacente a esta frase é completamente acessório para o progressista ou para o utopista reformador. Para estes o importante não é o que foi feito, mas sim o que se vai fazer. Os edifícios do passado são só isso: passado. ”Quando não é necessário mudar, é necessário não mudar”, afirmou Falkland. É este o contributo do conservador no mundo de hoje: colocar algumas pitadas de bom senso na cabeça de quem tenta mudar o mundo, chamando a atenção para o facto de já existirem experiências, vivências e resultados no terreno que funcionam e que se devem aproveitar. Sob pena de cairmos num vazio. Um hiato que pode levar à deriva.

4. Hoje em dia, o conservador tem a noção de que existem reformas que importa fazer. Assim como existem mudanças que ansiosamente se aguardam. Mas a «base de trabalho» do conservador assenta na ideia de que, a ser necessária (poderá não o ser), a mudança deve ser feita moderada e calmamente. Passo a passo. Com e para as pessoas. E com o ênfase no aperfeiçoamento do que já existe e não no corte abrupto.

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