O QUE ESTÁ DE ERRADO NESTE CARTOON?
in The Economist
Nada, dirão alguns. Representa, na perfeição, o que de errado se passa no médio-oriente, dirão outros. Genial, dirão, ainda, os mais entusiastas desta mui nobre arte.
Lamento. Há algo de profundamente errado neste cartoon. Do ponto de vista da tese do «ciclo vicioso», o cartoon é perfeito. Muito bom. Mas ele representa o paradigma do tipo de percepção que a ocidente se tem do conflito, dando conta do avançado estado de miopia de que padecem os media ocidentais, incluindo os melhores (é o caso do The Economist).
O que nos mostra o cartoon? Comecemos pelo inicio:
(1) Terrorists attack Israel
(2) Israel cracks down on terror
(3) Civilians are hit in the crackdown (com a imagem da patinha de Sharon a esmagar, em pose de dor e agonia, alguns civis).
Paremos aqui. O cartonista, pessoa de imenso talento, faz aquilo que comum e erradamente se faz (e, sabe Deus, continua a constituir uma fonte inesgotável do que de perverso e injusto se conclui do conflito israelo-palestiniano): olhar os ataques terroristas a Israel como actos padronizados de violência contra uma entidade abstracta, abrangente, que dá pelo nome de “Israel”. Repare-se: o cartonista faz questão de colocar uns bonequinhos a serem esmagados pela pata de Sharon, mas os atentados bombistas iniciais (ponto 1) parecem ser contra um alvo difuso, indefinido, como disse «abstracto». O cartonista omite, entre o ponto 1 e o ponto 2, o que não omite mais à frente, ou seja, uma passagem intermédia, concreta, indelével, brutal: o assassínio de civis inocentes israelitas. Retira-nos essa perspectiva, como se “Israel” fosse, ele próprio, uma individualidade esvaziada de pessoas de carne e osso ou, na pior das hipóteses, recheada de «carne para canhão».
Ao colocar em evidência o esmagamento de civis por parte de Sharon, o cartonista acaba por transmitir, também, a ideia de que é a vontade cega e gratuita de matar civis que move Sharon e o seu governo. O correcto seria: Israel cracks down on terror aiming terrorists but civilians are hit in the crackdown. Uma diferença nada insignificante que não vislumbramos neste cartoon. Nem todos os civis palestinianos são, na prática, «civis» (infelizmente não existe uma exército formal do lado palestiniano a quem apontar e exigir responsabilidades). E quanto ao ”terrorists attack Israel”, seria bom afinar os ouvidos: os gritos mudos das vitimas e o choro dos que sofrem a sua perda, soam bem alto. Para quem estiver disposto a ouvi-los, claro.
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