Uma ninharia, dizem
(ou «A TSU explicada às criancinhas»)
A Taxa Social Única (TSU) é um instrumento fiscal usado para dar cumprimento à obrigação contributiva a cargo das entidades empregadoras e dos trabalhadores, destinada ao financiamento do sistema previdencial que tem por base uma relação sinalagmática directa entre a obrigação legal de contribuir e o direito a um conjunto diverso de prestações sociais (reforma, desemprego, doença, parentalidade, invalidez, morte, etc.).
A taxa contributiva global do regime geral (falemos só deste), é, actualmente, de 34,75%, cabendo 23,75% à entidade empregadora (contribuições) e 11% ao trabalhador (quotizações). Significa isto que, na folha salarial mensal do trabalhador, às diversas remunerações que constituem a base da incidência contributiva (remuneração base; comissões, bónus ou prémios; remuneração por trabalho nocturno ou suplementar; subsídios de férias e de Natal; subsídio de refeição na parte que exceda o montante de 6,41€/dia; etc.) é retirado 11% para o sistema previdencial.
À entidade empregadora, vulgo «empresa», cabe entregar ao Estado o montante correspondente à aplicação de 23,75% sobre a referida base de incidência.
A taxa contributiva global do regime geral está desagregada por cada eventualidade que integra o regime dos trabalhadores por conta de outrem, ou seja, por cada categoria «assistencialista» a que o sistema previdencial está obrigado a dar resposta quando tal se justifica:
Doença: 1,41%
Doença Profissional: 0,50%
Parentalidade: 0,76%
Desemprego: 5,14%
Invalidez: 4,29%
Velhice: 20,21%
Morte: 2,44%
Tudo somado: 34,75%.
A um trabalhador que tenha uma remuneração base mensal de 1.000,00€ (vamos partir do princípio de que não há remunerações de outra natureza nesse mês), é descontado (para além da retenção em sede de IRS), 11% a título de quotização para a Segurança Social (ou seja, 110,00€). Por outro lado, a empresa é obrigada a entregar não apenas o valor dessa retenção (os referidos 11%, ou 110,00€ no exemplo), como também a contribuição que lhe coube em sorte: 23,75% sobre a base de incidência total (no exemplo, 1.000,00€ x 23,75% = 237,50€). Até ao dia 20 do mês seguinte ao do recibo de ordenado, a empresa terá de entregar ao Estado, relativamente a esse trabalhador, 110,00€ + 237,50€ = 347,50€.
Indo um pouco mais além no exemplo, partindo do pressuposto de que o trabalhador aufere um subsídio de refeição por dia trabalhado de 6,41€, e que nesse mês trabalhou 21 dias, eis o exemplo de uma folha de remuneração:
Remuneração Base: 1.000,00€
Subsídio de Refeição: 134,61€ (6,41€ x 21 dias)
Retenção IRS: 90,00€ (9% - tabela I “Não casado, sem dependentes”, por exemplo)
Retenção Seg. Social: 110,00€
Valor Líquido (a receber): 934,61€
Qual o custo nominal desse trabalhador, neste mês em particular, para a empresa? Simples:
1.000,00€ + 134,61€ + 237,50€ = 1.372,11€
A diferença entre o custo para a empresa e o valor líquido que o trabalhador vai receber (1.372,11€ - 934,61€ = 437,50€), corresponde à soma de impostos que o Estado irá arrecadar nesse mês, envolvendo esta relação laboral: 110,00€ + 237,50€ + 90,00€ = 437,50€.
O custo para a empresa acima referido não leva, contudo, em conta o efeito dos subsídios de férias e de Natal. Contando com esse efeito, e tendo por base uma média anual de 228 dias úteis trabalhados, o custo médio mensal efectivo de um trabalhador com uma remuneração base de 1.000,00€, com um subsídio de refeição de 6,41€/dia e sem mais nenhum tipo de remuneração, é de:
[[(1.000,00 x 14) x 1,2375] + (228 x 6,41)]/12 = (17.325,00 + 1.641,48)/12 = 1.580,54€
À empresa, esse trabalhador custa não 1.000,00€, mas 1.580,54€.
