IR A PORTUGAL COMPRAR CARAMELOS
Recebi um mail de um leitor, contendo o seguinte comentário: “Em relação ao seu texto sobre o Fórum Social Português, pareceu-me vislumbrar uma espécie de conformismo e de felicidade perene em relação ao nível de desenvolvimento do seu país. Acha que é caso para isso? Está contente com o país que tem?” Respondo ao meu caro leitor, ‘postando’ um texto meu, escrito há uns meses atrás, sobre a diferença entre Portugal e Espanha.
A SÍNDROME H. A.
O meu amigo João vai regularmente a Espanha. Sempre que regressa, costuma referir-se à deslocação nos seguintes termos: “Fui ali, à Europa”. Eu invariavelmente envergo o meu sorriso amarelo, de orgulho pátrio ferido e de resignação pesarosa. E questiono-me: a «Europa» começará e acabará literalmente em Espanha – dependendo se nos deslocamos para oriente ou se regressamos para ocidente?
“Eu ainda sou do tempo” em que se olhava para Espanha como uma espécie de parente pobre. “Vamos a Badajoz comprar caramelos”, dizia-se, em tempos não muito distantes, em jeito de chacota. Badajoz era uma cidade triste, repleta de velhas carcaças Seat, lojecas ao melhor estilo Praça de Espanha, povoada por gente cabisbaixa e indiferente. No fundo, essas observações não passavam de acessos de ignorância e distracção. Espanha detinha, já então, um potencial de crescimento e um poderio industrial e comercial que em nada tinha a ver com o nosso. O que veio a acontecer só surpreendeu os mais ingénuos.
Com o passar dos anos, os «caramelos» compraram-nos os Bancos, as grandes e médias empresas e invadiram-nos com os seus produtos. São eficientíssimos nas obras publicas, o associativismo funciona, as instituições do estado revelam dinamismo, o rendimento médio é muito superior ao nosso e, pasme-se, os bens de primeira necessidade são, regra geral, mais baratos que os nossos.
De entre as inúmeras vantagens da denominada «globalização», encontra-se esta: a de podermos perceber a dimensão e alcance das nossas fraquezas. Quando as barreiras caem e os proteccionismos deixam de ser exercidos, aquilo que até então nos parecia rosáceo toma contornos bem mais cinzentos. No caso português, a máscara caiu em definitivo. Portugal, quando comparado com Espanha, é hoje um país atado e sem rasgos de génio. Falta-lhe coragem e espirito empreendedor. A soberba mistura-se com a ostentação e a saloiice das obras megalómanas. Podemos não ter um rendimento disponível aceitável, saneamento básico, habitações condignas, vias de comunicação decentes, bibliotecas apetrechadas e modernas mas, caríssimos, temos um Parque das Nações, uma cidade capital da «cóltura» e, dentro em breve, até estádios da bola ultramodernos. À volta destes símbolos do nosso progresso, assistimos a um pouco de tudo. No plano da Educação, proliferam que nem cogumelos os cursos de Formação com os títulos mais incríveis para enganar otários (“Curso de Multimédia”) e as universidades raramente se interessam pelo dia-a-dia das empresas e da sociedade em geral (por receio de contágio, suponho). Vive-se numa espécie de amorfismo lodoso, servido por uma pesada máquina burocrática (cujo paradigma é o Funcionalismo Público) e por um temor à inovação e à investigação. Mesmo o mais lesto espirito empreendedor esmorece perante a montanha de procedimentos e de portas que tem necessariamente de ultrapassar. O tão apregoado espirito empreendedor, que Alexis de Tocqueville tão brilhantemente descrevia no sec. XIX, aquando da sua visita aos EUA, ainda por aqui não passou. Ou melhor: vai passando. Em boa verdade, quem não tiver uma «muleta», um boy ou um conhecimento precioso no sitio certo, tem a sua vida dificultada e partirá com nítida desvantagem (mergulhado ainda num universo de especulação desenfreada). Dizem que o mal é do fado e da inconsequência crónica do nosso devir. Pois eu diria antes que o mal é do S. H. A.: Síndroma da Hipermediocridade Adquirida.
Caro leitor: Contente com o meu país? Mais ou menos. Satisfeito? Nem por isso. Contra? Nunca.
Qual é o negocio mais lucrativo do mundo? Comprar um espanhol pelo que ele vale e vendê-lo pelo que ele pensa que vale.
