Mudar de vida
Vai longa, embora quase no fim, a discussão blogosférica em torno dos “livros que não mudaram a vida”, da qual deu boa conta a Charlotte. Arrisco, ainda assim, um derradeiro comentário, em jeito de conclusão.
Em primeiro lugar, parece-me que a lista foi criada com um intuito: o de afirmar, com certo ar blasé, que determinadas obras, supostamente «incontornáveis», não aqueceram nem arrefeceram o dono da lista. Dito de outra forma, a lista foi criada para, de alguma forma, chacotear ou menosprezar obras eminentes, ou, pelo menos, pôr em causa as putativas virtudes ou os inquestionáveis alcances que são atribuídos às obras «(con)sagradas». Nada de mais inconsequente e pateta, portanto. Desde logo porque, enumerar cinco, dez ou quinze livros «que não mudaram a minha vida» parece querer significar que todos os outros o fizeram. Absurdo total. E, claro, há obras que pura e simplesmente não podem ser menosprezadas ou menorizadas.
Em segundo lugar, é evidente que os únicos livros capazes de mudar verdadeiramente a vida de alguém – e repare-se que para mudar «a vida», à leitura de uma determinada obra tem de corresponder um sem número de circunstâncias que caprichosamente se acotovelaram num período específico, concorrendo para um momentum excepcional – serão, sobretudo, os primeiros livros, ou seja, aquelas obras que cada um de nós «descobriu» no início da experiência de ler. Mas mesmo assim, como já referi, teriam de estar reunidas circunstâncias especiais, provavelmente dramáticas, que, conjugadas com a leitura, determinariam essa mudança. Exemplo: é provável que um jovem que nasceu e cresceu no seio de um regime totalitarista como foi o regime soviético e que, em determinado momento, tenha tido acesso ao Arquipélago de Gulag do Solzhenitsyn ou ao A Tomada do Poder de Milosz, pudesse afirmar que aqueles livros mudaram a sua vida.
Em terceiro lugar, estou em crer que à medida que se vão consumindo livros, a probabilidade de encontrar uma obra que mude a vida de alguém será cada vez menor (e estamos já a falar de graus de probabilidade baixíssimos). Para o ser humano médio, habituado a uma vida normal no actual estado civilizacional (a ocidente), e após anos de leitura de obras «maiores» (e dispenso agora a discussão sobre o que é uma obra «maior»), é completamente falso afirmar, ou tratar-se-á de um grosseiro equivoco, que determinada obra voltou a mudar (se é que alguma alguma vez mudou) a sua vida.
E, chegados aqui, teremos que entrar na discussão dos graus de mudança. Se o «mudar de vida» se refere a uma mudança radical de mentalidade ou a uma profunda alteração da perspectiva da nossa existência que tenha, ela própria, conduzido a uma mudança filosófica e/ou comportamental indelével, então meus amigos: 99,99% dos livros que lemos não mudaram coisa nenhuma. Se, pelo contrário, o «mudar de vida» significa uma abertura de cabeça que nos permitiu observar o mundo de outra forma ou uma experiência literária que nos encantou e da qual retirámos um prazer raro, colocando o autor entre os nossos preferidos, haverá certamente muitos livros elegíveis para essa categoria (e mesmo assim não serão às dezenas).
Indo pela versão da mudança «a sério», a minha tese é clara: são raríssimos os livros capazes de mudar a vida de alguém e, a consegui-lo, a sua leitura terá de ter sido conjugada com momentos ou circunstâncias pessoais muito concretas e excepcionais, «exteriores» à obra. Mesmo assim, duvido que alguém um dia consiga construir uma lista de livros que «mudaram a sua vida» que ultrapasse três ou quatro obras.
Em primeiro lugar, parece-me que a lista foi criada com um intuito: o de afirmar, com certo ar blasé, que determinadas obras, supostamente «incontornáveis», não aqueceram nem arrefeceram o dono da lista. Dito de outra forma, a lista foi criada para, de alguma forma, chacotear ou menosprezar obras eminentes, ou, pelo menos, pôr em causa as putativas virtudes ou os inquestionáveis alcances que são atribuídos às obras «(con)sagradas». Nada de mais inconsequente e pateta, portanto. Desde logo porque, enumerar cinco, dez ou quinze livros «que não mudaram a minha vida» parece querer significar que todos os outros o fizeram. Absurdo total. E, claro, há obras que pura e simplesmente não podem ser menosprezadas ou menorizadas.
Em segundo lugar, é evidente que os únicos livros capazes de mudar verdadeiramente a vida de alguém – e repare-se que para mudar «a vida», à leitura de uma determinada obra tem de corresponder um sem número de circunstâncias que caprichosamente se acotovelaram num período específico, concorrendo para um momentum excepcional – serão, sobretudo, os primeiros livros, ou seja, aquelas obras que cada um de nós «descobriu» no início da experiência de ler. Mas mesmo assim, como já referi, teriam de estar reunidas circunstâncias especiais, provavelmente dramáticas, que, conjugadas com a leitura, determinariam essa mudança. Exemplo: é provável que um jovem que nasceu e cresceu no seio de um regime totalitarista como foi o regime soviético e que, em determinado momento, tenha tido acesso ao Arquipélago de Gulag do Solzhenitsyn ou ao A Tomada do Poder de Milosz, pudesse afirmar que aqueles livros mudaram a sua vida.
Em terceiro lugar, estou em crer que à medida que se vão consumindo livros, a probabilidade de encontrar uma obra que mude a vida de alguém será cada vez menor (e estamos já a falar de graus de probabilidade baixíssimos). Para o ser humano médio, habituado a uma vida normal no actual estado civilizacional (a ocidente), e após anos de leitura de obras «maiores» (e dispenso agora a discussão sobre o que é uma obra «maior»), é completamente falso afirmar, ou tratar-se-á de um grosseiro equivoco, que determinada obra voltou a mudar (se é que alguma alguma vez mudou) a sua vida.
E, chegados aqui, teremos que entrar na discussão dos graus de mudança. Se o «mudar de vida» se refere a uma mudança radical de mentalidade ou a uma profunda alteração da perspectiva da nossa existência que tenha, ela própria, conduzido a uma mudança filosófica e/ou comportamental indelével, então meus amigos: 99,99% dos livros que lemos não mudaram coisa nenhuma. Se, pelo contrário, o «mudar de vida» significa uma abertura de cabeça que nos permitiu observar o mundo de outra forma ou uma experiência literária que nos encantou e da qual retirámos um prazer raro, colocando o autor entre os nossos preferidos, haverá certamente muitos livros elegíveis para essa categoria (e mesmo assim não serão às dezenas).
Indo pela versão da mudança «a sério», a minha tese é clara: são raríssimos os livros capazes de mudar a vida de alguém e, a consegui-lo, a sua leitura terá de ter sido conjugada com momentos ou circunstâncias pessoais muito concretas e excepcionais, «exteriores» à obra. Mesmo assim, duvido que alguém um dia consiga construir uma lista de livros que «mudaram a sua vida» que ultrapasse três ou quatro obras.
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