Muito se tem falado sobre o efeito de um «desconto» na percentagem da contribuição da entidade empregadora (23,75%). Tomemos como exemplo uma empresa com 30 trabalhadores com ordenados médios na ordem dos 1.000,00€/mês, prestes a beneficiar de uma redução de 10 p.p. (13,75% em vez de 23,75%) na contribuição para a Segurança Social:
Total dos encargos anuais a 23,75%: 99.750,00€
Total dos encargos anuais a 13,75%: 57.750,00€
Diferença (a menos): 42.000,00€/ano, 3.500,00€/mês
Neste exemplo, é verdade que uma redução em 10 p.p., apesar de o permitir/suportar, poderá não dar lugar à contratação de mais dois trabalhadores (da mesma forma que «pode não dar lugar» não significa «não vai dar lugar sob circunstância alguma»). Mas perante a actual conjuntura, só um mentecapto (e perdoem-me os mentecaptos, classe a que não raras vezes pertenço) pode afirmar ou defender que este tipo de efeito «não tem significado» ou é «residual». Imaginemos uma empresa com 100 trabalhadores: podemos estar perante uma redução de custos na ordem dos 140.000,00€/ano (mantendo os pressupostos do exemplo). Residual?!
Além de que, teoricamente, uma redução de custos provocada pela descida deste encargo, poderá resultar num aumento da colecta em sede de IRC, de igual grandeza. Em teoria, a perda de receita para o Estado é menor do que se prevê, caso a empresa não resolva alocar ou absorver essa poupança na contratação de mais pessoal, no custeio de mais formação para os seus recursos humanos, na implementação de um modelo de gestão da qualidade, ou pura e implesmente no apoio à tesouraria.
Resta-nos o efeito dessa redução no «equilíbrio» de forças das diferentes categorias de «eventualidades». Não me parece um bicho de sete ou setecentas cabeças ajustar a forma como actualmente a taxa está desagregada, sobretudo se associarmos ao efeito da redução da receita outros factores: a redução do período de atribuição do subsídio de desemprego; o aumento da idade de reforma; o crescente recurso, por parte das famílias, a seguros de saúde, fora do sistema; o aumento do nível e da eficácia da fiscalização; e por aí fora.
O problema da TSU anda a ser disfarçado pela putativa «insignificância» da medida. A verdadeira questão, é outra: num Estado socialista, qualquer proposta de redução de impostos é anátema, com direito a desmaios, gritos e indignações se essa redução estiver associada às «entidades empregadoras», esse bando de malfeitores.
A Taxa Social Única (TSU) é um instrumento fiscal usado para dar cumprimento à obrigação contributiva a cargo das entidades empregadoras e dos trabalhadores, destinada ao financiamento do sistema previdencial que tem por base uma relação sinalagmática directa entre a obrigação legal de contribuir e o direito a um conjunto diverso de prestações sociais (reforma, desemprego, doença, parentalidade, invalidez, morte, etc.).
A taxa contributiva global do regime geral (falemos só deste), é, actualmente, de 34,75%, cabendo 23,75% à entidade empregadora (contribuições) e 11% ao trabalhador (quotizações). Significa isto que, na folha salarial mensal do trabalhador, às diversas remunerações que constituem a base da incidência contributiva (remuneração base; comissões, bónus ou prémios; remuneração por trabalho nocturno ou suplementar; subsídios de férias e de Natal; subsídio de refeição na parte que exceda o montante de 6,41€/dia; etc.) é retirado 11% para o sistema previdencial.
À entidade empregadora, vulgo «empresa», cabe entregar ao Estado o montante correspondente à aplicação de 23,75% sobre a referida base de incidência.
