Um livro que não precisa de prescrição médica (mas devia)
Não há como não recomendar isto. Aliás, se o mundo fosse um lugar justo, seria escusado exaltar as qualidades literárias e a lucidez desta prosa, agora compilada em livro. Como não é, insisto naquilo que me parece ser o óbvio ululante: o Alberto Gonçalves é um dos mais talentosos, corajosos e desassombrados cronistas da sua geração. O seu olhar mordaz, irónico e iconoclasta, constitui alimento augusto para quem queira manter um lampejo de sobriedade e uma reserva de sanidade mental face a um mundo e a uma realidade que teima em desafiar, numa base diária, os mais elementares conceitos e os limites do que nos parecia óbvio, pacífico e racional. O pessimismo inteligente e militante que perpassa as suas crónicas, reflecte-se numa escrita elegante, sem lugar a indignações mais ou menos histéricas. O sentido de humor, sempre presente, impede a auto-exclusão e põe a nu a insanidade mais ou menos vigente de um mundo que, aspirando ao racional e a um desesperado ideal de progresso, acaba a amplificar de forma ensurdecedora os ímpios caminhos da natureza humana. As crónicas do Alberto Gonçalves despertam-nos para uma realidade que há muito andamos a tentar disfarçar (mal), para gáudio de humoristas, satíricos e o homem comum que aprendeu a rir de si próprio: saímos há muito pouco tempo da caverna. No fundo, continuamos ridículos, boçais e patéticos, hoje, como há cem ou mil anos atrás. E o pior (ou será o melhor?) é que parecemos gostar disso.
1 Comentários:
Uma calamidade foi o negócio com a pobre Verbo, que já teve melhores dias...; agora falida, espólio entregue à Babel, distribuição caótica; vazio...
Assim fica difícil...
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