O MacGuffin: NOVA TENTATIVA

segunda-feira, outubro 04, 2004

NOVA TENTATIVA

Rui Tavares não entendeu o meu ponto. Aqui vai: mesmo que Kerry o achasse (“uma guerra errada, no país errado, no momento errado”), não o deveria ter dito daquela forma.

Em primeiro lugar, porque desmoraliza e desmotiva as tropas que ainda estão no terreno.

Em segundo lugar, porque tal afirmação colide com o masterplan de Kerry, que consiste em chamar a si o «mundo» para com o «mundo» (o mundo do Sr. Chirac, do Sr. Schröder e do Sr. Zapatero) resolver o conflito. Ninguém convence país nenhum a entrar numa guerra que se considera “errada” sob qualquer perspectiva. No mínimo arrisca-se a levar com o velho “quem lhe comeu a carne, que lhe roa os ossos”.

Em terceiro lugar, porque Kerry apoiou a guerra. Não só a apoiou como continua a afirmar que o mundo está melhor sem Saddam. E, a espaços, continua a insinuar, paradoxalmente, que a única coisa que realmente esteve mal foram os erros de cálculo cometidos no terreno – na planificação da ofensiva, na contenção da rebelião, no controlo das fronteiras, etc.

Por todas estas razões, a afirmação de Kerry (de que foi “a guerra errada, no país errado e no momento errado”) é, toda ela, despropositada, contraditória, desnecessária.

Agora, se Rui Tavares me dá licença, devo dizer que concordo com Kerry: as coisas não correram bem. Falhou a planificação, falhou o controlo de fronteiras, falhou a capacidade de antecipar os mais diversos cenários pós-guerra, falhou o respeito para com os prisioneiros de guerra. Mas isso, na minha opinião, não fez daquela ofensiva militar, Ó escândalo dos escândalos!, uma guerra injusta. Pelo menos na medida em que foi menos injusta do que seria perpetuar o regime brutal de Saddam e insistir numa política de embargo. Derrubar um dos piores ditadores do Sec. XX, após anos de incumprimento de resoluções da ONU e durante um embargo altamente nocivo para as populações civis, tornou-a numa guerra justa, no momento certo e no país certo. Quer queiramos, quer não, com o derrube de Saddam abriram-se janelas de oportunidade para o país e para a região, impensáveis há dois anos atrás. A realização de eleições será de uma importância vital para o futuro do Iraque. O Iraque não pode perder esta oportunidade.

Por último, caso se tivessem descoberto as AMD's – evitando-se, assim, a terrível e cruel «mentira», e fazendo da guerra uma guerra «correcta» – não creio que o Sr. al-Zarqawi, o Sr. Bin Laden e os respectivos operacionais estivessem empenhados na reconstrução do Iraque, após o derrube de Saddam. O cenário não seria, por isso, muito diferente do actual. E duvido que os que se colaram à tese da «mentira» estivessem agora caladinhos, a torcer para que tudo desse certo.

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