A taxa contributiva global do regime geral está desagregada por cada eventualidade que integra o regime dos trabalhadores por conta de outrem, ou seja, por cada categoria «assistencialista» a que o sistema previdencial está obrigado a dar resposta quando tal se justifica:
Doença: 1,41%
Doença Profissional: 0,50%
Parentalidade: 0,76%
Desemprego: 5,14%
Invalidez: 4,29%
Velhice: 20,21%
Morte: 2,44%
Tudo somado: 34,75%.
A um trabalhador que tenha uma remuneração base mensal de 1.000,00€ (vamos partir do princípio de que não há remunerações de outra natureza nesse mês), é descontado (para além da retenção em sede de IRS), 11% a título de quotização para a Segurança Social (ou seja, 110,00€). Por outro lado, a empresa é obrigada a entregar não apenas o valor dessa retenção (os referidos 11%, ou 110,00€ no exemplo), como também a contribuição que lhe coube em sorte: 23,75% sobre a base de incidência total (no exemplo, 1.000,00€ x 23,75% = 237,50€). Até ao dia 20 do mês seguinte ao do recibo de ordenado, a empresa terá de entregar ao Estado, relativamente a esse trabalhador, 110,00€ + 237,50€ = 347,50€.
Indo um pouco mais além no exemplo, partindo do pressuposto de que o trabalhador aufere um subsídio de refeição por dia trabalhado de 6,41€, e que nesse mês trabalhou 21 dias, eis o exemplo de uma folha de remuneração:
Remuneração Base: 1.000,00€
Subsídio de Refeição: 134,61€ (6,41€ x 21 dias)
Retenção IRS: 90,00€ (9% - tabela I “Não casado, sem dependentes”, por exemplo)
Retenção Seg. Social: 110,00€
Valor Líquido (a receber): 934,61€
Qual o custo nominal desse trabalhador, neste mês em particular, para a empresa? Simples:
1.000,00€ + 134,61€ + 237,50€ = 1.372,11€
A diferença entre o custo para a empresa e o valor líquido que o trabalhador vai receber (1.372,11€ - 934,61€ = 437,50€), corresponde à soma de impostos que o Estado irá arrecadar nesse mês, envolvendo esta relação laboral: 110,00€ + 237,50€ + 90,00€ = 437,50€.
O custo para a empresa acima referido não leva, contudo, em conta o efeito dos subsídios de férias e de Natal. Contando com esse efeito, e tendo por base uma média anual de 228 dias úteis trabalhados, o custo médio mensal efectivo de um trabalhador com uma remuneração base de 1.000,00€, com um subsídio de refeição de 6,41€/dia e sem mais nenhum tipo de remuneração, é de:
[[(1.000,00 x 14) x 1,2375] + (228 x 6,41)]/12 = (17.325,00 + 1.641,48)/12 = 1.580,54€
À empresa, esse trabalhador custa não 1.000,00€, mas 1.580,54€.
Muito se tem falado sobre o efeito de um «desconto» na percentagem da contribuição da entidade empregadora (23,75%). Tomemos como exemplo uma empresa com 30 trabalhadores com ordenados médios na ordem dos 1.000,00€/mês, prestes a beneficiar de uma redução de 10 p.p. (13,75% em vez de 23,75%) na contribuição para a Segurança Social:
Total dos encargos anuais a 23,75%: 99.750,00€
Total dos encargos anuais a 13,75%: 57.750,00€
Diferença (a menos): 42.000,00€/ano, 3.500,00€/mês
Neste exemplo, é verdade que uma redução em 10 p.p., apesar de o permitir/suportar, poderá não dar lugar à contratação de mais dois trabalhadores (da mesma forma que «pode não dar lugar» não significa «não vai dar lugar sob circunstância alguma»). Mas perante a actual conjuntura, só um mentecapto (e perdoem-me os mentecaptos, classe a que não raras vezes pertenço) pode afirmar ou defender que este tipo de efeito «não tem significado» ou é «residual». Imaginemos uma empresa com 100 trabalhadores: podemos estar perante uma redução de custos na ordem dos 140.000,00€/ano (mantendo os pressupostos do exemplo). Residual?!