Recebi um mail de um leitor, contendo o seguinte comentário: “Em relação ao seu texto sobre o Fórum Social Português, pareceu-me vislumbrar uma espécie de conformismo e de felicidade perene em relação ao nível de desenvolvimento do seu país. Acha que é caso para isso? Está contente com o país que tem?” Respondo ao meu caro leitor, ‘postando’ um texto meu, escrito há uns meses atrás, sobre a diferença entre Portugal e Espanha.
A SÍNDROME H. A.
O meu amigo João vai regularmente a Espanha. Sempre que regressa, costuma referir-se à deslocação nos seguintes termos: “Fui ali, à Europa”. Eu invariavelmente envergo o meu sorriso amarelo, de orgulho pátrio ferido e de resignação pesarosa. E questiono-me: a «Europa» começará e acabará literalmente em Espanha – dependendo se nos deslocamos para oriente ou se regressamos para ocidente?
“Eu ainda sou do tempo” em que se olhava para Espanha como uma espécie de parente pobre. “Vamos a Badajoz comprar caramelos”, dizia-se, em tempos não muito distantes, em jeito de chacota. Badajoz era uma cidade triste, repleta de velhas carcaças Seat, lojecas ao melhor estilo Praça de Espanha, povoada por gente cabisbaixa e indiferente. No fundo, essas observações não passavam de acessos de ignorância e distracção. Espanha detinha, já então, um potencial de crescimento e um poderio industrial e comercial que em nada tinha a ver com o nosso. O que veio a acontecer só surpreendeu os mais ingénuos.
Com o passar dos anos, os «caramelos» compraram-nos os Bancos, as grandes e médias empresas e invadiram-nos com os seus produtos. São eficientíssimos nas obras publicas, o associativismo funciona, as instituições do estado revelam dinamismo, o rendimento médio é muito superior ao nosso e, pasme-se, os bens de primeira necessidade são, regra geral, mais baratos que os nossos.
De entre as inúmeras vantagens da denominada «globalização», encontra-se esta: a de podermos perceber a dimensão e alcance das nossas fraquezas. Quando as barreiras caem e os proteccionismos deixam de ser exercidos, aquilo que até então nos parecia rosáceo toma contornos bem mais cinzentos. No caso português, a máscara caiu em definitivo. Portugal, quando comparado com Espanha, é hoje um país atado e sem rasgos de génio. Falta-lhe coragem e espirito empreendedor. A soberba mistura-se com a ostentação e a saloiice das obras megalómanas. Podemos não ter um rendimento disponível aceitável, saneamento básico, habitações condignas, vias de comunicação decentes, bibliotecas apetrechadas e modernas mas, caríssimos, temos um Parque das Nações, uma cidade capital da «cóltura» e, dentro em breve, até estádios da bola ultramodernos. À volta destes símbolos do nosso progresso, assistimos a um pouco de tudo. No plano da Educação, proliferam que nem cogumelos os cursos de Formação com os títulos mais incríveis para enganar otários (“Curso de Multimédia”) e as universidades raramente se interessam pelo dia-a-dia das empresas e da sociedade em geral (por receio de contágio, suponho). Vive-se numa espécie de amorfismo lodoso, servido por uma pesada máquina burocrática (cujo paradigma é o Funcionalismo Público) e por um temor à inovação e à investigação. Mesmo o mais lesto espirito empreendedor esmorece perante a montanha de procedimentos e de portas que tem necessariamente de ultrapassar. O tão apregoado espirito empreendedor, que Alexis de Tocqueville tão brilhantemente descrevia no sec. XIX, aquando da sua visita aos EUA, ainda por aqui não passou. Ou melhor: vai passando. Em boa verdade, quem não tiver uma «muleta», um boy ou um conhecimento precioso no sitio certo, tem a sua vida dificultada e partirá com nítida desvantagem (mergulhado ainda num universo de especulação desenfreada). Dizem que o mal é do fado e da inconsequência crónica do nosso devir. Pois eu diria antes que o mal é do S. H. A.: Síndroma da Hipermediocridade Adquirida.
Caro leitor: Contente com o meu país? Mais ou menos. Satisfeito? Nem por isso. Contra? Nunca.
0 Comentários:
Enviar um comentário
Subscrever Enviar feedback [Atom]
<< Página inicial