Além de que, teoricamente, uma redução de custos provocada pela descida deste encargo, poderá resultar num aumento da colecta em sede de IRC, de igual grandeza. Em teoria, a perda de receita para o Estado é menor do que se prevê, caso a empresa não resolva alocar ou absorver essa poupança na contratação de mais pessoal, no custeio de mais formação para os seus recursos humanos, na implementação de um modelo de gestão da qualidade, ou pura e implesmente no apoio à tesouraria.
Resta-nos o efeito dessa redução no «equilíbrio» de forças das diferentes categorias de «eventualidades». Não me parece um bicho de sete ou setecentas cabeças ajustar a forma como actualmente a taxa está desagregada, sobretudo se associarmos ao efeito da redução da receita outros factores: a redução do período de atribuição do subsídio de desemprego; o aumento da idade de reforma; o crescente recurso, por parte das famílias, a seguros de saúde, fora do sistema; o aumento do nível e da eficácia da fiscalização; e por aí fora.
O problema da TSU anda a ser disfarçado pela putativa «insignificância» da medida. A verdadeira questão, é outra: num Estado socialista, qualquer proposta de redução de impostos é anátema, com direito a desmaios, gritos e indignações se essa redução estiver associada às «entidades empregadoras», esse bando de malfeitores.
4 Comentários:
..gabo-lhe a paciência!
Se fosse só a paciência...
Queria deixar-lhe aqui algumas questões:
- O que entende por "ajustar a forma como actualmente a taxa está desagregada"?;
- Acha bem a redução do período de atribuição do subsídio de desemprego?;
- Acha bem o aumento da idade da reforma, para todos? E até que idade?;
- Acha que todas as famílias têm capacidade para recorrer a seguros de saúde? Acha que quem a eles recorre deixa de usar o SNS?
- Acha que existe muito mais margem de aumento de receita por via da fiscalidade?
Obrigado.
- O que entende por "ajustar a forma como actualmente a taxa está desagregada"?
Alterar a ponderação atribuída a cada categoria. Por exemplo, a assistência a «doença profissional» devia ser da exclusiva responsabilidade da entidade empregadora, via seguro de acidentes pessoais e/ou de trabalho. Por exemplo, atribuindo uma maior ponderação à doença, diminuindo a do desemprego. E por aí fora.
- Acha bem a redução do período de atribuição do subsídio de desemprego?
Acho, desde que para um nível razoável. Acha razoável 540 dias ou 450 dias, como acontece nalguns casos?
- Acha bem o aumento da idade da reforma, para todos? E até que idade?
Em teoria, não acho, mas na prática não vejo alternativa, se queremos salvar o Estado Providência tal como o conhecemos, ou seja, tornar financeiramente sustentável a Segurança Social. É claro que o aumento da idade de reforma deve ter um limite. Não vejo mal nenhum se se harmonizar o aumento da idade de reforma e, no caso português, se se aumentar mais um ou dois anos.
- Acha que todas as famílias têm capacidade para recorrer a seguros de saúde? Acha que quem a eles recorre deixa de usar o SNS?
Não, não acho que TODAS as famílias têm capacidade para recorrer a seguros de saúde. O que eu disse é que, dado o número crescente de famílias que recorrem a seguros de saúde, talvez fosse boa a ideia de diminuir a assistência para os agregados que optaram livremente por essa opção. Dito de outra forma, não faz sentido que uma família que optou por um seguro de saúde (e que tem, portanto, meios financeiro para o fazer), seja tratada de igual modo (em termos de gratuidade) que uma família pobre, sem seguro de saúde. Daqui se depreende, finalmente, que não defendo que quem recorre a seguros de saúde deixe de recorrer ao SNS.
- Acha que existe muito mais margem de aumento de receita por via da fiscalidade?
Não.
Todas estas sugestões partem de um pressuposto: a ideia de manter o Estado Social tal como o conhecemos, não aumentando a carga fiscal sobre o trabalho.
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